Em decisão publicada na última quarta-feira (30), o Ministério Público de São Paulo determinou o arquivamento de inquérito policial instaurado contra Francisco Weiss Muniz, membro da Direção Nacional do Partido da Causa Operária (PCO). O militante era investigado por suposta “apologia do crime”, prevista no artigo 287 do Código Penal, em razão de uma declaração pública de apoio ao povo palestino e à sua vanguarda, o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas, na sigla em árabe), feita em um ato político.
A denúncia inicial se referia a uma fala em que o militante afirmou:
“Venho em nome do Partido da Causa Operária deixar meu apoio irrestrito ao povo palestino e ao Hamas. […] O povo palestino conseguiu reagir através da ação do Hamas. Nós estamos mil por cento com o Hamas. […] Não tem como chamar isso de um ato terrorista. Terrorista é o Estado de Israel, terrorista criminoso armado pelo imperialismo.”
O Ministério Público, no entanto, reconheceu que o conteúdo da manifestação “não configura incitação ao crime”, tampouco ultrapassa os limites do direito à liberdade de expressão. Segundo o parecer do promotor Roberto Bacal, “em que pese o apoio a grupo terrorista, a conduta do autor não leva seus espectadores a praticarem atos terroristas”, e “não se vislumbra o dolo de incitação no sentido de estimular ou incentivar publicamente a prática de crime”.
O promotor ainda observou que, embora tenha se posicionado politicamente, o militante “não teve o ânimo de exaltar a conduta, mas apenas defender uma causa”, e que considerar a atitude como criminosa “poderia configurar verdadeiro cerceamento à liberdade de expressão”.
A Promotoria, portanto, requereu o arquivamento do procedimento investigatório, reconhecendo a inexistência de justa causa para o ajuizamento de ação penal. O caso encontra-se registrado sob o processo nº 1513967-48.2024.8.26.0050.
Em meio ao avanço do sionismo no Brasil, a decisão marca uma vitória importante do movimento de defesa da Palestina e da esquerda como um todo. Afinal, o promotor reconhece que é direito de um militante defender em público a suas posições políticas — e que o contrário seria um ataque à liberdade de expressão.
A medida, ainda, fortalece também a luta em defesa da Palestina na medida em que fortalece o partido mais ativo nesta causa no Brasil. O PCO tem sido alvo de uma campanha sistemática de perseguição por sua posição clara de apoio à luta dos povos oprimidos contra o imperialismo. O arquivamento do processo evidencia que a tentativa de enquadrar como “apologia do crime” a defesa da resistência palestina é juridicamente infundada e politicamente arbitrária.
Apesar de positiva, a decisão ainda revela algumas questões importantes. Em primeiro lugar, chama a atenção que as declarações do promotor, embora óbvias, vão na contramão da tendência geral do regime jurídico, que vem impondo multas e até mesmo condenando pessoas à prisão por causa de suas opiniões políticas.
Em segundo lugar, ainda que o promotor tenha recomendado o arquivamento do caso, chama a atenção que ele considera o Hamas um “grupo terrorista”, o que não está de acordo com o entendimento do Estado brasileiro. Nem o Brasil, nem mesmo a Organização das Nações Unidas (ONU) considera o Hamas um grupo “terrorista”. Admitir que o Hamas seria um grupo “terrorista” deixa o caminho aberto para perseguições futuras. Afinal, o PCO, entre outras ações, publicou um livro sobre o partido palestino.
Outro problema da decisão é que o promotor considera que “não se vislumbra o dolo de ‘incitação’, no sentido de estimular, incentivar
publicamente a prática de crime, imediatamente ou no futuro”. Ou seja, considera que, caso houvesse uma “incitação”, estaria configurado crime. Esta consideração também abre outro flanco contra os direitos democráticos, uma vez que uma “incitação” é simplesmente um discurso — e, portanto, algo que deveria ser resguardado pela liberdade de expressão.