Estudantes do Ensino Médio de São Paulo perderam 35% da carga horária de Ciências Humanas nos últimos cinco anos, o que representa 253 horas a menos de formação na área.
As disciplinas mais afetadas foram Sociologia e Filosofia, com redução de 62,9% na carga horária. Em seguida, Geografia sofreu uma diminuição de 25,9%. História foi a única exceção, registrando um aumento de 11,1%.
A análise faz parte de uma nota técnica elaborada pela Rede Escola Pública e Universidade (Repu), com base em dados da própria Secretaria de Educação de São Paulo. Os pesquisadores avaliaram os impactos da Reforma do Ensino Médio de 2017, sancionada no governo Michel Temer (MDB), que reduziu a formação geral básica dos estudantes para 1.800 horas, e da nova reforma de 2024, sancionada pelo presidente Lula (PT), que prevê a retomada do mínimo de 2.400 horas.
Contudo, segundo os pesquisadores, em São Paulo a expectativa foi frustrada: as Ciências Humanas não apenas não tiveram sua carga horária recomposta, como sofreram novas reduções em todas as modalidades do Ensino Médio neste ano.
Os dados mostram que, no Ensino Médio diurno, a carga horária da área era de 720 horas antes da reforma. Em 2024, esse número caiu para 480 horas, e em 2025, passou para 466,7 horas. Ou seja, somente neste ano, o governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) cortou 13 horas da carga horária da área, sendo que a maior redução ocorreu em Geografia, que passou de 180 para 133,3 horas totais.
Outras áreas do conhecimento também sofreram redução de carga horária no mesmo período. Ciências da Natureza (Química, Física e Biologia) perdeu 13,5%; Matemática, 11,1%; e Linguagens (Língua Portuguesa, Língua Inglesa, Artes e Educação Física) teve uma redução de 5,7%.
Os pesquisadores alertam que a Secretaria de Educação de São Paulo buscou aparentar um aumento da carga horária da formação geral, criando duas disciplinas — “Redação e Leitura” e “Educação Financeira” — que não estão previstas na Base Nacional Comum Curricular. Para a Repu, além de violar a legislação, essas novas disciplinas desviam 333,3 horas da formação geral básica, mesmo que, formalmente, ampliem a carga horária das áreas de conhecimento em que foram alocadas.
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Ensino Médio Noturno e EJA
O estudo aponta uma situação ainda mais crítica no Ensino Médio Noturno, que, em 2024, atendeu 26,3% dos estudantes da rede estadual, totalizando 297.113 matrículas. Nesta modalidade, a carga horária de Ciências Humanas foi reduzida em 23,8% nos últimos cinco anos, com as maiores perdas concentradas em Sociologia e Filosofia, que tiveram redução de 60%.
Além disso, o ensino presencial foi sistematicamente substituído por aulas a distância. Do total de 480 horas previstas para Ciências Humanas, 210 serão ministradas de forma remota, reforçando a precarização do ensino na modalidade.
O Ensino Médio na modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA) também sofreu cortes severos. Desde a reforma de Temer, todas as áreas do conhecimento perderam carga horária: Ciências Humanas (-57,1%), Ciências da Natureza (-66,7%), Matemática (-50%) e Linguagens (-70%). Sociologia e Filosofia foram as mais afetadas, com redução de 70%.
Para a modalidade, o governo paulista manteve a carga horária de 2024. “Portanto, a Lei n. 14.945/2024 não teve qualquer impacto no Ensino Médio na modalidade EJA em São Paulo. A recomposição da formação geral básica implicaria rever os cortes da Reforma do Ensino Médio de 2017, o que não ocorreu”, afirmam os pesquisadores.
A redução da carga horária se estendeu ao Ensino Médio em tempo integral e aos anos finais do Ensino Fundamental, impactando a formação dos estudantes e comprometendo o acesso a conteúdos essenciais.
Impactos no trabalho docente
O estudo também revelou que a redução progressiva das disciplinas de Ciências Humanas tem levado ao desvio da atuação docente, afastando os professores de suas áreas de formação.
Atualmente, apenas 3,2% dos professores concursados formados em Sociologia lecionam a disciplina. A maioria precisa completar sua carga horária assumindo matérias para as quais não possuem formação específica. Segundo o levantamento, 68,2% dos docentes ministram de três a cinco componentes curriculares.
“Sem distinção entre efetivos e temporários, um terço dos docentes que ingressam na rede estadual para Sociologia dão aulas de História (26,6%) e outro terço de Geografia (29,7%)”, destacam os pesquisadores.
“A situação é preocupante: apenas 45,1% dos docentes efetivos de Sociologia lecionam a disciplina como atividade principal”, concluem, alertando que o governo promove o desvio de funções de forma sistemática, prejudicando a qualidade da educação no estado.
Procurada, a Secretaria do Estado de São Paulo não respondeu ao contato de CartaCapital.