Um acordo firmado entre a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Eletrobrás privatizada nesta sexta-feira (28). O entendimento, que substitui a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7385 no Supremo Tribunal Federal (STF), mantém a limitação do poder de voto da União em 10% na empresa, apesar de seus 43% de ações ordinárias, e concede ao governo federal o direito de indicar três dos dez membros do conselho de administração.
Em contrapartida, a Eletrobrás será desobrigada de aportar recursos na construção da usina nuclear Angra 3, transferindo ao poder público e aos consumidores um ônus bilionário. A Associação dos Empregados da Eletrobrás (AEEL) considera o acerto um duro golpe na soberania energética do País.
As negociações, iniciadas após o governo questionar judicialmente a perda de influência na companhia – privatizada em 2022 -, culminaram em um termo que será submetido à assembleia geral da Eletrobrás e à homologação do STF até 6 de março. O acordo preserva o teto de 10% no poder de voto para qualquer acionista – um dos pilares do modelo de privatização – e suspende obrigações da empresa com a Eletronuclear, estatal responsável pelas usinas nucleares de Angra. O governo também se comprometeu a buscar um comprador para a participação da Eletrobrás na Eletronuclear, enquanto o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) foi acionado para estruturar uma nova modelagem para o projeto de Angra 3, estimado em mais de R$20 bilhões.
Analistas de mercado celebraram o desfecho, apontando que o acordo reduz temores de interferência estatal e abre caminho para a Eletrobrás focar em dividendos e eficiência operacional. As ações da companhia dispararam no Ibovespa, com altas de 4,19% (ELET3) e 3,59% (ELET6) até o início da tarde. O impacto para os cofres públicos e os consumidores, no entanto, é visto como preocupante: o custo de conclusão de Angra 3 e a manutenção de Angra 1 e 2, antes compartilhados com a Eletrobrás, agora recairão exclusivamente sobre o Estado e as tarifas de energia, num montante que pode ultrapassar R$30 bilhões.
O governo federal, que no início do mandato bradava contra a privatização da Eletrobrás – classificada pelo presidente como “crime de lesa-pátria” –, mudou de tom. A AGU, inicialmente mobilizada para reverter a perda de controle acionário, optou por uma conciliação nos bastidores, sem mobilizar trabalhadores ou pressionar por uma reestatização. Essa medida troca influência real por cargos no conselho e expõe os limites de uma política que evita confronto direto com os interesses privados que hoje dominam a empresa, como o grupo 3G, controlador com menos de 0,5% das ações ordinárias.
A situação da Eletronuclear, destacada no acordo, é outro ponto sensível da negociação. Operando Angra 1 e 2, a estatal tenta concluir Angra 3, porém enfrenta uma crise financeira agravada pela política da Eletrobrás privatizada. Antes da entrega ao imperialismo, a empresa arcava com parte dos custos do programa nuclear, mas agora se livra dessas responsabilidades.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou que abandonar Angra 3 exigiria um desembolso imediato de R$14 bilhões para desmobilização, além de comprometer a operação das outras usinas por falta de recursos. A Associação Mundial de Operadores Nucleares (WANO) já alertou para a degradação da segurança nas plantas, resultado de cortes de R$400 milhões na manutenção em 2024, promovidos pela diretoria da Eletronuclear sob pressão da Eletrobrás.
A receita anual da Eletronuclear, de R$4,7 bilhões, fixada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), não cobre os R$2,4 bilhões anuais necessários para Angra 3 e a extensão da vida útil de Angra 1. Relatórios apontam que a atual gestão da Eletrobrás, liderada por Ivan Monteiro, busca maximizar lucros às custas do sucateamento do setor nuclear, uma estratégia que pode forçar o Estado a reassumir o controle da Eletronuclear – mas a um custo elevado e sem garantias de segurança operacional. Trabalhadores denunciam que o acordo apenas consolida esse abandono.
A AEEL, em nota divulgada nesta sexta-feira, foi enfática: “Esse verdadeiro acordão não devolve a Eletrobrás aos brasileiros, não sana a inconstitucionalidade da privatização e livra a empresa de suas obrigações com o programa nuclear, gerando prejuízo bilionário para os cofres públicos e os consumidores. É uma traição ao País.” A associação critica a troca de 43% de influência real por três cadeiras no conselho, que chama de “cargos de luxo” sem poder efetivo, e acusa o governo de convalidar o “escárnio” que outrora condenou. Veja a íntegra da nota abaixo:

Acordo entre Governo e Eletrobrás privatizada é traição ao país!

Confirmada a notícia de que até o próximo dia 06 de março a Eletrobrás privatizada e o governo Lula apresentarão ao STF um acordo em torno da ADI 7385 e se esse acordo mantiver os contornos anunciados pelos canais oficiais, tanto da Eletrobrás quanto do governo, o Brasil terá sofrido mais um terrível golpe em sua soberania.

Terá sido a segunda traição nacional em torno questão da Eletrobrás. A primeira foi a do golpista Bolsonaro, que na campanha afirmou que jamais privatizaria a Eletrobrás. A segunda – caso concretizado esse acordo indigno – terá sido obra do presidente Lula, que prometeu durante a campanha devolver a Eletrobrás como patrimônio do povo e que chegou a chamar a privatização da empresa de “crime de lesa-pátria” e de “escárnio”, mas que, ao que tudo indica, pretende convalidar esse crime e ainda por cima gerar um prejuízo bilionário para os cofres públicos.

Em primeiro lugar é importante lembrar que a ADI 7385 não questiona a privatização em si, mas apenas o fato de que a lei da privatização da Eletrobrás, de maneira flagrantemente inconstitucional, limitou, sem nenhum tipo de compensação, o poder de voto da União na companhia a apenas 10%, mesmo tendo 43% das ações ordinárias. O primeiro erro já se deu quando governo aceitou participar ativamente do processo de conciliação sobre o direito de voto da União na companhia. Ora, se o próprio governo afirma que essa limitação é inconstitucional, não havia o que conciliar com a direção da Eletrobrás e caberia somente ao próprio STF se pronunciar sobre a procedência ou não da reclamação do governo.

Mas o pior estava por vir. Já nas primeiras rodadas as discussões passaram da justa reivindicação da retomada do poder de voto do governo para a indicação de membros no Conselho de Administração da empresa.

É importante ressaltar que uma coisa é o governo ter 43% dos votos na assembleia geral de acionistas, podendo formar alianças com outros acionistas privados e exercer real influência na empresa. Outra é poder indicar três dos dez membros do conselho de administração, mantendo apenas 10% do poder de voto. Serão apenas cargos decorativos, sem nenhuma influência real na companhia, ainda que regiamente remunerados.

Mas o pior é que além de aceitar a capitulação em troca de três cargos de luxo, o governo ainda negocia um presente que nem mesmo Bolsonaro ousou dar aos piratas que tomaram a Eletrobrás de assalto. De acordo com as comunicações oficiais da empresa e do governo, estes estão negociando a saída da Eletrobrás da Eletronuclear e a desobrigação desta com a manutenção das Usinas de Angra 1 e 2 e da conclusão de Angra 3.

As obrigações com a Eletronuclear foram o ônus que a Eletrobrás privatizada teve que arcar em troca do extraordinário bônus de ganharem o direito de vender mais caro para o consumidor a energia das hidrelétricas amortizadas que antes era a mais barata do mercado.

O resultado disso é que o governo e o consumidor (o povo brasileiro) terão de arcar sozinhos com os mais de R$ 30 bilhões necessários para a atualização de Angra 1 e 2 e a conclusão de Angra 3, já que a Eletrobrás, que deveria aportar quase metade desse valor se verá desobrigada.

Em resumo, esse verdadeiro acordão “com supremo e com tudo”:

Não devolve a Eletrobrás aos brasileiros;
Não devolve o poder de voto da União na Eletrobrás;
Não sana a inconstitucionalidade da privatização;

Consolida e legitima a ilegalidade e o “escárnio” do “crime de lesa-pátria” que foi a privatização da Eletrobrás;
E, ainda por cima, livra a Eletrobrás privatizada de suas obrigações com o programa nuclear brasileiro, podendo gerar prejuízo bilionário para os cofres públicos e para os consumidores.

Esse acordo só beneficia os acionistas privados da Eletrobrás e o grupo 3G, o mesmo da fraude bilionária nas Americanas e que hoje controla a companhia, mesmo tendo menos de 0,5% das ações ordinárias.

Tudo isso a troco de três cargos de R$ 200.000,00 por mês para o governo distribuir entre aliados.

A categoria eletricitária que lutou e luta sem um segundo de trégua em defesa de uma Eletrobrás pública e da soberania energética nacional, que enfrentou os golpistas Temer e Bolsonaro, que sofreu e ainda sofre as mais duras perseguições, jamais, em hipótese alguma, compactuará com mais uma traição nacional, ainda mais vinda de um governo que ajudou, com todo entusiasmo, a eleger.

Rio de Janeiro, 28 de fevereiro de 2025
Associação dos Empregados da Eletrobrás – AEEL

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Last Update: 01/03/2025