Homenagem aos mártires do Massacre de Eldorado do Carajás. Fotos: Breno Ortega

Por Setor de Comunicação e Cultura do MST-PR 
Da Página do MST

Os 21 trabalhadores rurais Sem Terra vítimas do Massacre de Eldorado do Carajás, no Pará, receberam espaço permanente de homenagem e memória no campus sede, da Universidade Estadual de Maringá (UEM), no Paraná, a partir desta quinta-feira (17). No dia que marca os 29 anos do crime ocorrido na Curva do S, duas obras do artista Jorge Pedro Lemes foram reinauguradas, após processo de restauração, em um espaço aberto do campus. 

A cerimônia reuniu a reitoria da Universidade, além de militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), de sindicatos e estudantes. Entre as convidadas estava Maria Zelzuita, testemunha do Massacre de Eldorado do Carajás, assentada na comunidade 17 de abril e integrante da coordenação do MST no Pará. Ela relatou detalhes daquele dia, e as consequências para as famílias Sem Terra vítimas da Polícia Militar e do governo do estado.

Maria Zelzuita, testemunha do Massacre de Eldorado do Carajás. Fotos: Breno Ortega

“Acabou com o sonho de várias pessoas, dos que eles mataram, dos que não morreram ali, porque foram embora e ficaram com medo”, relembrou. “Eu quase desisti do acampamento. Eu quase desisti, estava só eu e meu filho lá. Mas com o tempo que foi passando e disse ‘eu não posso desistir, eu tenho que dar valor a cada gota de sangue dos companheiros nossos que foram derramados em cima da pista’, aí, eu continuei”, enfatiza.

João Pedro Stédile, da coordenação nacional do MST. Foto: Breno Ortega

João Pedro Stédile, da coordenação nacional do MST, também participou da cerimônia, e reforçou o papel histórico das obras inauguradas: “Esses registros vão ficar na memória coletiva para nós impedirmos novos massacres e para lutarmos por um projeto de uma sociedade mais igualitária, mais justa, onde todos nós tenhamos os mesmos direitos e as mesmas oportunidades”.

História permanente de resistência 

Criadas em 2003 e batizadas como “Flores para os Sem-Terra” e “Nossas raízes”, as obras tinham sido deterioradas pelo tempo. Com a nova gestão à frente da Reitoria, as peças foram restauradas com materiais mais resistentes ao tempo, e agora ocupam um espaço perto da Pró-reitoria de Extensão e Cultura (Proec) da Universidade. Cada escultura feita em metal, madeira e cimento, traz um rosto e o nome de um dos mártires do massacre.

O movimento Levante Popular da Juventude fez a mística de abertura do ato. Foto: Breno Ortega

Jorge Pedro Lemes, artista responsável pela obra, explicou que elas são inspiradas principalmente nos totens indígenas. “Os tótens sempre trazem um rosto, uma figura humana, algum ser. E, nesse propósito, nós pensamos ‘como seria isso? como seria esse cemitério de insepultos?’, por isso os rostos dramáticos, porque queremos que fique, que esse trabalho se mostre como um lembrete da história”, disse. 

Durante a cerimônia, o reitor da UEM, Leandro Vanalli, reforçou o compromisso: “Essa obra importante, que traz a memória do Massacre, estava num cantinho aqui da nossa Universidade, deteriorada pelo tempo. E agora, com novos materiais, estrutura redimensionada, certamente vai trazer a memória durante décadas e décadas na nossa Universidade”, garantiu.

A jovem paraense Nieves Rodrigues também veio a Maringá e deu um testemunho sobre a continuidade da memória da luta no estado. Integrante da coordenação pedagógica do acampamento da Juventude na curva do S, que ocorre há 19 anos, com participação massiva. “A curva do S, que tem esse S de sangue, mas em S de sonhos. Esperamos comprometer e inspirar a nossa juventude não só na luta de Oziel, mas em todos aqueles que lutam pela terra”. 

Arte e memória de resistência 

Todo o ato de reinauguração foi permeado pelo sentido da potência da arte como forma de mobilizar a memória e alimentar a continuidade da luta. A cantora Mari Tenório abriu a manhã com a música de Geraldo Vandré, “Para não dizer que não falei das flores”, importante hino da resistência popular brasileira. Na sequência, a mística de abertura relembrou o momento da marcha de 1996, convocando os presentes, não para o luto, mas para uma memória de honra à coragem e à resistência dos camponeses que lutaram na curva do S.

A Orquestra Popular Camponesa é formada por crianças, adolescentes e adultos Sem Terra do Paraná. Foto: Breno Ortega

Foto: Asc/UEM

Após o cerimonial, os militantes e autoridades realizaram o plantio de duas mudas de árvore, símbolo de continuidade e de cuidado com as gerações futuras. Ao final da cerimônia, as crianças Sem Terra da Orquestra Popular Camponesa apresentaram o hino do MST, a canção anti-fascista italiana Bella Ciao, e a Asa Branca, de Luiz Gonzaga. Todas ao som do coral, violinos, violões, violas de arco e cielo. 

“Nós compartilhamos a dor, o luto, porque pessoas tiveram suas vidas massacradas e continua esse massacre”, disse emocionado o Padre Genivaldo Ubingi, representando a Arquidiocese de Maringá. “Nós também compartilhamos a esperança que vem da fé, a esperança que move a luta, a esperança que gera indignação. Então, em tudo isso, nós somos solidários. Estamos aqui juntos”, concluiu. 

A deputada federal (PT) pelo Paraná, Lenir de Assis, reforçou a importância da obra ser apresentada dentro do espaço da UEM. “Estar numa universidade pública que nós defendemos, isso é de fato um marco político, um marco de resistência e um ato de coragem”.

Ao final da cerimônia, as autoridades, artistas e militantes fizeram a inauguração oficial desta obra que recoloca de pé cada camponês tombado no dia 17 de abril de 1996. “Nós estamos aqui porque nós reconhecemos a importância da memória histórica. Nós não podemos apagar simplesmente o que aconteceu. Porque se o Brasil é um país sem história, é um país sem memória também”, comentou Gisele Mendes de Carvalho, vice-reitora da UEM.

A cantora Mari Tenório abriu a manhã com a música de Geraldo Vandré. Foto: Breno Ortega

*Edição: Solange Engelmann

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 17/04/2025