“Lula tem a caneta e governa com Motta e Alcolumbre”, esse é o título do artigo que Alex Solnik publicou nesta quinta-feira, 24, no Brasil 247. Logo de início, lemos que “Ninguém é páreo para Lula no ano que vem, fora Bolsonaro”. O otimismo do texto está completamente apartado da realidade, e acaba funcionando como um obstáculo para que a militância petista, e mesmo setores do governo, possam intervir de maneira adequada na política.
A situação de Lula não é nada promissora. O emparedamento que Lula sofre é evidente. O próprio título do artigo já entrega a situação, pois Lula foi eleito para a presidência do País, não Motta ou Alcolumbre.
Solnik considera que, “como Bolsonaro está fora do páreo, o páreo está praticamente ganho”. No país do futebol, todo mundo sabe que a pior coisa é esse clima de ‘já ganhou’ e é cedo demais para dizer que “os outros postulantes [a concorrer à presidência] não dão nem para a saída”. Pesquisas indicam que o ex-presidente poderia transferir seus votos para Michele Bolsonaro, e ela aparece tecnicamente empatada com Lula em algumas pesquisas.
O jornalista faz pouco caso e diz que, “se fosse um Brasileirão, seria como um time da série A jogar contra outros da B ou da C”. Um péssimo exemplo, pois Flamengo, Corinthians, Palmeiras, Santos, Cruzeiro, Grêmio, etc., já passaram pela série B, que tem um campeonato duríssimo.
Afirmar que “o da série B seria Tarcísio” e “os outros, a partir de Caiado, da C”, não fornece um quadro preciso das eleições onde a burguesia tem muitas cartas para jogar.
Encurralado
Outra afirmação enganosa é a que diz que “Lula está inaugurando um novo formato de governo. Decidiu governar não com os partidos do centrão, mas com os presidentes da Câmara e do Senado. Que são do centrão”. O jornalista quer dar a entender que Lula já não se preocupa com o varejo, mas que vai negociar no atacado, com quem interessa. No entanto, Motta e Alcolumbre não são apenas políticos que “indicam ministros e candidatos a cargos-chave no governo”, eles sofrem pressão de suas bases, não estão soltos no ar.
O máximo do otimismo aparece quando o jornalista diz que “nunca a relação do presidente com os chefes do Legislativo foi tão próxima”. Essa “proximidade” entre Lula e esses caciques não é um movimento natural. O presidente está acuado e tem que ceder em inúmeros pontos para poder governar minimamente. Não há nada para ser comemorado.
Política de conchavos
Outro ponto que Solnik deixa claro é o quanto ele vê como algo natural que Lula mantenha “interlocução com Arthur Lira, que não precisa de ministério, mas pode indicar aliados a postos nos ministérios, sem chamar a atenção”.
Um dos maiores erros de Lula, e motivo de seu enfraquecimento, foi ter baseado seu governo em uma negociação por cima.
Alex Solnik está vendo o mundo invertido, diz que Hugo Motta, presidente da Câmara, está dando sinais de “alinhamento ao governo”, ou seja, que está sendo atraído pela força gravitacional da presidência, não o contrário. E, como sinal desse alinhamento, Motta teria engavetado “o PL da anistia, contrariando o partido de Valdemar Costa Neto e de Bolsonaro, o maior da Câmara”.
Por alguma razão inexplicável, o jornalista de que “Motta e Alcolumbre não são bobos. Sabem que a direita não tem chance em 2026. E que com Lula reeleito não ficarão na chuva”. Não se pode dar um outro sentido ao fisiologismo da direita. Esses políticos da burguesia não estão em seus postos por acaso. Eles não vão virar base de apoio do governo Lula nem por acaso, por mais que possam ter interesses particulares, vão sempre responder aos interesses gerais de quem os colocou lá: a burguesia.
O final do texto de Solnik tem uma posição extremamente reacionária. Não faz muito tempo, ninguém que se diz de esquerda teria coragem de dizer que “Lula tem a caneta”.
Ter a caneta, como todos sabemos, é o poder que a presidência tem de liberar verbas e controlar a máquina pública. Em outras palavras, é possível comprar o apoio político. Que tipo de esquerda pode defender isso?
Um governo popular tem que se apoiar nas bases, na classe trabalhadora. Os conchavos, os acordos por cima, são a ruína do governo Lula. Enquanto isso não for entendido, veremos governos de esquerda sendo derrubados, levando rasteira, sem a menor cerimônia, como fizeram com Dilma Rousseff.
Aquilo que, até ontem, era duramente criticado pela esquerda, passa agora a ser defendido à luz do dia por aqueles que se dizem progressistas