Em 6 de fevereiro de 2015, na Vila Moisés, no bairro do Cabula, em Salvador, 12 jovens negros (entre 16 e 27 anos) foram executados pela Polícia Militar da Bahia (PM-BA), durante um episódio que ficou internacionalmente conhecido como ‘A Chacina do Cabula’. Entre as vítimas, quatro eram adolescentes:
Caique Bastos dos Santos, 16; Natanael de Jesus Costa, 17; Rodrigo Martins de Oliveira, 17; Tiago Gomes das Virgens, 18; Bruno Pires do Nascimento, 19; Agenor Vitalino dos Santos Neto, 19; Vitor Amorim de Araújo, 19; Adriano de Souza Guimarães, 21; João Luís Pereira Rodrigues, 21; Jeferson Pereira dos Santos, 22; Evson Pereira dos Santos, 27 anos; e Ricardo Vilas Boas Silva, 27.
Como sempre, a PM utilizou o velho e mentiroso discurso que teria apenas reagido a disparos de arma de fogo supostamente iniciados pelas vítimas. Na época, a corporação informou, em nota, que o tiroteio aconteceu após denúncias de que um grupo planejava roubar um banco na região e que com os jovens teriam sido encontrados revólveres e armas de grosso calibre. No entanto, posteriormente, a apreensão foi negada.
Execução como método…
As perícias mostraram que os corpos das vítimas havia marcas de tortura como braços quebrados e olhos afundados. Parte dos disparos foi realizada de cima para baixo. Vítimas apresentavam perfurações na palma da mão, braços e antebraços.
Pelo menos cinco marcas de tiros, alguns deles disparados a curta distância, de menos de 1,5 metro, foram identificados nos laudos. As investigações cadavéricas do Departamento de Polícia Técnica (DPT) revelaram que um dos jovens foi atingido por um disparo que entrou na base da cabeça e saiu pelo queixo, evidenciando a proximidade do tiro. Os mesmos exames também identificaram perfurações que atravessaram simultaneamente braços e antebraços, indicando tentativas de defesa.
Em depoimentos, testemunhas afirmaram que as 12 vítimas estavam desarmadas, e que a versão de confronto dita pela PM não era verdadeira, que todos foram rendidos e espancados antes de serem conduzidos a um campo de barro, local onde foram executados.
…impunidade como regra!
A chacina ganhou notoriedade apenas um mês depois (6 de março), após vídeos serem exibidos em telejornais, o que levou o Ministério Público a fazer uma denúncia apontando indícios de execução.
Contudo, em julho do mesmo ano, apenas 5 meses após a chacina, a ação criminal foi julgada pela juíza Marivalda Almeida Moutinho, absolvendo os acusados. O inquérito da Polícia Civil, apontou legítima defesa na ação dos PMs.
Após muita luta dos movimentos sociais, em 2018, ocorre a anulação da sentença pelo Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA). O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou a federalização do processo, mantendo-o sob o forte risco de tráfico de influência nas instituições baianas. Hoje, o processo corre em segredo de justiça.
Enquanto isso, os 12 PMs envolvidos nos homicídios seguem trabalhando normalmente. O que mostra que a impunidade é uma regra geral na justiça burguesa quando as vítimas são os pobres, negros e periféricos. Aqueles que a vida não tem valor no capitalismo.
Violência policial e impunidade como política de Segurança Pública do PT
Durante os quase 20 anos de governo na Bahia, o PT adotou a violência policial e a impunidade como política de Estado. O resultado é que temos o maior número de vítimas de homicídios por força polícia em todo o país e o maior número de chacinas policiais no Nordeste.
Essa política é defendida pelos governadores do PT em suas declarações. Rui Costa, governador à época da Chacina do Cabula, hoje o chefe da Casa Civil do governo Lula (PT), parabenizou os policiais responsáveis pela chacina, pela frieza e a calma necessárias para tomar a decisão certa: “É como um artilheiro em frente ao gol que tenta decidir, em alguns segundos, como é que ele vai botar a bola dentro do gol, pra fazer o gol”, comparou.
“Depois que a jogada termina, se foi um golaço, todos os torcedores da arquibancada irão bater palmas e a cena vai ser repetida várias vezes na televisão”, completou. No governo de Rui Costa (2015-2022), a letalidade policial subiu em 313%.
Recentemente, o atual governador Jerônimo Rodrigues, que gosta de posar de “governador dos direitos humanos” por ter “ascendência negra e indígena”, defendeu as últimas ações violentas dos policiais e pediu respeito à instituição Polícia Militar da Bahia. Afirmou que todos os mortos pela polícia são “homicidas, traficantes, estupradores, assaltantes, entre outros criminosos”, como se houvesse justificativa para execuções policiais.
Extermínio do povo pobre, preto e periférico
O alvo dessa política é o povo pobre, preto e periférico, como apontam todos os dados divulgados por institutos de estudos e pesquisas. O Anuário de Segurança Pública mostrou que em 2023, a Bahia liderou mais uma vez o ranking de mortes por intervenção policial. O Estado registrou 1.699 óbitos, o que significa uma em cada quatro mortes decorrentes de ação policial no Brasil ocorreram na Bahia. Os dados de 2024 ainda serão divulgados, mas tudo indica que seguirá na liderança.
Em 2022, a Rede de Observatórios de Segurança divulgou, na publicação “Pele alvo: a cor que a polícia apaga”, que 97,9% dos mortos por policiais na Bahia são negros. Isso mesmo, 98 a cada 100 mortos são pessoas negras. É o extermínio da juventude pobre e negra sendo colocado em prática. Um verdadeiro genocídio.
Mas em meio a esse massacre do povo negro, trabalhador e pobre, o que vemos é um enorme silêncio das entidades e coletivos dos movimentos negros. Agem assim porque são parte desse governo. Ocupam cargos em secretarias e gabinetes. Perderam a independência política. Tornaram-se corresponsáveis por essa situação.
São corresponsáveis por essa política de segurança aplicada para manter a ordem social vigente, a serviço de uma minoria burguesa racista e genocida, que construiu o seu império, fonte do seu poder, escravizando negros e negras por 388 anos e mantendo altos índices de superexploração, especialmente entre a população negra, nos dias de hoje.
Uma política de segurança que cumpre um papel de grande capitão do mato da burguesia baiana, os herdeiros dos velhos coronéis escravocratas. É com e para esse povo da Casa Grande que o PT governa.
O PT administra a Bahia a serviço dos interesses da classe dominante, com um programa social-liberal, em um arco de alianças com partidos da direita tradicional e das oligarquias locais, e com uma política econômica liberal, privatista e a favor do grande capital.
Aos trabalhadores, negros e pobres, sobram as mazelas. A Bahia é o Estado com o maior número de desempregados do país, segundo o IBGE; tem 15,5% da população em insegurança alimentar, de acordo com a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional; e ocupa o 3° lugar no ranking nacional de habitações precárias e tem o 5° maior déficit habitacional do país, segundo a Fundação João Pinheiro.
Sem atrelamento
Nenhuma confiança no governo do PT
Não podemos depositar nenhuma confiança no governo de Jerônimo Rodrigues (PT). Ele é o principal responsável por essa política de segurança que mata o povo negro, pobre e trabalhador das periferias. Em meio ao genocídio do estado sionista de Israel contra o povo palestino, o governador petista segue comprando armas israelenses. As armas que matam o povo palestino são as mesmas que matam o povo preto e pobre pela polícia mais violenta do país.
São as comunidades periféricas que estão sofrendo com as operações belicistas: escolas e postos de saúde fechados, ônibus sem circulação e pessoas impedidas de irem ao trabalho. Enquanto aqueles que lucram com o tráfico seguem numa boa, nos condomínios de luxo, sem a polícia metendo os pés em suas portas, sem balas atingindo seus filhos.
É preciso derrotar essa política, a mesma que há anos é aplicada no Rio de Janeiro, que não resolve o problema da violência, que é um problema social e não bélico. É preciso garantir emprego, educação de qualidade e perspectiva de vida para os jovens, que hoje são presas fácies do narcotráfico.
Saída
Combater a violência policial e o genocídio
Para combater a violência policial e o genocídio do povo negro, é preciso levantar um programa de raça e classe, independente da burguesia e seus governos.
Um programa que comece combatendo a violência policial e a impunidade como política de Estado. Por isso, começamos defendendo a punição a todos os 12 policiais envolvidos na Chacina do Cabula e a federalização do caso, pois a justiça da Bahia é uma das mais corruptas do Brasil, envolvidas em vendas de sentenças; e a demora no julgamento é um indício disso.
Defendemos um conjunto de medidas democráticas, a começar pela imediata implantação das câmeras de monitoramento em todos os policiais. Mas isso não é suficiente. É preciso defender a desmilitarização das polícias e o fim da PM, com o controle social das polícias pelas organizações populares e a eleição de seus comandantes, garantindo o direito de sindicalização e greve aos policiais.
Junto a isso, é preciso pôr um fim à “guerra às drogas”, que, na verdade, é uma guerra aos pobres, que só serve ao extermínio da juventude pobre e negra e ao encarceramento em massa.
É necessário, também, revogar a Lei de Drogas, aprovada em 2006 pelo governo Lula, e descriminalizar as drogas, para combater o narcotráfico. Paralelo a isso, é preciso incentivar e organizar a autodefesa dos de baixo para responder à violência dos de cima.
Essa luta para ser vitoriosa precisa ser realizada de forma independente desse governo, hoje responsável pelo genocídio do povo preto, pobre e periférico. Uma luta que precisa partir dessas medidas democráticas, mas que avance para o enfrentamento com o Estado capitalista, que tem a violência como método de domínio da exploração dos capitalistas sobre a classe trabalhadora.
Nossa luta tem que ser combinada com a luta pela derrubada desse Estado e pela construção de uma outra sociedade, uma sociedade igualitária, sem exploradores e explorados: uma sociedade socialista!