Dedicado aos que não faziam ideia

por Felipe Bueno

Se a História não estiver presente, ou se for silenciada, estaremos sempre condenados à surpresa, ao deslumbramento e à mistificação. À luz de tudo que já se passou neste ainda recém-nascido 2025 – e projetando, sem nenhuma pretensão triunfalista, o que ainda pode acontecer, peço sua licença para novamente recorrer ao poder de Clio como uma das grandes professoras da humanidade, ressalvando o fato de que, assim como ocorre a qualquer outro bom docente, ela tem sido tanto ouvida como ignorada desde o alvorecer dos tempos.

A velocidade atual da transmissão de verdades e mentiras potencializa o adolescente ansioso que nunca morrerá dentro de cada ser humano. Diante de tanta informação e desinformação, promove-se frequentemente uma auto-sabotagem na capacidade de filtrar o que se vê, num processo simultâneo ao da atrofia do mecanismo de recorrer à memória e à própria vivência. Em outras palavras, vamos perdendo o hábito de parar para pensar o necessário a fim de avaliar a mensagem que acabou de chegar em nossa multitela.

Marshall McLuhan, Roland Barthes e Umberto Eco se desesperariam ao constatar como suas projeções teóricas foram ultrapassadas por uma realidade muito mais insana. O último até teve a oportunidade de ver, na prática, o paroxismo – até o momento em questão – de muito sobre o que escreveu. Quanto aos outros dois, coincidentemente deixaram o mundo no mesmo 1980, ano que, visto com os olhos de hoje, soa terrivelmente datado e distante, quase uma pré-história da humanidade.

Considerando o exemplo visto na Alemanha neste fevereiro, que não dista do que aconteceu na França – e no Parlamento Europeu de modo geral em 2024, podemos assegurar que há no Velho Continente um universo populacional, representado por uma faixa média de 20%, para quem os outros quatro quintos do mundo, num largo espectro que vai da extrema esquerda à direita moderada, não têm respostas, ou elas são insatisfatórias para questões que esses 20% consideram essenciais.

Que não se cometa o erro, ainda comum no Brasil, de explicar o fenômeno como um insidioso e surpreendente aumento da estupidez das massas de manobra. É mais que hora de reconhecer que e quando interesses comuns se encontram.

A consequência, adaptando o ditado, é que uma mão suja a outra. De forma deliberada e sem medo, à luz do dia.

Cada qual traz na bagagem particular sua história e suas vivências. A ninguém se pode exigir tudo conhecer, até porque trata-se talvez da maior das ilusões, responsável em mais de uma ocasião pelo nascimento e pela manutenção de mais de uma falsa religião, seja sagrada ou laica. Por outro lado, já não se pode mais admitir quem justifica e desagrava uma decisão, um voto ou um comportamento com a velha frase “eu não fazia ideia”.

Felipe Bueno é jornalista desde 1995 com experiência em rádio, TV, jornal, agência de notícias, digital e podcast. Tem graduação em Jornalismo e História, com especializações em Política Contemporânea, Ética na Administração Pública, Introdução ao Orçamento Público, LAI, Marketing Digital, Relações Internacionais e História da Arte.

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Last Update: 28/02/2025