O trabalho doméstico e de cuidados é o ofício mais invisibilizado deste país, pois, enquanto arrumamos as casas e organizamos a vida alheia para que a roda do mercado não pare, nossos direitos são subalternizados e relegados a segundo plano. Isso quando, mesmo de maneira rasa, eles são reconhecidos.

Neste mês de abril, que é dedicado à Visibilidade do Trabalho Doméstico e de Cuidados, mais uma vez a categoria relacionada às atividades domésticas ganhou destaque na lista suja do trabalho análogo à escravidão, do governo federal. De acordo com o levantamento, o trabalho doméstico ocupa o terceiro lugar no ranking de fiscalizações.

Um caso emblemático e que ganhou destaque no noticiário é o de Sônia Maria de Jesus, uma brasileira de 50 anos que viveu, desde criança, escravizada por uma família de gente poderosa. Uma mulher negra surda, muda, analfabeta em português e em libras, que foi resgatada em uma ação do Ministério Público do Trabalho na mansão de um desembargador em Florianópolis (SC).

Mesmo, após ser libertada, voltou ao cárcere sob determinação da Justiça, com a justificativa de que ela “era da família”. Nesta sociedade racista e classista em que vivemos, quantas Sônias ainda estão encarceradas em seus ambientes de trabalho? O Ministério do Trabalho e Emprego diz que de 2017 a 2023, foram realizados 119 resgates de trabalho escravo em ambiente doméstico. Infelizmente, os números não oficiais devem ser ainda maiores, mas gradativamente vamos caminhando para saber onde essas trabalhadoras domésticas estão.

Atualmente, cerca de 6 mil pessoas que exercem serviços domésticos no Brasil, 93,5% são mulheres, a maioria delas, negras (68,5%), com idade entre 45 e 59 anos (42,5%) e com ensino fundamental incompleto (41%), segundo dados recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), de 2024, e lançados esta semana.

Deste total, apenas 24,4% tinham carteira assinada. Ou seja, tem muita gente sem assistência previdenciária, sem cobertura do INSS e sem direitos. A precarização e a falta de fiscalização das condições de contratação dão espaço para relações abusivas no ambiente de trabalho e, em casos extremos, às situações análogas à escravidão.

Como primeira empregada doméstica da história eleita na Assembleia Legislativa de São Paulo, desde o primeiro dia como parlamentar tenho como foco principal dar visibilidade e importância às necessidades da categoria das trabalhadoras domésticas e de cuidados. Em 2025, pela primeira vez na história de São Paulo, estamos celebrando, neste dia 27 de abril, o Dia Estadual da Trabalhadora Doméstica e de Cuidados, a partir da Lei nº 17.948/24, de minha autoria.

Essa caminhada é reflexo do que foi semeado antes. No Brasil e em São Paulo nós temos um histórico de lutas pelo reconhecimento das trabalhadoras domésticas enquanto profissionais dignas de direitos, desde os tempos de Laudelina de Campos Melo, mulher negra e pioneira na luta, que fundou o primeiro movimento organizado das domésticas na década de 1930 em Campinas, interior do estado. A partir de seu legado, eu e tantas outras companheiras seguimos para fortalecer a nossa categoria.

Por isso, digo e repito: nós não somos e não queremos ser “da família”. Nós queremos dignidade e direitos assegurados. Por mais que tentem apagar a nossa existência, nós ainda estamos aqui, lutando pela categoria e por nossa emancipação.

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 27/04/2025