O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou nesta quarta 5 uma isenção temporária de um mês sobre as novas tarifas de 25% aplicadas a importações do Canadá e do México, impactando diretamente o setor automotivo do continente americano.

A trégua foi concedida a veículos que fazem parte do Acordo Estados Unidos-México-Canadá — mas, segundo a Casa Branca, as tarifas recíprocas entrarão em vigor a partir de abril, sem exceção.

O Brasil está entre os países que podem ser prejudicados pela decisão, com possível aumento nos custos de produção e nos preços finais dos veículos e de outros bens de exportação.

Tarifas e impactos na América do Norte

O tarifaço de Trump tenta pressionar montadoras a transferirem sua produção para os Estados Unidos, numa tentativa de reindustrializar o país — a começar pelo setor automotivo, que engloba parte da região conhecida como Rust Belt, onde se concentram diversos ‘estados pêndulo’ nas corridas eleitorais dos Estados Unidos, e onde os trabalhadores locais se sentem mais “abandonados” pelos governos das últimas décadas.

O setor automotivo norte-americano reagiu de imediato. A Aliança para Inovação Automotiva alertou, no entanto, que os custos para os consumidores podem subir em até 25%, impactando diretamente as vendas.

John Bozzella, presidente da entidade, destacou que a cadeia de suprimentos da região é complexa e que a realocação de produção não ocorre de forma instantânea.”As tarifas podem aumentar os custos para os consumidores antes que os empregos retornem ao país”, alertou.

As possíveis consequências para o Brasil

Para o Brasil, as consequências podem ocorrer em três frentes: encarecimento das peças importadas, aumento dos preços dos veículo e impacto na concorrência interna

O economista Igor Lucena destaca que as tarifas podem influenciar toda a cadeia produtiva.

“Hoje, o carro é um conjunto de componentes eletroeletrônicos, de aço, ferro, software e tecnologia”, destaca o economista Igor Lucena. “Se houver tarifa elevada sobre esses produtos, seja energia ou peças eletrônicas, os veículos e seus componentes que chegam ao Brasil ficarão mais caros.”

As montadoras também monitoram o possível reflexo das tarifas na oferta de veículos importados do México. “Há uma exportação grande de carros mexicanos. Esse excedente pode vir ao Brasil, mas não a ponto de reduzir os preços por aqui”, avalia Milad Kalume Neto, consultor independente do setor.

Segundo ele, contudo, a grande preocupação segue sendo a taxa Selic elevada, que limita o crédito e reduz o poder de compra do consumidor brasileiro.

Bruno Corano, economista da Corano Capital, reforça que a medida pode tornar o Brasil menos competitivo em diversos setores, e aplicação das tarifas recíprocas coloca o Brasil em uma posição frágil. “Se os Estados Unidos igualarem os impostos aplicados ao Brasil, as exportações brasileiras vão cair, certamente.”

Aço, autopeças e o impacto no custo final

O setor de siderurgia também entra na equação. Os Estados Unidos não são autossuficientes na produção de aço, o que torna a commodity um alvo direto das tarifas.

“A Gerdau USA importa semiacabados para finalizar a laminação lá. Para as outras siderúrgicas brasileiras, pode haver pequena queda de preços no mercado internacional para escoar o que não for direcionado aos EUA”, explica David Wong, sócio da Alvarez & Marçal.

Wong aponta que, comparativamente, o Brasil exporta pouco para México e Canadá, sendo a nossa exportação mais vinculada a produtos para veículos que não são exportados para os EUA, como carros menores, e para a reposição, que representa pouca coisa, então o impacto seria nulo.

“No caso dos veículos no Brasil, não importamos os mesmos modelos do México que os americanos.  Temos um acordo com o México. O risco de aumento está em conteúdo de veículo exportado para o Brasil com partes americanas e isto elevaria o preço do carro”, completa.

Pressão inflacionária e taxa de juros

O Brasil já enfrenta uma pressão inflacionária que pode ser agravada pelo aumento dos custos de importação.

Produtos como plásticos, etanol, ferro e aço estão entre os itens que podem encarecer, elevando a pressão sobre o índice de preços ao consumidor.

No pior cenário, caso os EUA apliquem tarifas de 25% sobre produtos brasileiros, o país perderia cerca de  6,5 bilhões de dólares em exportações, resultando em uma alta de 0,25% no IPCA, segundo projeções do Bradesco.

Em outro cenário, de equalização das tarifas, o custo para o Brasil seria de 2 bilhões de dólares e o impacto seria de 0,1% na inflação oficial.

Concorrência e mercado interno

Outro fator que influencia a precificação é a presença dos carros chineses, que chegam ao Brasil com estratégias agressivas de precificação.

“Os chineses estão pressionando os preços para baixo”, pontua Lucena. “No entanto, essas tarifas podem fazer até mesmo os carros chineses ficarem mais caros.”

Isso pode modificar a dinâmica de preços no mercado interno e a estratégia das montadoras instaladas no Brasil.

O mercado automotivo brasileiro continua em uma fase de incerteza. A concorrência segue alta, com 44 marcas disputando um mercado que ainda apresenta demanda reprimida. Somente em 2025, sete montadoras chinesas devem entrar no mercado brasileiro com novos modelos eletrificados.

Os especialistas sugerem, em uníssono, que as montadoras precisam equilibrar custos, preços e estratégias para lidar com os impactos globais da nova política tarifária dos EUA.

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Last Update: 05/03/2025