Bolsonaro vê escapar sua anistia
por Fernando Castilho
Em março de 2023, uma pesquisa do Datafolha revelou que apenas 31% da população brasileira apoiava a ideia de anistiar os golpistas de 8 de janeiro. Naquela ocasião, há um ano atrás, a ideia de perdão geral não era exatamente a bandeira de Jair Bolsonaro. Mas no último dia 16, em Copacabana, o ex-presidente se superou e, com todo o fervor de um náufrago à procura de uma boia salva-vidas, defendeu a anistia como se fosse um pacote exclusivo só para ele. E, vamos ser sinceros, era exatamente isso. Nas últimas semanas, ficou claro para todos que, para Bolsonaro, a única anistia que vale a pena é a dele, e o resto… que se dane.
Embora 18 mil pessoas ainda seja um número considerável, é impossível ignorar que muitos milhares preferiram não perder seu tempo em um evento em que o único “golpista” sendo defendido era o próprio Bolsonaro. O PL, partido do ex-presidente, sequer se preocupou em avaliar se o evento em Copacabana teria chances de ser um sucesso ou um fiasco. Afinal, quem precisa de pesquisa quando você tem a certeza de que Copacabana vai lotar com os milhões de pessoas que curtem as redes sociais dos bolsonaristas?
Entre os presentes, tivemos alguns governadores, incluindo o “bolsonarista moderado” Tarcísio de Freitas, que, junto com Silas Malafaia, fez o discurso mais agressivo contra o STF e Lula e, claro, recheado de mentiras. No entanto, muitas das figuras do bolsonarismo simplesmente desapareceram, como Gustavo Gayer, provavelmente com vergonha de aparecer após as calúnias criminosas contra Gleisi Hoffmann, Lindberg Farias e Davi Alcolumbre, e Eduardo Bolsonaro, que, no auge da coragem, prometeu abandonar os Estados Unidos para se reunir ao papai. Mas adivinha? Não apareceu por medo de ter seu passaporte retido.
E o Silas Malafaia, sempre com uma explicação pronta, colocou a culpa do fracasso no “povo do Rio de Janeiro que acorda mais tarde aos domingos” e no Fla-Flu que eles estavam prestes a assistir. Será que não sabia disso? Mas, na real, o grande erro de avaliação foi dele, que achava que Copacabana seria o palco de uma megamanifestação, com 500 mil pessoas se reunindo para defender um quase réu por tentativa de golpe. Não rolou.
Mas, o que Bolsonaro realmente ganhou com essa manifestação?
- Apoio das ruas? Já era. Ficou claro que o ex-presidente não tem mais o apoio massivo da população, embora ainda tenha alguma capacidade de mobilização.
- O Centrão em dúvida? Perceberam que a causa de Bolsonaro não tem apoio popular. O projeto de anistia provavelmente vai naufragar sem deixar rastros.
- A direita percebeu? Começa a perceber que Bolsonaro se tornou um ícone personalíssimo, que impede que se escolha uma alternativa viável a ele, que já está inelegível. E, sem alternativa, o destino é uma derrota nas urnas. Foi por isso que Tarcísio, o “moderado”, se lançou no discurso de candidato.
- Defesa de Bolsonaro? Já estava difícil, mas ficou impossível depois de ele atacar seus julgadores.
- E aquele carro de som? Bandeira americana sobre a do Brasil, como se simbolizasse a entrega do país a Trump. Para muitos, fica claro que o discurso patriótico de Bolsonaro é uma grande enganação. O Brasil de Bolsonaro e seu filho 03 parece mesmo ser um Brasil entregue aos Estados Unidos.
Silas Malafaia ainda planeja fazer outra manifestação em São Paulo. Mas ele deveria avaliar melhor essa jogada. Afinal, como disse Einstein (ou pelo menos, alguém colocou isso na boca dele): “A definição de insanidade é fazer a mesma coisa repetidamente e esperar resultados diferentes.”
Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada.
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