A tentativa do presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), de minimizar os ataques de 8 de Janeiro de 2023 provocou uma reação de políticos do campo progressista, inclusive de lideranças do PT, partido do presidente Lula.
Trata-se, na prática, da primeira rusga com Motta, eleito sucessor de Arthur Lira (PP-AL) no sábado 1º com 464 votos, graças a uma robusta aliança, da esquerda à extrema-direita.
O presidente da Câmara afirmou na sexta-feira 7, em entrevista à rádio Arapuan FM, de João Pessoa (PB), ter havido uma “agressão inimaginável” às instituições, mas rejeitou o intuito golpista por trás dos atos de 2023.
“Golpe tem que ter um líder, tem que ter pessoa estimulando, apoio de outras instituições interessadas, como as Forças Armadas, e não teve isso”, afirmou a liderança do Centrão. “Ali foram vândalos, baderneiros que queriam, com a inconformidade com o resultado da eleição, demonstrar sua revolta.”
“O 8 de Janeiro foi uma tentativa de golpe”, reagiu o novo líder do PT na Câmara, Lidbergh Farias (RJ). “Tinha um plano de assassinar Alexandre de Moraes, Lula e Alckmin. Era tudo uma tentativa de golpe. O 8 de Janeiro era a última tentativa.”
O petista disse ser necessário contextualizar a invasão e a depredação das sedes dos Três Poderes, por não ser um fato isolado. Ele mencionou a chamada minuta do golpe e as reuniões de Jair Bolsonaro com chefes militares para tratar de planos de ruptura democrática. “Os comandantes do Exército e da Aeronáutica não toparam, mas o da Marina topou.”
Lindbergh se refere às descobertas da PF no âmbito do chamado inquérito do golpe, no qual ela indiciou 40 pessoas ao STF, entre as quais Bolsonaro, ex-ministros e ex-comandantes militares. O líder do PT optou, porém, por não mencionar Hugo Motta em um vídeo sobre o tema nas redes sociais.
Estratégia semelhante marcou a resposta da senadora Eliziane Gama (PSD-MA), relatora da CPMI do 8 de Janeiro, em 2023.
“Posso atestar categoricamente: após cinco meses de investigação, de receber centenas de documentos e de ouvir dezenas de testemunhas, houve tentativa de golpe e o responsável por liderar esses ataques tem nome e sobrenome. É Jair Messias Bolsonaro”, escreveu.
Ao se dirigir a “quem, por ventura, ainda tiver alguma dúvida”, recomendou a leitura do relatório da comissão.
A presidenta do PT, Gleisi Hoffmann, resolveu não comentar diretamente a declaração de Motta, mas voltou a se pronunciar contra o projeto de lei bolsonarista para anistiar envolvidos no 8 de Janeiro. Motta tem evitado se comprometer a pautar ou a enterrar a proposta.
Gleisi declarou ser “simplesmente descabido” votar a matéria. “Não se trata de atender o objetivo político deste ou daquele partido, mas de defender a democracia, respeitar e cumprir a decisão da Justiça sobre os ataques aos Três Poderes. É sem anistia!”
Para o deputado Rogério Correia (PT-MG), vice-líder do Governo, “dizer que o bolsonarismo não tentou um golpe contra a democracia é de um negacionismo inaceitável”. Novamente, não houve citação ao presidente da Câmara, mas a indireta foi mais contundente.
“Para ganhar uma eleição pode-se fazer promessas, mas nunca atos que coloquem em risco a democracia”, disparou Correia. “Esse discurso não combina com lideranças que emergiram na democracia e que só exercem seu poder graças ao povo. Ainda estamos aqui, vigilantes.”
No início deste mês, o Supremo Tribunal Federal condenou mais três integrantes dos atos golpistas de 2023. Um deles é o homem que furtou uma réplica da Constituição de 1988 que estava exposta na Corte, sentenciado a 17 anos de prisão. A cada um dos outros dois réus coube a pena de 14 anos de prisão.
Segundo a Procuradoria-Geral da República, suas denúncias já levaram a 374 condenações de participantes dos ataques em Brasília.
A maioria do STF costuma acompanhar os votos do relator, Alexandre de Moraes, baseados na avaliação de que o grupo do qual os réus faziam parte tinha a intenção de derrubar o governo democraticamente eleito em 2022. O ministro sustenta que ocorreu um crime de autoria coletiva em que, a partir de uma ação conjunta, todos contribuíram para o desfecho.