Na última semana, a Procuradoria-Geral da República (PGR) encaminhou uma denúncia ao Supremo Tribunal Federal contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros 34 de seus aliados por uma tentativa de golpe de Estado.
Segundo a denúncia, Bolsonaro teria, dentre outras acusações, editado um decreto golpista e pressionado os militares para executá-lo, bem como apoiado os eventos do 8 de janeiro de 2023 e atuado para prejudicar e questionar os resultados do processo eleitoral.
Não há dúvida que imputar os responsáveis por uma tentativa de ferir (ou, nesse caso, derrubar) o Estado Democrático de Direito é imprescindível. Os crimes contra o Estado estão, de fato, previstos na lei brasileira.
É necessária muita precaução neste momento para evitar qualquer margem para mais desconfiança em relação às instituições. Os julgamentos a respeito desse episódio devem ser justos e transparentes. É fundamental que haja imparcialidade nas decisões, e que estas sigam à risca a legislação brasileira, para evitar arbitrariedades e garantir a integridade do processo judicial.
Além disso, é preciso refletir sobre o que as acusações realizadas pela PGR indicam sobre a saúde democrática no Brasil. Enquanto um regime jovem, que enfrentou períodos de ruptura, é perceptível a fragilidade de nossa democracia, tanto cultural quanto institucionalmente, o que nos torna mais suscetíveis a tentativas de golpe de Estado.
Pesquisas recentes apontaram para uma crescente desconfiança institucional, sobretudo entre os jovens. Percebeu-se que os sentimentos negativos em relação à política aumentaram no ano de 2019, durante o governo Bolsonaro, em comparação a 2015. Dentre os fatores associados a isso, destaca-se a expansão do projeto “Escola Sem Partido”, que defende uma educação “neutra” nas salas de aula, mas que, ao lutar contra a “doutrinação” nas escolas, por vezes questiona a facticidade de eventos como a Ditadura Militar de 1964.Isso também se relaciona com a socialização política desses jovens, que não passaram por períodos de autoritarismo, o que os faz confiar mais na interferência das Forças Armadas na política, e, portanto, podem apoiar atentados à democracia. A educação para a democracia, nesse sentido, é fundamental.
Sabe-se, também, que apesar de importante, uma estrutura institucional robusta não é suficiente para garantir a qualidade de uma democracia. É preciso ter uma cultura política democrática enraizada na sociedade. Por isso, a tentativa de golpe da qual Bolsonaro e seus aliados são acusados é um indicador de uma cultura política de desconfiança institucional, que torna as democracias jovens – como o Brasil – mais suscetíveis a este tipo de atentado contra o Estado de Direito.
Outra questão a ser levantada, pensando nas acusações contra Bolsonaro, é a instabilidade da estrutura institucional brasileira. Um dos fatores que indica isso é a falta de compliance – isto é, respeito às regras pelos atores que comandam as instituições. Um exemplo disso seria a interpretação subjetiva da lei pelos ministros do Supremo Tribunal Federal. Este tipo de instabilidade institucional também aumenta a susceptibilidade a interrupções do processo democrático.
Por esse motivo, como mencionado anteriormente, é fundamental que as tentativas de derrubar o establishment democrático sejam punidas. Entretanto, também é essencial que haja compliance e transparência por parte das instituições, evitando arbitrariedades nos julgamentos e garantindo a preservação da democracia e do Estado de Direito