A entidade alerta que feriado do 1º de maio é o momento para reforçar que a CLT continua sendo a principal ferramenta de proteção do trabalhador brasileiro
No Dia do Trabalhador, comemorado neste 1º de maio, a Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae) chama a atenção para a importância da valorização da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para os trabalhadores brasileiros. Criada em 1º de maio de 1943, a CLT garante uma série de direitos fundamentais às pessoas que trabalham formalmente — com carteira assinada.
Entre as garantias estão a jornada diária máxima de oito horas, o direito a férias e ao pagamento do 13º salário e de hora extra, aviso prévio, licença-maternidade e licença-paternidade, proteção contra demissão sem justa causa e, por último, o seguro-desemprego em caso de demissão.
De acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), até fevereiro deste ano, o país contava com 47,7 milhões de trabalhadores com carteira assinada. O número fez com que a taxa de desemprego no trimestre ficasse em 6,8%, uma das menores da série histórica do país.
Apesar do alto número de empregos formais e dos direitos essenciais que a Lei garante, nos últimos anos tem crescido o sentimento de desvalorização da CLT. A pesquisa revelou que, no último trimestre de 2024, o país possuía 40 milhões de trabalhadores informais. Ou seja, 38,5% dos trabalhadores estavam na informalidade.
Entre os fatores que empurram o trabalhador para a informalidade estão os salários inadequados, a falta de oportunidades de crescimento profissional e, até mesmo, um ambiente de trabalho tóxico, com assédio moral dentro das empresas.
Aliado a esses fatores, a Reforma Trabalhista, implementada em 2017, contribuiu para a desestruturação do mercado de trabalho, por meio dos contratos informais, da terceirização e de outras modalidades de ocupação.
Para o presidente da Fenae, Sergio Takemoto, é preciso fazer uma campanha em defesa da CLT e das garantias que ela dá para o trabalhador.
“Neste 1º de maio, é fundamental reforçar que a CLT continua sendo a principal ferramenta de proteção do trabalhador brasileiro. Mesmo diante da onda de desvalorização e da expansão da informalidade, apenas o trabalho com carteira assinada garante direitos essenciais como férias, 13º salário, jornada justa e proteção contra demissões arbitrárias”, destaca Takemoto.
Desejo de formalização entre autônomos
De acordo com o levantamento do Instituto Brasileiro de Economia da FGV (FGV-Ibre), realizado em 2024, 67,7% dos trabalhadores autônomos gostariam de ter um emprego com carteira assinada. Esse desejo é mais acentuado entre aqueles sem CNPJ, com menor escolaridade e de renda mais baixa.
A pesquisa revelou também que a vontade de trabalhar sob o regime CLT é mais expressiva entre os autônomos de menor renda. Entre os trabalhadores informais que recebem até 1 salário-mínimo, 75,6% manifestam esse desejo. Para aqueles com renda entre 1 e 3 salários-mínimos, o percentual é de 70,8%. Já entre os que possuem renda acima de 3 salários-mínimos, essa proporção cai para 54,6%.
As transformações no mercado de trabalho
Em entrevista exclusiva à Fenae, o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Daniel Ferrer, analisou as transformações no mercado de trabalho brasileiro, com ênfase na perda de prestígio da carteira assinada entre os mais jovens e no avanço da pejotização após a reforma trabalhista de 2017.
Doutor em Direito do Trabalho pela USP, Ferrer lembra que uma das possíveis causas para o crescente distanciamento da juventude em relação à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é consequência de mudanças demográficas e culturais da sociedade atual. “Hoje, a chefia de família demora muito mais a acontecer. Os filhos demoram mais para sair da casa dos pais, então ficam menos presos a um trabalho fixo com menor dependência”, explicou.
Ele também aponta a influência das redes sociais na percepção negativa sobre os direitos trabalhistas. “O algoritmo das plataformas tende a privilegiar conteúdos de direita, que deslegitimam a CLT. Se alguém busca informações sobre relações de trabalho, será exposto majoritariamente a discursos contrários à proteção trabalhista”, criticou.
Ao abordar o avanço do trabalho informal e da pejotização, Ferrer é categórico: “Não me parece que é uma escolha ativa das pessoas. As empresas têm adotado estratégias de pejotização incentivadas pela reforma de 2017, que criou figuras como o ‘autônomo exclusivo’ — uma legalização da fraude”.
Segundo dados da PNAD analisados por Ferrer, embora o número absoluto de trabalhadores com carteira assinada tenha aumentado de 35 para 39 milhões entre 2012 e os anos recentes, a proporção caiu: “A formalização relativa caiu de 39,6% para 37,8%”, afirmou.
Em contrapartida, a categoria ‘conta própria’, que inclui muitos trabalhadores informais e MEIs, cresceu substancialmente. Com isso, o crescimento da categoria “conta própria” é um dos principais marcadores da informalidade. “Essa modalidade de trabalho, que era de 20 milhões em 2012, saltou para 26 milhões. Em termos percentuais, passou de 22% para 25% do total de ocupações — principalmente a partir da pandemia da Covid-19”.
Ele alerta que a queda do desemprego recente, estimada em cerca de 6,6%, se deve muito mais à expansão do trabalho precário do que à geração de empregos formais. “Esse autoemprego precário, às vezes formalizado via MEI, cresce muito. É uma romantização do empreendedorismo, mas na prática representa informalidade”.
Sobre os impactos da pejotização, Ferrer cita um estudo da FGV que aponta prejuízo de R$ 89 bilhões à Previdência. “A pejotização ameaça todo o arcabouço de proteção social construído desde a década de 30”, afirma.
Questionado sobre medidas para reverter esse cenário, Ferrer propõe uma política nacional de formalização do emprego. “É preciso ampliar a fiscalização trabalhista. A contratação de novos auditores é um começo, mas insuficiente. E não basta só o governo: é essencial a mobilização da classe trabalhadora”, conclui.