As centrais sindicais publicaram nesta terça-feira (4) uma nota em que pedem o fortalecimento da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP). A cobrança ocorre como consequência das muitas repercussões que o filme Ainda Estou Aqui – vencedor do Oscar de Melhor Filme Internacional – tem causado. Outra conquista que pode ser atribuída à produção, baseada no livro de Marcelo Rubens Paiva, é a análise que o Supremo Tribunal Federal (STF) irá fazer sobre a Lei da Anistia, que beneficiou militares envolvidos em crimes de sequestro e cárcere privado, como no caso Rubens Paiva.

Na nota, os sindicalistas indicam apoio à “luta das famílias penalizadas por não poderem viver o luto”, assim concordam com a filha de Rubens e Eunice, Vera Paiva, que em artigo defendeu a retomada plena da Comissão, com um orçamento que dê conta do desafio.

Leia mais: STF vai julgar validade de anistia a militares no caso Rubens Paiva

Entre os três principais objetivos da Comissão, constam:

  • reconhecer pessoas que tenham participado, ou tenham sido acusadas de participação, em atividades políticas entre 2 de setembro de 1961 e 5 de outubro de 1988, e que por este motivo tenham sido detidas por agentes públicos e desaparecido;
  • esforço para localizar e identificar restos mortais de desaparecidos políticos;
  • reparar as famílias das vítimas ao emitir parecer sobre indenizações.

Histórico da CEMDP

A Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos foi criada pela Lei nº 9.140/1995 e ampliada na primeira gestão do presidente Lula, a partir de 2003. A CEMDP funcionou até 2022, ainda que tenha sido inviabilizada durante a gestão de Jair Bolsonaro por desprezo à reparação histórica. Para completar, em um dos últimos atos de maldade do governo Bolsonaro o colegiado foi extinto a menos de 15 dias do final do mandato.

Leia mais: Lula diz a Walter Salles que “Ainda Estou Aqui” lava alma do povo brasileiro

Com isso, o presidente Lula, desde que assumiu, anunciou a volta da Comissão e tomou medidas administrativas e jurídicas junto ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania para o retorno. A reinstalação do colegiado se deu em julho de 2024, ocasião em que Lula ainda realizou dispensas de antigos membros e a nomeação novos pelo Diário Oficial.

Mas com a paralisação ocasionada por Bolsonaro, a última identificação de ossadas de desaparecidos políticos feita pela Comissão ocorreu em 2018 a partir da vala clandestina de Perus, encontrada no cemitério Dom Bosco, em São Paulo (SP), em 1990.

Retorno dos trabalhos

 A partir da retomada dos trabalhos, a CEMDP realizou agora, em fevereiro de 2025, as primeiras diligências técnicas em cemitérios para busca e identificação de vítimas da ditadura. Estas primeiras agendas, cumprindo o cronograma aprovado em 2024, foram realizadas nos cemitérios da Várzea e Santo Amaro, no Recife (PE).

Ao todo, desde o início dos trabalhos, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania já analisou mais de 300 casos, o que resultou no reconhecimento das mortes dos desaparecidos políticos e no pagamento de indenizações às famílias. As buscas já realizadas abrangem áreas como Araguaia, Rio de Janeiro e Foz do Iguaçu e a vala de Perus, trabalho que ainda permanece.

Leia mais: Certidão de óbito de Rubens Paiva agora admite assassinato pela ditadura

Além disso, a CEMDP retificou assentos de óbito (registro da morte no cartório) para cumprir o estabelecido pelo Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que atuou entre 2012 e 2014. A retificação é fundamental, uma vez que corrige a real causa da morte indicada pelo atestado de óbito e permite que os familiares tenham as certidões de óbito corrigidas.

 Em janeiro desse ano, a certidão de óbito do ex-deputado federal Rubens Paiva foi corrigida após determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – outra causa que o filme Ainda Estou Aqui ajudou a despertar.

Agora consta na certidão emitida pelo Cartório da Sé, como causa da morte: “não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro no contexto da perseguição sistemática à população identificada como dissidente política do regime ditatorial instaurado em 1964.”  A versão anterior do documento, de 1996, constava apenas que ele havia desaparecido em 1971. Ao todo, mais de 400 vítimas terão os registros de óbito corrigidos, calcula o CNJ.

Confira abaixo a nota pública assinada pelos presidentes das centrais, incluindo Adilson Araújo da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), em que ressaltam que “os responsáveis pelos crimes da ditadura precisam ser punidos, respondendo, assim por seus atos.”

Fortalecer a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos

O sucesso do filme Ainda Estou Aqui, dirigido por Walter Salles, abriu o debate sobre um assunto muito importante no Brasil: os mortos e desaparecidos da ditadura militar. Nós das centrais sindicais apoiamos a luta das famílias penalizadas por não poderem viver o luto por seus entes mortos de forma cruel e injusta.

Esta é uma ferida que, depois de 40 anos de redemocratização, ainda está aberta. Aberta, inclusive, para a família Paiva, que batalha para encontrar os restos mortais do ex-deputado Rubens Paiva, assassinado pela ditadura em 1971.

Nesta terça-feira (4), a filha de Rubens e Eunice, Vera Paiva, falou ao jornal Folha de São Paulo sobre a expectativa de que o governo retome plenamente os trabalhos da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos, extinto pela gestão de Jair Bolsonaro e restituído em 2024, mas com baixo orçamento.

Consideramos fundamental que o governo abrace esta causa e se empenhe em fortalecer a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos.

Precisamos resolver essa dívida histórica com as famílias dos mortos e desaparecidos durante os 21 anos da ditadura militar. Os responsáveis pelos crimes da ditadura precisam ser punidos, respondendo, assim por seus atos.

Só conseguiremos avançar na construção da democracia tendo consciência da nossa história, transmitindo-as para as novas gerações e passando a limpo injustiças perpetradas pelo Estado em um passado recente.

Sem anistia aos golpistas!

São Paulo, 04 de março de 2025

Sergio Nobre, Presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT)

Miguel Torres, Presidente da Força Sindical

Ricardo Patah, Presidente da UGT (União Geral dos Trabalhadores)

Adilson Araújo, Presidente da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil)

Moacyr Roberto Tesch Auersvald, Presidente da NCST (Nova Central Sindical de Trabalhadores)

Antonio Neto, Presidente da CSB (Central dos Sindicatos Brasileiros)

Atnágoras Lopes, Secretário Executivo Nacional da CSP-Conlutas

Nilza Pereira, Secretária geral da Intersindical Central da Classe Trabalhadora

José Gozze, Presidente da PÚBLICA, Central do Servidor

Emanuel Melato, Coordenador da Intersindical – Instrumento de Luta e Organização da Classe Trabalhadora

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 05/03/2025