Bryan Johnson quer viver para sempre.

O empresário americano toma cem comprimidos por dia, nunca se alimenta após as 11h da manhã e monitora obsessivamente dezenas de “biomarcadores” de seu corpo. Seu objetivo não é apenas prolongar a vida, mas eliminar totalmente a morte.

Excentricidade? Sem dúvida. Mas Johnson faz parte de um movimento crescente que enxerga o corpo humano como uma máquina a ser hackeada, otimizada e atualizada. Em nome do “aprimoramento humano”, ele e outros, como Peter Thiel e Elon Musk, exploram a extensão da vida, implantes cerebrais e drogas que melhoram a mente e o corpo.

Apesar de esse campo atrair figuras excêntricas e lembrar, de forma desconfortável, o movimento eugenista do início do século XX, não se deve ignorar o potencial do aprimoramento humano. A medicina deveria buscar também aumentar as capacidades do corpo, e não apenas restaurá-lo quando adoece. Para que esse avanço seja seguro e eficaz, é necessário afastar charlatães e integrar o tema à ciência estabelecida.

Quem busca se tornar “super-humano” encontra muitas opções. Algumas já estão nas farmácias. A metformina, por exemplo, é prescrita há décadas para diabéticos e, em estudos com camundongos, mostrou potencial de aumentar a longevidade. Apesar da falta de confirmação em humanos, muitos adeptos, incluindo Johnson, já utilizam o medicamento.

Outras substâncias incluem o Ritalin, usado no tratamento de transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, e a testosterona, que além de ser o principal hormônio masculino, é um potente anabolizante. Há ainda compostos menos conhecidos, como o NAD+, essencial para o metabolismo celular e que, além de ser considerado um nootrópico, teria propriedades anti-envelhecimento.

Alguns biohackers mais ousados recorrem a intervenções mais radicais. Em Próspera, uma zona com regulamentação leve em Honduras, criada com apoio de Peter Thiel, clínicas oferecem inserção de genes para estimular a produção de follistatina, proteína que favorece o crescimento muscular e prolonga os telômeros, estruturas que protegem os cromossomos e se encurtam com a idade.

Outra fronteira é a interface cérebro-computador (BCI), dispositivo que conecta o cérebro humano a chips de silício. Alguns modelos são externos, outros implantados diretamente no cérebro. Pacientes com deficiência já controlam computadores com esses equipamentos, como os produzidos pela Neuralink, empresa fundada por Elon Musk. Para Musk, apenas cérebros humanos que alcancem uma “simbiose com a inteligência artificial” poderão competir em um mundo dominado por máquinas inteligentes.

A busca por aprimoramento não é nova. Ao longo da história, humanos buscaram maneiras de expandir suas capacidades, seja pela educação em massa ou por invenções como o relógio de pulso. Hoje, o mercado global de suplementos movimenta cerca de US\$ 485 bilhões por ano, mesmo com poucas evidências concretas de eficácia.

O aprimoramento humano enfrenta dois problemas principais. O primeiro é a mistura de ciência de ponta com práticas duvidosas e charlatanismo. Algumas ideias são promissoras, outras são apostas honestas, mas muitas visam apenas lucrar enganando consumidores. O segundo problema é que a má reputação do setor afasta investimentos que poderiam acelerar avanços seguros e eficazes.

Para resolver isso, os governos devem criar um ambiente que facilite ensaios clínicos rigorosos. Isso exigirá repensar a regulação médica, tradicionalmente focada em restaurar a saúde de doentes. Melhorias em indivíduos saudáveis ou combate ao envelhecimento natural ainda são negligenciados. Um exemplo de avanço foi a recente autorização, nos Estados Unidos, para testar a metformina como possível medicamento anti-envelhecimento.

Regulamentações mais adequadas ajudariam pacientes a distinguir práticas eficazes de fraudes e dariam respaldo financeiro a pesquisadores sérios. Os benefícios podem ser imensos: um estudo estima que uma droga capaz de aumentar a expectativa de vida média nos EUA em apenas um ano teria um impacto econômico de US\$ 38 trilhões.

Pensar em aprimoramento humano desde já também ajudaria a sociedade a enfrentar os desafios que surgirão. Tecnologias como BCI podem ser voluntárias no início, mas se mostrarem eficazes, podem criar desigualdades ainda maiores. Como em outros casos, como automóveis ou antibióticos, os mais ricos terão acesso primeiro. Isso pode resultar em uma sociedade onde os mais abastados sejam não só mais ricos, mas também mais fortes, inteligentes e longevos.

Aprimoramentos radicais ainda soam como ficção científica, mas não são impossíveis. Quando surgirem, podem transformar o mundo rapidamente, como ocorreu com os medicamentos para emagrecimento GLP-1, que explodiram em demanda de forma repentina. Melhor que os governos se antecipem e estabeleçam regras agora, antes que Johnson e outros biohackers consigam atingir seus objetivos de forma ampla.


22/03/2025
The Economist

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Last Update: 11/05/2025