O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou nesta terça-feira (4) que seu governo pretende “assumir o controle” da Faixa de Gaza, promovendo um “projeto de desenvolvimento econômico” para transformar o território no que descreveu como a “Riviera do Oriente Médio”. A proposta ignora a solução de dois Estados, rompendo com décadas de diplomacia internacional e eliminando qualquer perspectiva de soberania palestina.

A declaração, dada na Casa Branca, ao lado do premiê israelense Benjamin Netanyahu, gerou reação imediata de países árabes e de organizações internacionais, que denunciaram o anúncio como uma tentativa de apagamento da identidade palestina. O Secretário-Geral da ONU alertou que a proposta equivale a uma “limpeza étnica”, enquanto entidades de direitos humanos classificaram o plano como “insano”, “racista” e “criminoso”.

Trump também sugeriu que palestinos “não têm alternativa” senão deixar Gaza, descartando a criação de um Estado palestino e abrindo espaço para um deslocamento forçado da população.

“Ela tem sido símbolo de morte e destruição por décadas, tão ruim para a população que vive ali. Muita falta de sorte naquele lugar. Não deveria ocorrer um processo de reconstrução pelas mesmas pessoas que estão lá. Em vez disso, deveriam ir para outros países com interesse em questões humanitárias”, afirmou Trump.

Netanyahu reagiu com desconforto a proposta de reerguer gaza como uma “Riviera do Oriente Médio”, mas evitou contrariar Trump publicamente, reforçando a aliança entre Israel e os EUA. O premiê israelense sabe que o apoio norte-americano é essencial para sua sobrevivência política.

A coalizão de extrema direita que sustenta seu governo não esconde que deseja a expulsão total dos palestinos de Gaza. “A ideia de ajudá-los a encontrar outros lugares para começar uma vida melhor é excelente. Após anos de glorificação do terrorismo, poderão estabelecer vidas novas e boas em outros lugares”, declarou Bezalel Smotrich, ministro das Finanças e líder do partido Sionismo Religioso.

Trump, por sua vez, reforçou sua proposta. “Gaza é um buraco hoje, e isso precisa mudar”, disse o presidente norte-americano.

“Se pudéssemos encontrar o local certo, ou os locais certos, e construir alguns lugares realmente agradáveis com bastante dinheiro, com certeza seria melhor. Acho que isso seria muito melhor do que voltar para Gaza.”

O encontro ocorre enquanto Netanyahu é alvo de um mandado de prisão do Tribunal Penal Internacional (TPI) por crimes de guerra em Gaza. No entanto, em Washington ele nada tem a temer, já que os EUA não reconhecem a jurisdição do TPI e não fazem parte do Estatuto de Roma.

Enquanto as declarações reverberavam na diplomacia global, milhares de manifestantes se reuniam diante da Casa Branca, protestando contra a recepção de Netanyahu e denunciando o que classificam como um incentivo à “limpeza étnica” da Palestina.

Países árabes e aliados globais condenam proposta americana

A rejeição ao plano de Trump foi quase imediata. A Arábia Saudita reiterou que não aceitará qualquer normalização com Israel sem um Estado palestino, desmontando a narrativa do republicano de que teria o apoio da monarquia saudita para sua estratégia no Oriente Médio. O Ministério das Relações Exteriores de Riad afirmou que a proposta violaria os direitos legítimos dos palestinos e reiterou sua “rejeição inequívoca” a qualquer tentativa de deslocamento forçado.

Egito e Jordânia, alvos da pressão americana para absorver os palestinos deslocados, recusaram-se a servir de destino para a diáspora forçada e alertaram para as consequências humanitárias da proposta. “A liderança palestina afirma sua posição firme de que a solução de dois Estados, de acordo com a legitimidade internacional e o direito internacional, é a garantia de segurança, estabilidade e paz”, declarou Hussein al-Sheikh, secretário-geral da OLP.

A China alertou que irá se opor à “transferência forçada” dos palestinos da Faixa de Gaza. “A China sempre defendeu que o governo palestino sobre os palestinos é o princípio básico da governança de Gaza no pós-guerra, e nos opomos à transferência forçada dos residentes de Gaza”, disse Lin Jian, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China.

O Hamas denunciou a proposta como “racista e absurda”, alertando que um plano de reassentamento forçado “incendiaria a região”. O embaixador da Palestina na ONU, Riyad Mansour, insistiu que Gaza é “nossa terra” e que os palestinos não aceitarão ser expulsos. Já o Instituto Árabe-Americano declarou que Trump recebeu um “criminoso de guerra” na Casa Branca para uma “discussão casual sobre genocídio e limpeza étnica”.

Netanyahu intensifica ataques na Cisjordânia em meio à viagem a Washington

Se Trump quer projetar a imagem de um líder global capaz de resolver conflitos internacionais—como repetiu inúmeras vezes em campanha ao afirmar que “a guerra da Ucrânia jamais teria ocorrido” caso estivesse na Casa Branca—o comportamento de Netanyahu expõe o limite dessa retórica.

Enquanto o premiê participava de reuniões em Washington, as Forças de Defesa de Israel (FDI) conduziam uma ofensiva de larga escala na Cisjordânia, destruindo 23 prédios e expulsando 15 mil palestinos na cidade de Jenin. A operação ocorre apenas dias após o início das negociações da segunda fase do cessar-fogo em Gaza, revelando que, embora a guerra no enclave e no Líbano esteja temporariamente contida, o avanço militar israelense segue ativo em outros territórios ocupados.

A justificativa oficial do governo israelense é a eliminação de supostos militantes do Hamas e da Jihad Islâmica, mas ataques contra infraestrutura civil levantaram novas críticas. Na Jerusalém Oriental ocupada, colonos invadiram um cemitério e incendiaram uma mesquita, aprofundando a violência e a tensão na região. Se por um lado Netanyahu buscava estreitar laços com Washington, por outro, seu governo dava sinais claros de que a trégua em Gaza não significava um freio à política de repressão contra os palestinos.

Trump endurece postura contra o Irã e reforça aliança com Netanyahu

Em meio à crise diplomática, Trump anunciou a retomada da política de “pressão máxima” contra o Irã, voltando a impor sanções e ameaçando medidas mais agressivas contra Teerã. A medida reforça o alinhamento entre EUA e Israel, enquanto o governo iraniano alertou para as “consequências desastrosas” de uma escalada no Oriente Médio.

Para Netanyahu, a retórica contra o Irã serve como uma distração conveniente. Com popularidade em queda e enfrentando acusações de corrupção, o premiê usa a ameaça iraniana para manter sua coalizão unida e justificar novas ações militares na região.

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 05/02/2025