O que é um clássico? Na literatura, como definiu Italo Calvino, é um livro que nunca termina de dizer aquilo que tinha a dizer. Nos restaurantes, podem ser os endereços que trazem recordações, como as madeleines de Marcel Proust.

Cerca de 60% das empresas não sobrevivem após cinco anos no Brasil, segundo dados do IBGE. Na gastronomia, a mortalidade é ainda mais alta: sete em cada dez negócios fecham as portas antes de completar o quinto aniversário. Depois da pandemia, a matemática se tornou ainda mais problemática. Em São Paulo, quem sobrevive há décadas conquistou uma legião de frequentadores fiéis e, em certa medida, buscou se reinventar.

Fundado em 1970, na rua Treze de Maio, no Bixiga, região central da cidade, o Mexilhão nasceu com uma proposta inusitada para o bairro coalhado de cantinas italianas: oferecer frutos do mar e pratos tradicionais. Aqui não se esperam espumas ou acrobacias gastronômicas, muito menos design ou arquitetura de vanguarda. Mesas e decoração permanecem as mesmas desde a inauguração. Também há pratos que desapareceram de outros endereços, como o camarão à grega, e fartura — um substantivo cada vez mais raro. “Aqui não tem miséria”, como definiu um amigo durante um almoço recente, no qual se pediu uma paella para dois e ainda se levou sobra suficiente para o almoço e o jantar do dia seguinte.

O frango de televisão de cachorro foi gourmetizado há tempos em São Paulo, mas resiste no Brazeiro, na Vila Mariana, zona sul da cidade. Ali, ainda se pode comer frango assado e polenta frita em um ambiente simples e despojado, preservado desde a fundação, em 1969. O sucesso do restaurante, cujo frango assado para duas pessoas custa 66 reais, levou à abertura de uma filial no Morumbi.

Nos Jardins, o Z Deli nasceu em 1981 oferecendo comida judaica. Fechou em 2023 para reformas e reabriu no fim do ano passado com uma proposta diferente: manteve pratos judaicos no cardápio, mas reformulou a casa sob o conceito de bistrô — comida de alta qualidade a preços justos em uma cidade cada vez mais cara. O cardápio mira a cozinha da Europa Oriental: kibe cru de atum, alcachofras empanadas com queijo pecorino e aioli, latkes (panquecas de batata), peixe do dia com fritas e hambúrgueres. As caçarolas estão sob o comando do chef Benê Souza, ex-Virado, no Largo do Arouche. O problema aqui são as longas filas. O melhor é chegar ao meio-dia, reservar ou tentar uma mesa no meio da tarde.

O Z Deli manteve pratos judaicos no cardápio, mas reformulou a casa sob o conceito de bistrô (Foto: Divulgação)

No início de 1994, quando o Brasil vivia os primeiros meses do Plano Real, Giuseppe Rosa, então com 52 anos, abriu o Vecchio Torino. Inicialmente, pensou em fazer um restaurante exclusivamente com pratos de sua cidade natal, Turim. Optou, no entanto, por um cardápio mais abrangente, ainda que focado no Norte da Itália. O restaurante conquistou fãs ardorosos e críticos contumazes. Uns se emocionam com os sabores familiares; outros criticam o ambiente kitsch, os preços altos, as idiossincrasias do dono e a preferência por clientes antigos. Aos 31 anos, o Vecchio Torino mantém um gnocchi delicado e saboroso.

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Last Update: 25/04/2025