Depois de mais de quatro anos da morte de Diego Maradona, começa nesta terça-feira 11 o julgamento sobre a responsabilidade daqueles que tinham o dever de cuidar da saúde do ex-jogador, falecido aos 60 anos. No banco dos réus, sete profissionais da saúde são acusados de homicídio.
Os promotores públicos viram provas de negligências que teriam conduzido à morte do ídolo argentino em 25 de novembro de 2020, levando um país à comoção em plena pandemia.
Os sete réus são acusados de “homicídio simples com dolo eventual”, isto é, uma pessoa é consciente de que a sua negligência pode levar outra pessoa à morte. Se condenados, as penas variam de oito a 25 anos de prisão.
As audiências devem se estender até julho, com 120 testemunhas, incluindo parentes, médicos, peritos, jornalistas e amigos, que devem depor no Tribunal de San Isidro, a cerca de 30 quilômetros de Buenos Aires.
Diego Armando Maradona morreu aos 60 anos por “insuficiência respiratória e parada cardíaca”, mas os promotores viram uma situação de “desamparo” e de “abandono” por parte daqueles que deveriam cuidar da saúde do ex-jogador.
Maradona deveria ter recebido “cuidados intensivos” de forma domiciliar, mas, em vez disso, foi “abandonado à sua própria sorte”, segundo a acusação.
Em 2021, uma comissão médica, criada pela Justiça com 22 profissionais, concluiu que o atendimento a Maradona foi “inadequado, deficiente e imprudente”, que a morte poderia ter sido evitada, mas que o deixaram morrer depois de “de 12 horas de agonia”.
Os acusados
A lista dos sete acusados inclui o próprio médico pessoal de Maradona -o neurocirurgião Leopoldo Luque-, um médico clínico, uma psiquiatra, um psicólogo, além de uma médica coordenadora do plano de saúde, de um coordenador de enfermeiros e de um enfermeiro.
A oitava acusada, uma enfermeira, pediu um júri popular e será julgada separadamente, em outro processo, a partir de julho.
Ao todo, cinco denúncias foram apresentadas contra os acusados: quatro delas partem dos cinco filhos reconhecidos de Maradona, enquanto a quinta foi registrada por suas irmãs.
“Há muitas evidências de como roubaram Maradona e de como deixaram que ele morresse. É o suficiente para irem todos presos. São assinaturas falsificadas, histórias clínicas adulteradas”, garante o advogado Mario Baudry, representante de Diego Fernando, filho de Maradona.
A lenda do futebol se recuperava de uma cirurgia para retirar um hematoma na cabeça, mas não quis continuar internado na clínica. A equipe médica concordou com uma internação domiciliar, apesar de diversas patologias que o ex-jogador sofria como problemas renais, hepáticos, cardíacos, neurológicos e da dependência de drogas.
A internação domiciliar foi improvisada numa casa sem os recursos necessários. “Uma internação indignante”, acusam os promotores públicos, que encontraram provas de omissões por parte dos profissionais e questionaram a conduta dos acusados que “não cumpriram com a boa prática médica”.
Os promotores acusam os envolvidos de saberem que agiam mal, de serem conscientes de que Maradona ia morrer, de saberem que poderiam ser presos e de procurarem alterar a história clínica de Maradona para não deixarem rastros.
“Ele vai morrer”, “isto acaba mal”, “manipulemos a história clínica para nos cobrirmos”, “podemos terminar presos”, “tenho medo” são alguns dos diálogos trocados entre os acusados.
Defesa técnica
As provas aparecem nas trocas de mensagens escritas e de áudios por parte dos envolvidos, revelando que a saúde de Maradona era relegada a segundo plano, enquanto os interesses financeiros dos envolvidos predominavam. Os acusados também conspiravam para manter a família afastada, temendo que se levassem Maradona, todos perderiam o trabalho e os rendimentos.
Segundo o advogado Mario Baudry, a família de Maradona refere-se a mensagens de áudio e texto que vieram a público no início da investigação, nas quais ‘ficou claro que eles (a equipe médica) sabiam que se Diego continuasse assim, ele morreria”.
“O que eles dizem nos áudios e mensagens é para tentar fazer com que as filhas de Diego não o levassem, porque se o fizessem, perderiam o dinheiro”, acusou Baudry.
O debate deve passar pelas questões médicas. A psiquiatra e o psicólogo, por exemplo, devem alegar que só cuidavam da saúde mental de Maradona. Os enfermeiros devem argumentar que recebiam ordens, que o paciente “era difícil” e não aceitava nenhum tratamento.
O exame toxicológico de Maradona revelou ausência de álcool e de drogas ilegais, apesar de, nos áudios, aparecer que os enfermeiros davam regularmente álcool e maconha para se livrarem do comportamento característico de um dependente químico.
Impacto popular
Um fator que poderá ter influência no resultado é a pressão popular por encontrar culpados pela morte de Maradona.
À medida que as provas forem apresentadas e se houver uma percepção de que Maradona poderia ter sido salvo, os torcedores fanáticos podem desenvolver uma visão parcial, exigindo justiça contra aqueles que considerarem responsáveis por abandonar seu ídolo.
Depois deste julgamento, o corpo de Maradona deve ser transferido de um cemitério particular a um mausoléu, o “Memorial M10”, numa área turística de Buenos Aires, em um espaço para receber um milhão de visitantes por ano.