O golpista general Paulo Sérgio Nogueira e o chefão Jair Bolsonaro

O perfil oficial do Ministério da Defesa publicou, em 7 de novembro de 2022, ainda sob o governo Bolsonaro, um tuíte que direcionava para um canal no Telegram contendo uma mensagem pedindo um golpe de Estado. A publicação permaneceu no ar por 28 meses. Questionado, o ministério optou por não comentar o caso, diz o Estadão.

A postagem original no então Twitter ocorreu oito dias após a derrota do presidente Jair Bolsonaro (PL) para Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na eleição. Na época, o titular da pasta era o general Paulo Sérgio Nogueira, que anteriormente havia comandado o Exército.

O tuíte do Ministério da Defesa orientava os usuários a acessar uma nota sobre o relatório de fiscalização do sistema eletrônico de votação. No entanto, o link compartilhado redirecionava para o Telegram, onde havia apenas uma mensagem publicada: “Dê o golpe jair”, acompanhada de um emoji da bandeira do Brasil.

O pedido foi postado em um canal intitulado “Ministério da defesa”, com erro na capitalização do nome da pasta. Esse canal contava com apenas 289 inscritos e não era oficial. Já a conta oficial da Defesa no Twitter (atualmente X), que hoje é administrada pelo governo Lula, tem 910 mil seguidores e mantém publicações semanais. O ministério também possui um canal oficial no Telegram, com mais de 20 mil seguidores.

Consultados informalmente, membros do ministério não souberam esclarecer se a publicação resultou de um ataque hacker ou do envolvimento de algum servidor.

Há registros de usuários indicando que a mensagem pedindo golpe foi publicada entre a noite de 9 de novembro e a tarde de 10 de novembro de 2022. O episódio ocorreu enquanto o Ministério da Defesa e setores das Forças Armadas conduziam uma investigação sobre as urnas eletrônicas.

Antes dessa publicação, a conta oficial da Defesa já havia divulgado um comunicado sobre a auditoria das urnas. No site oficial do ministério, uma nota publicada em 7 de novembro informava que, dentro de dois dias, a pasta encaminharia ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o relatório de fiscalização do sistema eletrônico de votação, conduzido por técnicos militares das Forças Armadas.

O documento foi entregue no dia 9 e não apontou indícios de fraude eleitoral. O relatório reconheceu que os boletins das urnas coincidiam com os resultados divulgados pelo TSE, comprovando que os votos registrados no encerramento da votação correspondiam à totalização oficial.

Apesar disso, o então ministro Paulo Sérgio Nogueira solicitou uma investigação técnica urgente para apurar possíveis riscos à segurança das urnas, alegando que um “código malicioso” poderia comprometer o funcionamento dos equipamentos de votação.

Na época, o Estadão apurou que o uso desse termo pelo ministro foi interpretado no TSE como uma tentativa de atender às expectativas de Bolsonaro, que via no relatório uma última chance de contestar o resultado das eleições.

Conta oficial do Ministério da Defesa de Bolsonaro no Telegram direciona para chat com pedido de golpe. Foto: Reprodução/Telegram

O documento final do Ministério da Defesa continha mais de 5 mil palavras distribuídas em 22 páginas, sem mencionar diretamente o termo “fraude”. No entanto, a redação do relatório deixava margem para questionamentos sobre uma suposta interferência eleitoral, ainda que sem apresentar qualquer evidência concreta.

Nos dois meses seguintes, autoridades do governo federal e membros da cúpula das Forças Armadas realizaram reuniões e discutiram um possível golpe de Estado, incentivando apoiadores a pressionar por uma intervenção, conforme demonstraram investigações posteriores da Polícia Federal.

Áudios revelados pela TV Globo no mês passado indicam o envolvimento de militares e civis ligados ao governo em um plano para tentar um golpe. Em trocas de mensagens, oficiais incitavam a participação popular na articulação.

No mês passado, Jair Bolsonaro e Paulo Sérgio Nogueira foram denunciados ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela Procuradoria-Geral da República (PGR) sob acusação de tentativa de golpe de Estado. A denúncia do procurador-geral, Paulo Gonet, incluiu outras 32 pessoas.

O envolvimento de Nogueira no suposto plano golpista foi descrito como “indiscutível” na denúncia. Gonet destacou que o general apresentou uma minuta de teor golpista aos comandantes das Forças Armadas, fato confirmado à Polícia Federal pelo comandante do Exército, general Freire Gomes, e pelo chefe da Aeronáutica, tenente-brigadeiro Carlos Baptista Junior.

Ainda segundo a denúncia, Nogueira teria insistido no tema ao reunir-se novamente com os comandantes das Forças Armadas em seu gabinete. O procurador-geral destacou que a tentativa de envolvimento dos chefes militares na ruptura institucional tornou o papel de Nogueira ainda mais evidente.

“Ao insistir, em reunião restrita com os comandantes das três Armas, na submissão de um decreto que contrariava as normas constitucionais vigentes, sua participação na insurreição se tornou ainda mais clara”, afirmou Gonet.

Ele acrescentou: “Um ministro da Defesa não convoca os comandantes das Forças Armadas para apresentar um projeto de decreto desse tipo sem uma das duas intenções – ou persuadi-los a adotar medidas drásticas contra o presidente da República que propõe a ruptura constitucional, ou demonstrar sua adesão ao golpe. A segunda hipótese foi a que se confirmou.”

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Last Update: 09/03/2025