Em sessão realizada pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), que analisou a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre os atos de 8 de janeiro, com os nomes de Jair Bolsonaro e aliados, agora como réus, a ministra Cármen Lúcia reforçou que os ataques às sedes dos Três Poderes em Brasília não foram um episódio isolado, mas sim o desdobramento de um processo sistemático de erosão democrática.

“Essa máquina tentou desmontar a democracia, isso é um fato. Todos assistiram ao quebra-quebra e à tentativa de matar o Supremo.”

Para apresentar seu voto, a ministra usou como referência a obra A máquina do golpe, da historiadora Heloisa Murgel Starling, para argumentar que golpes não ocorrem em um único dia, mas são longamente articulados nos bastidores do poder. “Em todas as fases [do livro], ela mostra como não se faz um golpe em um dia e como o golpe não acaba em uma semana ou um mês“.

“Desde a década de 50, ou logo depois da promulgação de 1946, a movimentação no sentido de não se aceitarem as conquistas constitucionais foi sendo urdida, trabalhada, planejada”, relembrou a ministra, mencionando episódios como a deposição do presidente brasileiro João Goulart e a crise política que levou ao suicídio de Getúlio Vargas.

Para Cármen Lúcia, o mesmo roteiro se repetiu no Brasil contemporâneo, culminando nos ataques de 8 de janeiro, mas sem o desfecho trágico que resultou na ditadura de 1964. “Tudo isso sendo gerado numa tentativa exatamente de não se permitir que o Brasil se constitucionalizasse numa democracia, acabando exatamente em 1964.”

O ataque às instituições

A ministra propôs ainda uma análise dos eventos “de trás para frente”, a fim de ilustrar que os atos foram premeditados e organizados em meio a uma escalada de desinformação e ataques sistemáticos às instituições democráticas.

“Não se formaliza golpe, porque não se planeja às escâncaras”, afirmou, ressaltando que servidores do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já percebiam um “ruído debaixo dos pés” antes dos ataques. A antecipação da diplomação do presidente Lula, de 19 para 12 de dezembro, foi citada como reflexo desse clima de instabilidade. “A máquina funcionando para desacreditar o que é da confiança do cidadão e da cidadã brasileira“.

A logística dos ataques foi outro ponto elencado pela ministra para demonstrar o planejamento dos golpistas: ônibus trazendo manifestantes para Brasília, equipamentos para invadir prédios públicos e uma estrutura que possibilitou o avanço sobre as sedes dos Três Poderes e a consequente depredação pelos vândalos.

“Não foi uma mera festa da Selma”

A existência de uma “Abin paralela” com práticas de espionagem ilegal também foi citada como indício da articulação prévia, bem como a resistência das instituições democráticas, que impediram o sucesso do intento golpista, diante de fatos que não foram, nem de longe, espontâneos. “Não foi uma mera ‘festa da Selma’”, disse, em alusão à justificativa de que os atos de 8 de janeiro teriam sido apenas uma manifestação desorganizada e espontânea.

“Quem praticou o crime tem que pagar pelo crime cometido”, concluiu a ministra, lembrando que 80% da população brasileira condenou os ataques e demonstrou repúdio aos atos de vandalismo e à tentativa de ruptura democrática.

Nesta quarta-feira (26), o ex-presidente Jair Jair Bolsonaro e mais sete aliados denunciados pela PGR por tentativa de golpe de Estado se tornaram réus, após análise da 1ª Turma do STF que autorizou a instauração de ação penal contra os envolvidos. Veja mais detalhes:

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 26/03/2025