Foto: Reprodução/Leonardo Boff

Por Leonardo Boff
Da Página do MST

“Gente humilde” é uma canção de Chico Buarque feita em parceria com outros. De sua vasta e complexa obra, esta canção é para mim a mais bela e significativa. Ela fala dos anseios que animam a teologia da libertação que confere centralidade à “gente humilde” e reconhece neles uma força histórica, pouco valorizada pelos analistas sociais.

As coisas verdadeiras e identificadoras das pessoas se realizam para além da consciência reflexa. São forças que atuam a partir do profundo da vida e do universo, do inconsciente abissal e de arquétipos ancestrais que assomam à consciência das pessoas e através delas se anunciam e emergem na história.

Transcrevo a canção “Gente Humilde”

“Tem certos dias em que eu penso em minha gente
E sinto assim todo o meu peito se apertar
Porque parece que acontece de repente
Feito um desejo de eu viver sem me notar
Igual a eles como quando eu passo no subúrbio
Eu muito bem vindo de trem de algum lugar
E aí me dá como uma inveja dessa gente
Que vai em frente
Sem nem ter com quem contar
São casas simples com cadeiras na calçada
E na fachada escrito em cima que é um lar
Pela varanda flores tristes e baldias
Com a alegria que não tem onde encostar
E aí me dá uma tristeza no meu peito
Feito um despeito de eu não ter como lutar
E eu que não creio peço a Deus por minha gente
É gente humilde, que vontade de chorar”

A Teologia da Libertação, que envolve ainda milhares de cristãos nos vários continentes, começou ao se enfrentar com essa situação relatada por Chico. Esses cristãos assumiram um compromisso libertador, confiando na “gente humilde” e em sua força histórica.

Quem tem Deus continuamente em seus lábios e O professa em suas palavras mas se distancia da “gente humilde”, se faz mouco aos reclamos da justiça e não se incomoda com a solidariedade, está longe de Deus e falto de sua graça.

Chico se colocou, sem pretendê-lo, ao lado do Deus vivo e verdadeiro porque se situou ao lado da “gente humilde”. Seu engajamento o situa infalivelmente do lado de Deus e no coração de seu projeto de um Reino de amor, de justiça e de paz.

Para viver esta dimensão não precisa ser religioso nem crer em Deus. Logicamente se é religioso e crê em Deus se vê reforçado. Mas não é indispensável. Basta ser humano, amante da justiça e um cantador do amor. Nisso se realiza a religião autêntica e aí se encontra o verdadeiro Deus.

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Last Update: 02/07/2024