As mudanças acontecem de um jeito ou de outro – queiramos ou não. É impossível deter a passagem do tempo, conter a vida entre as mãos. No esporte não é diferente.
No futebol, por exemplo, tudo começa pelos nomes dos jogadores. Depois, vêm os times, muitos deles desconhecidos num período e sendo aos poucos incorporados aos cenários nacional e internacional. Nos últimos anos, tem sido cada vez mais comum o aparecimento – ou até o renascimento – de clubes espalhados pelo Brasil.
Outro dia, ficamos surpresos ao ver os confrontos envolvendo clubes como o San Antonio Bulo Bulo, da Bolívia; o Carabobo FC, da Venezuela, que de “bobo”, aliás, não tem nada; o Club Atlético Grau, do Peru; e o Mushuc Runa, do Equador, de origem indígena.
Falando em povos originários, agora mesmo tivemos a realização do I Campeonato Nacional Indígena, disputado por 92 equipes. A final foi emocionante, com a vitória da equipe da Aldeia Brejão Nioaque, de Mato Grosso do Sul, sobre o Terra Indígena Avaí, do Paraná.
Enquanto novos clubes vão surgindo e ganhando espaço em diferentes modalidades, alguns times tradicionais acabam ficando pelo caminho – felizmente, os que desaparecem são menos do que aqueles que surgem.
Os formatos de disputa também se transformam.
O Campeonato Brasileiro de Futebol Feminino está no auge, ganhando cada vez mais visibilidade. E seguimos sonhando com um futebol verdadeiramente integrado, em que todos possam disputar as partidas em igualdade de condições, sem qualquer distinção.
Enquanto esse futuro não chega, os campeonatos atuais seguem seus cursos. Lá fora, os europeus caminham para o fim da temporada. Aqui, o Brasileirão está só começando, em meio a outras competições que já não cabem no calendário.
O excesso de jogos e viagens tem gerado uma grande rotatividade nos elencos, afetando diretamente o rendimento dos atletas. Os clubes que contam com elencos maiores sofrem menos. Com mais opções, conseguem recuperar seus craques durante a temporada.
O Flamengo, por exemplo, lidera o campeonato e viu o retorno de Arrascaeta em grande estilo. Depois de uma fase de baixo rendimento, o atleta uruguaio voltou à equipe marcando os dois gols da vitória sobre o Grêmio, em Porto Alegre, no domingo 13, pela 3ª rodada do Brasileirão.
Com tantos compromissos, os técnicos são obrigados a rodar suas equipes. Isso, muitas vezes, é motivo de crítica por parte dos torcedores, que sentem a queda na qualidade do espetáculo.
Os ciclos se repetem: os times vivem fases vitoriosas, mas logo precisam passar por reformulações. É o que vêm fazendo Palmeiras e Botafogo, no Brasil, e o Real Madrid, que alterna sua hegemonia com o Barcelona, este novamente em ótima fase.
Já no esperado retorno de Neymar ao Maracanã, diante do Fluminense, o Santos acabou perdendo. No dia seguinte, no aniversário de 113 anos do clube, o técnico português Pedro Caixinha foi demitido. A data importante acabou ficando com um gosto amargo.
Em meio a esse cenário, não faltam também situações curiosas ou, para ser mais exato, verdadeiras trapalhadas. No jogo do Fortaleza contra o Internacional, o atacante Moisés marcou um golaço de bicicleta, de longe, num daqueles lances para entrar para a história. Mas, na comemoração, o companheiro Deyverson acabou empurrando e machucando Moisés, que teve de ser substituído. Para completar o absurdo da cena, o gol foi anulado pelo temido VAR e o jogo terminou sem gols.
Tivemos ainda a estreia da nova regra dos oito segundos para a devolução da bola pelos goleiros. No jogo entre Caxias do Sul e Floresta, do Ceará, pela Série C do Brasileirão, o goleiro ultrapassou o tempo, o juiz marcou escanteio para o adversário, e o Caxias acabou fazendo o gol da vitória por 1 a 0.
No mesmo campeonato, outra cena inusitada, no Morumbis, envolvendo o jogador Matheus Pereira, do Cruzeiro. O árbitro da partida esqueceu o nome de Matheus, camisa 10 da Raposa, na hora de mostrar o cartão amarelo para o jogador. Ao fazer a anotação em sua caderneta, ele esqueceu o nome do atleta e teve de pedir ajuda a outro árbitro. Matheus Pereira sentiu-se desrespeitado por não ser reconhecido.
No fim das contas, tudo volta ao começo desta conversa: os nomes dos jogadores e dos clubes estão mudando numa velocidade impressionante. Até na Seleção surgem atletas que grande parte do público ainda não conhece. O futebol, nesse sentido, continua sendo um espelho das transformações do mundo. •
Publicado na edição n° 1358 de CartaCapital, em 23 de abril de 2025.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Espelho do mundo’