Mudanças climáticas, exploração de petróleo na Foz do Amazonas e o PIB: as sinapses que faltam
por Marijane Vieira Lisboa, Tomás Tarquinio Togni e Jean Marc von der Weid
Crescem as pressões para que o IBAMA conceda licença para a pesquisa sobre o petróleo na Foz do Amazonas. Lula pressiona Marina, dizendo que certamente não é ela quem está criando problemas (leia-se, é o Rodrigo Agostinho do Ibama?); Marina rebate a bola dizendo que não tem nada a ver com uma decisão a respeito, já que o licenciamento é um ato técnico e o Lula volta a afirmar que o Brasil quer explorar o petróleo e uma das razões para isso é financiar a transição energética. Outros argumentos esgrimidos pela turma dos “dedos sujos de petróleo” é o esperado aumento do PIB e a provável falta de petróleo daqui há dez anos quando nossas reservas se esgotarem.
Tudo muito estranho, porquê:
1.Abrir novas fontes de exploração de petróleo, inclusive as da Margem Equatorial, não são decisões técnicas, mas decisões transcendentais na área de política ambiental. Ou caminhamos para uma política de abandono das fontes fósseis – carvão, petróleo e gás – ou insistimos no rumo suicida da catástrofe climática. A Agência Internacional de Energia afirma que o Planeta não deveria abrir nenhuma nova exploração de energias fósseis se quiser manter a elevação da temperatura média até 2º. Assim, não há porque a ministra Marina dizer que não tem nada a ver com isso, aliás foi ela quem quis acrescentar ao nome do Ministério de Meio Ambiente a expressão “Mudanças Climáticas”. Se formos explorar petróleo na Margem Equatorial, escolhemos o rumo suicida e ela terá sido responsável por isso, por omissão.
2. Não precisamos explorar petróleo para financiar a transição energética. Energia eólica, solar, eficiência energética e outras soluções são bem mais baratas do que abrir novos poços, plataformas marítimas e construir a infraestrutura necessária para isso. Eventuais rendas do petróleo extraído na Margem Equatorial só começariam a fluir daqui uns dez anos, quando, aliás, será bastante tarde para tocar um programa de transição energética.
3. O argumento de que precisamos de explorar o petróleo para aumentar o PIB também não se sustenta porque aumentos de PIB não significam automaticamente melhora da qualidade de vida de um país ou região. Tudo depende de para quem vai e como um Estado distribui a riqueza que ele arrecada. A exploração do Pré-Sal não fez do Estado do Rio de Janeiro uma região mais desenvolvida, com melhores escolas, saúde e moradia. Mas certamente mais poluída, custo de vida e moradias mais caras e até maior criminalidade. Se vamos gastar dinheiro para construir plataformas, estradas, portos, oleodutos para explorar petróleo, melhor construir escolas, hospitais, avançar no saneamento, pagar salários melhores a professores, assistentes sociais e médicos. O PIB aumentará igualmente, mas irá diretamente para os bolsos da população em vez de se perder por aqueles meandros que conhecemos.
4. Finalmente, se o problema é o temor de ficarmos sem petróleo daqui a dez anos, melhor guardar o que temos em vez de exportá-lo, pois o petróleo tem sido uma das principais commodities da nossa pauta de exportação, além da soja, do ferro e da carne.
Assim, à falta de sinapses para justificar a abertura de novos poços de petróleo justamente quando o governo Lula diz reconhecer que estamos enfrentando uma emergência climática, não há porque não desconfiar de outros motivos ocultos para tal. Obras tem impacto a curto prazo, gerando um fluxo de dinheiro que alimenta campanhas eleitorais, emendas parlamentares e outras coisas menos confessáveis. Não é à toa que Alcolumbre é um dos maiores interessados nesse assunto.
Não, Marina, explorar a Margem Equatorial não é apenas uma decisão técnica. Antes do licenciamento, há uma decisão sobre a política brasileira de enfrentamento das Mudanças Climáticas que precisa ser tomada. Diga a que você veio.
Não, Lula, o Brasil não quer explorar a Margem Equatorial. Não fale em nosso nome. Isso não estava no seu programa eleitoral e você não nos consultou.
Marijane Vieira Lisboa – Socióloga, ambientalista, Professora da PUC-SP
Tomás Tarquinio Togni- Antropólogo, ambientalista
Jean Marc von der Weid – Ex-presidente da UNE entre 1969 e 1971. Fundador da ONG Agricultura Familiar e Agroecologia (AS-PTA) em 1983. Membro do CONDRAF/MDA entre 2004 e 2016. Militante do movimento Geração 68 Sempre na Luta
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