No dia 5 de maio, o sociólogo Oliveiros Marques publicou uma coluna no Brasil 247, intitulada Senta a pua, STF, na qual busca demonstrar como, agora, com a perseguição do Supremo Tribunal Federal (STF) aos bolsonaristas, o Brasil estaria finalmente se afastando da possibilidade de golpes, já que o tribunal poderia dar “punições exemplares” aos militares envolvidos na manifestação de 8 de janeiro de 2023.
Logo no começo do texto, Oliveiros diz:
“A história do Brasil é repleta de exemplos de golpes para tomada de poder com a participação de militares. A nossa República nasceu de um movimento desse tipo que levou Marechal Deodoro da Fonseca ao poder. Aliás, já no Império, com o chamado Golpe da Maioridade — para garantir que Dom Pedro II assumisse o trono com apenas 14 anos — eles já estavam lá.
E assim seguem, de tempos em tempos, colocando as baionetas para fora em busca de um espaço para se locupletar com a corrupção e a imposição de seus valores. Nem Getúlio Vargas escapou dessa companhia. Na Revolução de 1930 e no Golpe do Estado Novo, em 1937, a caserna se fez presente.
Em 1964 — talvez o episódio de que temos maior lembrança, dada a proximidade histórica — foi a última vez que essa gente logrou êxito. Uma ditadura que matou e fez desaparecer centenas de homens e mulheres. Muitos dos corpos não foram entregues às famílias até hoje”
Realmente, houve muitos golpes de Estado organizados por militares no Brasil. No entanto, mesmo que este não seja o tema central deste texto, é preciso lembrar que existe uma diferença entre alguns desses episódios citados por Oliveiros. Por exemplo, o golpe da Revolução de 1930 foi progressista, o que de fato soterrou a República Velha no Brasil, enquanto o golpe de 1937 foi contrarrevolucionário, assim como o golpe de 1964.
“Parto da tese de que o espírito golpista residente em parte das nossas Forças Armadas persiste por conta da não punição dos militares golpistas. O uso da Lei da Anistia para proteger criminosos está no centro dessa realidade. Se, ao fim e ao cabo da ditadura em 1985, as punições tivessem sido exemplares, porcos dessa natureza não se criariam — ou não cresceriam.”
A conclusão de Oliveiros não poderia estar mais afastada da realidade. Primeiro, se a punição exemplar servisse para proteger algum regime político, então nenhum regime político teria acabado durante toda a história, incluindo o regime da própria ditadura de 1964, porque, se havia algum regime que se utilizava do método de punições exemplares contra aqueles que queriam extingui-lo, esse regime era o da Ditadura Militar do Brasil.
O texto segue:
“Mas, como antes tarde do que nunca, teremos a partir desse julgamento a oportunidade de demonstrar que a democracia é mais importante — e mais forte — do que algumas gemas colocadas sobre os ombros de imbecis que nunca foram a um campo de batalha. A Primeira Turma do Supremo começa a julgar o que estão chamando de núcleo militar da tentativa de golpe.”
Aqui mais uma confusão. Se a democracia é mais importante e mais forte, a ponto de o Judiciário punir todos os que atentam contra ela, por que é que ninguém foi punido pelo golpe de 2016 e pela prisão de Lula que o tirou da corrida eleitoral de 2018? Pior, por que é que o Supremo se compadece da democracia agora, mas, durante o processo de golpe dos anos citados anteriormente, ao invés de se compadecer, o Supremo organizou o golpe? Não parece contraditório?
O que acontece é que não se trata de um julgamento contra uma tentativa de golpe de Estado, mas justamente o contrário. Trata-se de um julgamento político com o objetivo de controlar as eleições do ano que vem. Ou seja, o apoio ao STF é, na verdade, o apoio a um golpe eleitoral que pode levar o país a um governo ao estilo Milei.
É interessante notar também como, apesar da certeza de um golpe de Estado e das provas irrefutáveis, ninguém apresenta essas provas, nem mesmo as imagens das pessoas armadas, como segue:
“São majores, tenentes-coronéis, subtenentes e coronéis sendo julgados por acusação de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada e tentativa de golpe de Estado. As provas dos autos determinarão o resultado, não tenho dúvidas. Mas, pelo que já está tornado público, nada mais resta a esperar senão uma condenação — sem lero-lero em relação à dosimetria.”
Além disso, se engana o colunista ao dizer que os militares da ditadura estão no banco dos réus com Bolsonaro. O STF já existia desde a época da escravidão no Brasil, passando por inúmeras ditaduras e sempre cumprindo um papel reacionário na política do País. Em 1964, não era a turma do Bolsonaro que dava suporte à ditadura, mas os ministros do STF. Ou seja, apoiar o golpe do STF é apoiar aqueles que impuseram o golpe de 1964.