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Friedrich Merz, líder da União Democrata-Cristã (CDU), está prestes a assumir o cargo de chanceler da Alemanha, conforme apontam as projeções das eleições gerais realizadas em 23 de fevereiro.
O bloco de centro-direita CDU/CSU vinha liderando com folga, registrando cerca de 30% das intenções de voto nas pesquisas, e Merz era considerado o principal adversário do atual chanceler Olaf Scholz, do Partido Social-Democrata (SPD).
Sua vitória representa um retorno notável à política. Após uma ausência de 12 anos, Merz voltou ao Bundestag em 2021 e, agora, aos 69 anos, será o chanceler mais velho desde Konrad Adenauer, que assumiu o cargo em 1949, aos 73 anos.
Embora Scholz e Merz compartilhem a formação em Direito, suas trajetórias e estilos são distintos. Merz se destaca pela presença imponente, seja discursando em público ou em encontros privados. Apesar de acessível e bem-humorado em interações pessoais, seu hábito de se inclinar ao falar com as pessoas nem sempre causa boa impressão.
Saída da política e carreira no setor privado
Merz se afastou da política no início dos anos 2000, quando Angela Merkel consolidou sua liderança na CDU e, posteriormente, se tornou chanceler em 2005.
Enquanto Merkel era vista como uma estrategista cuidadosa, Merz sempre foi um político mais inclinado a assumir riscos. Um exemplo recente foi sua tentativa de aprovar uma rígida lei de imigração com o apoio da extrema direita da Alternativa para a Alemanha (AfD), provocando indignação e protestos em todo o país. Para muitos, essa iniciativa rompeu um tabu histórico de cooperação com a extrema direita, mas Merz defendeu sua decisão como uma estratégia para conter o crescimento do partido anti-imigração.
Nos anos 2000, ele era considerado um dos principais rivais de Merkel dentro da CDU. Em 2001, tentou se candidatar a chanceler para as eleições federais de 2002, mas o partido optou por Edmund Stoiber, da CSU, que acabou derrotado pelo então chanceler Gerhard Schröder. Com isso, Merz gradualmente se afastou da política, deixando de concorrer ao Bundestag em 2009.
Natural de Sauerland, uma região montanhosa no oeste da Alemanha, Merz seguiu os passos do pai ao se tornar advogado e se filiar à CDU. Em 1989, aos 33 anos, foi eleito para o Parlamento Europeu. Cinco anos depois, ingressou no Bundestag, onde rapidamente se destacou como um orador influente.
Após sua saída da política, construiu uma bem-sucedida carreira no setor privado. Entre 2005 e 2021, atuou em uma firma de advocacia internacional e ocupou cargos de alto escalão em conselhos administrativos e de supervisão. De 2016 a 2020, presidiu o conselho de supervisão da BlackRock na Alemanha, a maior gestora de ativos do mundo.
Com o anúncio da saída de Merkel da política em 2021, Merz retornou à CDU e, após duas tentativas frustradas, foi eleito líder do partido em 2022, consolidando sua posição como representante da ala mais conservadora.
Declarações polêmicas e posturas controversas
Merz tem um histórico de posicionamentos conservadores. Nos anos 1990, votou contra a legalização do aborto e contra o diagnóstico genético pré-implantacional. Em 1997, gerou forte reação ao se opor à criminalização do estupro marital.
Defensor da energia nuclear, sempre advogou por uma política econômica liberal e pela redução da burocracia. No início dos anos 2000, criticou as políticas migratórias alemãs, alegando a existência de “problemas com estrangeiros” e defendendo uma “cultura predominante” no país.
Nos últimos anos, voltou a tocar nesses temas. Em uma entrevista na TV em janeiro de 2023, criticou a falta de integração de imigrantes e afirmou que havia “pessoas que não deveriam estar na Alemanha e que, por termos tolerado por tanto tempo, agora causam problemas”. Também acusou alguns pais imigrantes de não reconhecerem a autoridade de professores, especialmente mulheres, e chamou seus filhos de “pequenos paxás”. A declaração foi amplamente criticada por seu tom racista, mas a cúpula da CDU permaneceu em silêncio.
Com a saída de Merkel, muitos de seus aliados políticos deixaram a CDU, e Merz tem enfrentado desafios ao lidar com a repercussão de suas próprias falas.
Um partido mais conservador
Desde que assumiu a liderança, Merz afirma ter reposicionado a CDU, levando o partido a uma linha mais conservadora. Ele credita a si mesmo o novo programa da legenda, que, segundo ele, “colocou a CDU de volta nos trilhos”.
Embora a CDU tenha endurecido seu discurso sob sua liderança, as opiniões pessoais de Merz pouco mudaram nas últimas décadas.
Após o colapso da coalizão governista de Scholz, formada pelo SPD, os Verdes e o Partido Liberal Democrático (FDP), Merz decretou o fim da aliança. “O governo não fracassou apenas por causa do FDP, mas porque nunca teve uma base real de governabilidade”, afirmou.
“A esquerda acabou” e a incerteza sobre coalizões
Agora, Merz e a CDU/CSU enfrentam um dilema: com quem formar um governo?
Ele tem descartado qualquer aliança com a extrema direita da AfD. No entanto, na véspera da eleição, intensificou suas críticas aos outros partidos.
Em um comício final em Munique, declarou que “a esquerda acabou” e que “não há mais maioria progressista na Alemanha”. Também atacou os protestos contra a extrema direita e disse que, se eleito, governaria para a “maioria dos alemães que pensam de forma racional” e não para “lunáticos verdes ou de esquerda”.
As declarações geraram forte repercussão. O líder do SPD, Lars Klingbeil, acusou Merz de aprofundar as divisões políticas do país. O secretário-geral do SPD, Matthias Miersch, comparou sua retórica à de Donald Trump, afirmando que “um chanceler para todos não fala dessa maneira”.
Antes das eleições, o SPD era visto como o parceiro mais provável da CDU em um novo governo de coalizão. No entanto, com a guinada conservadora de Merz e suas declarações polarizadoras, o cenário político alemão pode estar à beira de uma reconfiguração profunda.