
Da Página do MST
Na noite de 17 de abril, famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foram vítimas de uma operação violenta, ilegal e sem respaldo judicial, onde as famílias realizavam a retomada de uma parcela de terras, que foi grilada por latifundiários, especificamente dentro do Assentamento Taboca, na Serra do Taquaruçu, criado em 2005 pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), na região de Monte do Carmo no Tocantins.
A ação, marcada por abusos de autoridade, violência armada e ameaças contra adultos e crianças, escancarou a conivência entre agentes da Polícia Militar do Tocantins e grupos armados vinculados a fazendeiros locais.
De acordo com os relatos das famílias que estavam acampados dentro da parcela de terra do assentamento Taboca, o despejo foi executado sem mandado judicial, sem qualquer instrumento legal e fora dos trâmites constitucionais. Policiais militares chegaram na ocupação por volta das 19h acompanhados por pistoleiros e fazendeiros da região, todos fortemente armados. “Eles chegaram juntos, a polícia, os fazendeiros e os jagunços, com armas nas mãos, apontando pra gente como se fôssemos criminosos”, relatou uma das vítimas da ação. As famílias que estavam jantando no momento, foram cercadas, obrigadas a colocar as mãos na cabeça e levadas para fora sob a mira de fuzis.

Nem a presença de crianças foi suficiente para conter o grau de brutalidade empregado na ação. Um dos policiais ameaçou diretamente: “Se não disserem quem está liderando isso, as crianças vão pagar pelos adultos”. Em outro caso, um dos acampados foi ameaçado de morte por um policial, que afirmou: “Tu vai ser o primeiro a morrer”. Isso é uma promessa. E na delegacia, só não vou te quebrar todo, porque o meu comandante está aqui”. A ameaça só não teria se concretizado por conta da presença do superior hierárquico no local.
A violência física e psicológica se estendeu à destruição deliberada de pertences das famílias. Bandeiras, roupas, lonas, colchões e o barracão onde seria realizada uma plenária foram incendiados por fazendeiros. Vinte e três pessoas foram rendidas, obrigadas a se sentar no chão com as mãos na cabeça e, logo após, transportadas de forma degradante por viaturas policiais e em caminhonetes de propriedade dos fazendeiros.
Os detidos foram levados à Central de Flagrantes do 5º Distrito Policial de Taquaralto, reforçando a ilegalidade do procedimento, realizado à margem da lei e em veículos não oficiais. No trajeto, segundo os relatos, o comandante da operação enviava áudios comemorando a ação e até solicitando pagamento via pix — mais um indício de articulação privada para fins de repressão violenta a um movimento social legítimo.
Também houve humilhações ideológicas. Um dos depoentes relatou que, ao ver uma mochila com símbolos do MST, um dos fazendeiros ironizou: “Tu gosta do vermelho, né?”, ameaçando atirar se ouvisse confirmação. Um policial completou a agressão: “Fala quem te mandou, senão vai apanhar aqui mesmo”.

HISTÓRICO DA ÁREA
O cenário de violência ganha contornos ainda mais graves diante do histórico da área em disputa, marcada por irregularidades fundiárias já reconhecidas oficialmente pelo Ministério Público Federal (MPF). Em outubro de 2023, a Procuradoria da República no Tocantins instaurou o Procedimento Administrativo nº 1.36.000.000671/2023-67, por meio da Portaria n.º 30/2023/PR-TO/3º OFÍCIO NTC, para monitorar a atuação do INCRA na destinação do Lote 14, no Loteamento Serra do Taquaruçu — área pública arrecadada para criação do Projeto de Assentamento Taboca.
Segundo o MPF, diligências resultaram no cancelamento do título e da matrícula da área que sobrepunha o Lote 14, reconhecendo a destinação legítima da terra à Reforma Agrária. Ainda assim, o processo de avaliação e efetiva destinação pelo INCRA permanece inconcluso, o que favorece a continuidade da grilagem e a ação arbitrária de grandes proprietários da região.
A repressão à retomada da área no Assentamento Taboca e o uso articulado da força policial com interesses privados revelam o avanço da violência institucionalizada contra os movimentos sociais no campo. O MST no Tocantins, denuncia a omissão do governo do Tocantins, que, mantém vínculos diretos com grileiros e grandes fazendeiros, facilitando ações ilegais e acobertando práticas de violência com o uso das forças de Segurança Pública.
Em resposta à operação, as famílias registraram boletim de ocorrência contra os policiais e jagunços por dano e ameaça. O MST exige a atuação imediata do Ministério Público Federal, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), da Ouvidoria Agrária Nacional, da Defensoria Pública Estadual e do INCRA para responsabilizar os autores da violência, garantir o respeito à legalidade fundiária e assegurar o direito das famílias à terra e à dignidade.
“Não se tratou de uma reintegração de posse, mas de um ataque criminoso à luta por Reforma Agrária. Um ataque à vida, à legalidade e ao sonho de centenas de famílias que resistem pela terra que é do povo”, afirmou uma das vítimas.
O caso reforça a urgência de enfrentamento à grilagem, à conivência de instituições com o poder privado e à criminalização dos que lutam pelo direito constitucional à terra e à justiça social no campo brasileiro.
Denunciamos a situação da Fazenda Santa Ádyla vizinha ao Assentamento Taboca também alvo da grilagem de terras na região. A área de 1.225 hectares é considerada terra pública da União, atualmente grilada e explorada ilegalmente com cultivo de milho, soja transgênica e pecuária. Exigimos dos órgãos ambientais, NATURATINS e IBAMA uma rigorosa fiscalização ambiental sobre os desmatamentos na área.
Segundo o Parecer nº 1819/2022 da Corregedoria-Geral da Justiça do TJ-TO, a matrícula M-2075 que fundamenta a suposta propriedade da fazenda é nula de pleno direito, pois se baseia em título inexistente. O imóvel sobrepõe-se à matrícula M-1056, registrada pelo INCRA desde 1984. O documento recomendou o cancelamento da matrícula irregular e de seus desmembramentos.
Por fim, exigimos do INCRA a retirada de todos os fazendeiros que grilaram as parcelas de terras pertencentes ao Assentamento Taboca, a sua regularização final e que as terras da Fazenda Santa Adyla, propriedade da União, sejam destinadas para fins de reforma agrária.