
Por Leonardo Sakamoto, no UOL
Após a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República, são grandes as chances de Jair Bolsonaro tornar-se réu e ser condenado por tentativa de golpe de Estado. Por outro lado, como já disse aqui um rosário de vezes, também é altamente provável que ele fuja para evitar o xilindró. Diante disso, quais países poderiam ser o destino do ex-presidente?
Ele teve o passaporte apreendido, mas como ressaltou em janeiro deste ano, poderia fugir mesmo sem o documento. Poderia simplesmente cruzar a fronteira – não faltaria empresário que cederia um avião para ele fazer isso. Ou se refugiar na representação diplomática de um país de extrema direita em Brasília.
A Hungria, em cuja embaixada ele fez um test drive de fuga entre 12 e 14 de fevereiro do ano passado, pode até ser rota de passagem, mas dificilmente destino final. Por mais que ele fosse recebido com carinho pelo autocrata Viktor Orbán, Budapeste conta com poucos brasileiros e o húngaro é uma língua tão complicada que até o diabo tem medo dela. Seria um local mais difícil para ele transformar em sede de sua “resistência” no exílio.
A vizinha Argentina é governada por Javier Milei, que ostenta laços com a família Bolsonaro. Por outro lado, por mais bravatas que faça sobre Lula e o Mercosul, seu país é por demais dependente economicamente do Brasil para comprar uma briga desse tamanho. É possível que deixe a questão para o Poder Judiciário local, que vem sendo uma pedra no sapato dos brasileiros que participaram dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 e se refugiaram por lá.
O que não significa que Jair não poderia ficar em Buenos Aires um tempo até conseguir um jeito de voar para longe, uma autorização de entrada ou concessão de asilo em outro lugar. Aqui importam menos os acordos de extradição que o Brasil tenha com outro país e mais quem detém o poder no momento.
No Oriente Médio, Israel governado por Benjamin Netanyahu ou mesmo Emirados Árabes, Arábia Saudita ou Catar poderiam ser possíveis destinos, dada a relação com a família Bolsonaro. Mas é uma situação mais frágil, tanto pela possibilidade de mudança política em Tel Aviv, considerando que o primeiro-ministro precisa da guerra para se manter no poder, quanto por Jair ser rifado pelas petroditaduras tendo em vista o interesse econômico.
Os locais com mais chances de dar pouso para Bolsonaro é a Itália da primeira-ministra Giorgia Meloni, com quem ele divide visão de mundo. O ex-presidente já disse em entrevistas que seus avós eram de lá e que poderia obter facilmente a dupla cidadania. “A legislação de vocês diz que eu sou italiano”, disse ao jornal Corriere Della Sera. Preventivamente, parlamentares da oposição apresentaram uma proposta para impedir que Roma dê cidadania a condenados por crimes contra o Estado.
E, claro, os Estados Unidos. Sob a gestão de Donald Trump e Elon Musk, ele poderia pedir asilo, com apoio da extrema direita republicana no Capitólio. Não moraria em Washington DC, mas em um local que ele conhece bem, sente-se em casa e nem precisaria falar inglês, língua que ele não domina: a Flórida.

Foi para lá que ele viajou em 30 de dezembro de 2022, antes de terminar o seu mandato, permanecendo por três meses nas proximidades da Disney. Diz que fez isso para não passar a faixa presidencial, mas investigações sobre o plano golpista apontam que ele temia ficar no Brasil e ser preso, tanto pela conspiração ocorrida nos meses anteriores quanto pelo 8 de janeiro que aconteceria após a posse de Lula.
Na denúncia, que está sendo analisada pela Primeira Turma do STF, a PGR coloca o ex-presidente como principal beneficiário do golpe, que visaria à sua manutenção no poder após ter perdido a eleição.
“A responsabilidade pelos atos lesivos à ordem democrática recai sobre organização criminosa liderada por Jair Messias Bolsonaro, baseada em projeto autoritário de poder. Enraizada na própria estrutura do Estado e com forte influência de setores militares, a organização se desenvolveu em ordem hierárquica e com divisão das tarefas preponderantes entre seus integrantes”, afirma o documento.
Frente à proximidade de sua prisão devido à condenação no âmbito da Lava Jato, muitos sugeriram a Lula asilar-se fora do país, o que ele rechaçou. O STF acabou anulando a condenação por conta da falta de lisura do processo, mas ele pagou 580 dias de cana na carceragem da Polícia Federal em Curitiba e foi impedido de concorrer em 2018. Mesmo entre os aliados, muitos duvidam que ele opte por fazer o mesmo que o petista.
Se ele resolver ficar, a eleição presidencial de 2026 pode tirá-lo da cadeia, a depender do resultado. Vencendo Lula ou alguém por ele apadrinhado, nada muda, ele continuaria em sua cela de Estado Maior, remoendo a fuga não realizada. Mas, ganhando um nome da oposição com apoio real do ex-presidente, o contexto muda, não apenas pela possibilidade de perdões, ainda que questionáveis, mas também pela correlação de forças.
A construção de uma alternativa que poderia ajudar a tirar o ex-presidente da cadeia depende, em última instância, do próprio abrir mão, em primeiro lugar, de sua estratégia de arrastar-se como candidato fictício nas urnas para se fortalecer e vitimizar e, segundo, de querer liderar a direita, aceitando ceder o lugar e a vez a outra pessoa.
Preso, ele será um ativo para a extrema direita, um mártir nas eleições. Contudo, se fugir, pode ser tachado de covarde. Ele tem alguns meses para pensar se prefere sua liberdade ou seu legado.
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