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Richard Wolff, professor emérito de economia da Universidade de Massachusetts Amherst e autor de livros como Democracy at Work e Capitalism’s Crisis Deepens, não hesita em traçar um paralelo entre os Estados Unidos sob Donald Trump e o estouro da desigualdade que precedeu a Grande Depressão.
Se no início do século XX magnatas como J.P. Morgan e John D. Rockefeller dominavam o país, hoje são Elon Musk e Mark Zuckerberg que dão as cartas.
Em entrevista ao portal americano Real News Network, Wolff desdobrou sua tese de que os bilionários de hoje, assim como os da chamada “Era Dourada”, conduzirão os EUA a um colapso profundo. A seguir, algumas de suas principais reflexões:
Ciclo de ascensão e queda
No pós-guerra, os Estados Unidos emergiram como a maior potência econômica global, uma posição inédita na sua história. Em 1945, os rivais europeus – Grã-Bretanha, Alemanha e França – estavam devastados, assim como Japão, Rússia e China.
Com a economia intacta, os EUA se tornaram o centro do capitalismo global: o dólar virou referência mundial, e o país estabeleceu instituições como o Banco Mundial e o FMI, além de espalhar 700 bases militares pelo planeta para consolidar sua influência.
Nas décadas seguintes, o crescimento foi espetacular. No entanto, Wolff alerta que todo império chega ao fim. “Os EUA também desaparecerão, como aconteceu com os impérios britânico, francês, alemão, holandês, russo, grego e romano. A questão não é se vão cair, mas quando”, afirma.
Os sinais de decadência
Os indícios do declínio americano estão por toda parte. Até alguns anos atrás, 80% das reservas dos bancos centrais ao redor do mundo estavam em dólar. Hoje, essa fatia caiu para cerca de 40%. O dólar ainda tem relevância, mas já não é a moeda incontestável de outrora.
O G7 – grupo formado por EUA, Canadá, Japão, Reino Unido, França, Alemanha e Itália – já foi o núcleo dominante da economia mundial. Hoje, representa apenas 27% da produção global. Enquanto isso, o BRICS, bloco que começou com Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul e hoje já conta com 22 países, responde por cerca de 35% da economia global, consolidando-se como um polo alternativo.
A política salarial nos EUA também reflete esse enfraquecimento. O salário mínimo federal de US$ 7,25 por hora está congelado desde 2009, enquanto a inflação avança a uma média de até 10% ao ano. O resultado? Trabalhadores mais pobres sofrem um brutal empobrecimento, já que seus salários compram cada vez menos. “O nível de crueldade atingido é inédito”, enfatiza Wolff.
Fracassos militares e perda da influência
Os EUA já não são a potência militar inquestionável que eram. Wolff cita derrotas sucessivas:
- Vietnã: perderam a guerra para o Partido Comunista Vietnamita, que governa até hoje.
- Afeganistão: após 20 anos de ocupação, saíram derrotados e deixaram o Talibã no poder.
- Iraque: a ocupação resultou em caos, e os EUA perderam influência na região.
- Ucrânia: segundo Wolff, o conflito está se tornando mais uma derrota americana, com a Rússia mostrando superioridade bélica.
“O melhor foguete e o melhor míssil na Guerra da Ucrânia até agora são russos”, provoca.
O erro estratégico na corrida tecnológica
Para Wolff, os EUA estão se isolando em setores estratégicos, o que pode custar caro no futuro. Empresas globais que buscam tecnologia verde já estão preferindo produtos chineses. No setor automotivo, carros elétricos fabricados na China oferecem o melhor custo-benefício do mundo. Isso significa mais empregos para trabalhadores chineses – enquanto, nos EUA, o futuro do emprego se torna mais incerto.