Papa Francisco, a mídia e a (falta de) Ética

por Dora Incontri

Correm na internet incontáveis textos, frases, entrevistas, sermões, manifestações do já saudoso Papa Francisco e que devem ressoar (assim esperamos) por muitos anos, para iluminar caminhos neste mundo tão cheio de sombras. Escolho hoje para falar do trecho de uma entrevista, que está tanto no Youtube, quanto nas redes sociais, “Los quatro pecados del periodismo”. No final deste texto, direi por que escolhi tratar este tema.

Quando me formei em Jornalismo, na Cásper Líbero, no início dos anos 80, já recusei de saída um cobiçadíssimo emprego na maior revista brasileira, porque via como a mídia corporativa cometia o primeiro pecado apontado por Francisco: a desinformação. Ele se refere a dar uma notícia pela metade, omitir informações. E para que isso? Para manipular, para direcionar o leitor aos interesses defendidos pela linha editorial do órgão em questão. Um exemplo bem concreto nos últimos dias: os grandes veículos de comunicação, que nem é preciso mencionar, não puderam escapar, por conta da repercussão, de noticiar a greve de fome de Glauber Braga, contra o seu pedido de cassação do mantado de deputado. Mas, como davam a notícia? Que ele havia agredido o representante do MBL. Mas não diziam o motivo: que esse sujeito o estava assediando há tempos, com ofensas pessoais à sua mãe, naquele momento no leito de morte. Essa parte da história não aparecia. A manipulação contribuiu para o resultado, por enquanto negativo, da reversão da cassação.

O segundo mal da mídia é a calúnia. Gravíssima, desumana e crime previsto no Código Penal. Lançada tantas vezes com objetivos de destruição de alguma pessoa pública ou mesmo apenas para vender o jornal, o canal ou angariar mais likes. Mesmo se houver desmentido, mesmo se houver processo, demorado, o estrago já foi feito, às vezes até com o suicídio do caluniado.

Como terceira infração à ética jornalística, Papa Francisco aponta a difamação. Ele cita como exemplo, pessoas que tiveram algum deslize no passado e já pagaram por isso, e que têm direito a uma imagem sem mancha, mas a mídia não perdoa. Podemos estender isso para exemplos de divulgação de notícias que prejudicam a vida e a imagem de alguém, sem nenhuma necessidade, apenas, mais uma vez, por motivos sórdidos de lucro.

E por fim, Francisco evoca a cropofilia e traduz com graça: amor ao cocô. É o prazer mórbido e comercial de publicar escândalos, crimes sangrentos, notícias sujas, verdadeiras ou não. No meu tempo de faculdade, isso se chamava imprensa marrom. Mas hoje, mesmo grandes veículos de comunicação que se arrogam seriedade e, às vezes até se propõem como de esquerda, cometem esse pecado repulsivo.

O leitor, o ouvinte, a massa que não sabe se orientar no meio de tantos desvios, fica à mercê da manipulação desses órgãos. E assim, pessoas têm reputações assassinadas, entre calúnias, difamações ou meias verdades. Factóides são criados, lawfares são perpetrados, com o apoio irrestrito dessa mídia tão “pecadora”, nos termos do querido Francisco. E o povo é inclinado aos ventos políticos opressores, de extrema direita, que desatendem suas reais necessidades.

Dedico esse texto ao meu grande amigo Alysson Leandro Mascaro. O vídeo do Papa lhe foi enviado, com o seguinte comentário: “Você tem sido alvo desses quatro males. Mas há de superar.” Assino embaixo. Quem quiser saber mais, assista à entrevista de Alysson Mascaro ao 247, publicada no dia 25 de abril último.

Dora Incontri – Graduada em Jornalismo pela Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero. Mestre e doutora em História e Filosofia da Educação pela USP (Universidade de São Paulo). Pós-doutora em Filosofia da Educação pela USP. Coordenadora geral da Associação Brasileira de Pedagogia Espírita e do Pampédia Educação. Diretora da Editora Comenius. Coordena a Universidade Livre Pamédia. Mais de trinta livros publicados com o tema de educação, espiritualidade, filosofia e espiritismo, pela Editora Comenius, Ática, Scipione, entre outros.

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 30/04/2025