O Conselho Federal de Medicina (CFM) defende que apenas aprovados em exame de ordem realizado pela própria entidade possam exercer a medicina, independentemente de terem sido aprovados e diplomados ao término de um curso integral, com seis anos de duração.
Certificar o bom desempenho da medicina é fundamental, assim como regular a qualidade das entidades privadas de ensino, que respondem por significativa oferta de cursos.
A autorização para muitos cursos foi concedida pelo Ministério da Educação (MEC) a partir da Lei do Mais Médicos, visando enfrentar a má distribuição e a falta de profissionais no País. Mas também por ações judiciais que, sob a falaciosa “moratória” dos governos Temer e Bolsonaro, autorizaram a abertura de mais de 6,5 mil vagas.
Por que ser contra o exame de ordem proposto pelo CFM?
A avaliação das escolas médicas deve ser um processo obrigatório e permanente, que permita ao MEC atuar sobre deficiências e problemas ao longo do processo de formação, não após a conclusão do curso.
Essa ação deve incluir a avaliação dos estudantes e sua visão sobre a formação e as condições de ensino oferecidas. Com isso, medidas de correção dos rumos podem ser implementadas tempestivamente.
Afinal, para uma boa formação são fundamentais a qualidade do corpo docente e do projeto pedagógico; a capacidade de gestão do curso; a infraestrutura de laboratórios; e os cenários de prática onde a aprendizagem possa ser garantida. O exame de ordem não incide sobre nada disso.
A abertura de escolas médicas privadas deve passar por processos regulatórios robustos e transparentes. A autorização, o reconhecimento e a regulação dos cursos pelo MEC devem garantir segurança e qualidade.
O exame de ordem, ao final do curso, ataca efeitos, não causas. Além de não garantir melhor formação, ele concentrará poder nas mãos de uma parte da corporação e poderá resultar em reserva de mercado.
Outro ponto é que pune o estudante e sua família. Para os egressos de universidades públicas, grande parte oriunda das escolas públicas e do sistema de cotas, portanto de famílias humildes, pode significar o fim do sonho de um futuro melhor. O impacto sobre a classe média, que investe – com grande esforço – em mensalidades absurdas, em torno de 12 mil reais, também será expressivo.
Enquanto isso, instituições privadas continuarão transferindo o ônus aos formandos e seus familiares. Aos reprovados restará passar mais um período de suas vidas enriquecendo donos dos cursinhos preparatórios – muito deles médicos – para a prova.
O exame de ordem não contribuirá para diminuir erros de diagnóstico, prescrição e conduta, que geram custos ao SUS e danos irreversíveis aos pacientes.
Avaliar competências profissionais e éticas, conhecimentos teóricos e habilidades clínicas com base nos padrões mínimos exigidos para o exercício da profissão, conforme as Diretrizes Nacionais Curriculares da Medicina, previstas em lei federal, é tarefa do MEC.
Sob o comando do Ministro Camilo Santana, passos importantes têm sido dados. O MEC voltou a formular políticas para regulação e supervisão das instituições públicas e privadas. Tem estimulado e garantido a ampliação de novas vagas de Medicina nas universidades públicas federais. O Conselho Nacional de Educação trabalha para debater e aperfeiçoar as Diretrizes Nacionais Curriculares.
Mudanças na Comissão Nacional de Residência Médica, com participação paritária entre governo e entidades médicas, têm permitido avançar na ampliação de vagas, qualificação do acesso e avaliação da qualidade da Residência, considerada o padrão-ouro de formação de especialistas e vital no percurso de formação.
Em breve, novas medidas para aprimorar a avaliação dos formandos e das instituições superiores que oferecem cursos de Medicina serão implementadas. A regulação da qualidade de formação não pode estar a serviço de objetivos corporativos e reserva de mercado.
Que o CFM zele pelo exercício ético-profissional da medicina e ajude a garantir saúde com qualidade para todos os brasileiros, deixando a quem de direito a imprescindível tarefa de regular e garantir a qualidade dos futuros médicos. O que é certo é que precisamos de mais e melhores médicos, distribuídos equitativamente pelo território nacional. •
Publicado na edição n° 1351 de CartaCapital, em 05 de março de 2025.