A América Latina unida é a única resposta à tirania de Trump, por Fernando Castilho
Donald Trump mal colocou os pés na Casa Branca e já está escancarando ao mundo sua face mais sombria. E não há como não estremecermos diante do que está por vir. O que estamos testemunhando é um ataque brutal aos direitos humanos, uma demonstração de força bruta e desrespeito que não pode — e não será — ignorada.
O caso que atingiu o Brasil como um soco no estômago foi a deportação de imigrantes irregulares — ou “ilegais”, como Trump e a mídia conservadora brasileira insistem em chamar, num esforço vil de desumanizá-los. A primeira leva de deportados, composta por 88 pessoas, chegou ao Brasil no dia 24. Homens, mulheres e crianças desembarcaram em Manaus, acorrentados como animais, submetidos a condições degradantes, incluindo a falta de ar-condicionado e a proibição de usar banheiros. Lula, em um gesto que resgatou um mínimo de dignidade, enviou um avião da FAB para transportá-los a Minas Gerais e ordenou que as algemas e correntes fossem removidas, já que estavam em solo brasileiro. Além disso, exigiu explicações do governo dos EUA sobre o tratamento desumano dispensado aos brasileiros.
Enquanto isso, na Colômbia, o presidente Gustavo Petro mostrou mais coragem ao proibir o pouso de aviões militares dos EUA carregados de deportados, exigindo que apenas aeronaves comerciais fossem utilizadas. No entanto, diante das ameaças de sanções por parte de Trump, Petro foi forçado a recuar. Lula, por sua vez, optou por uma abordagem mais pragmática, consciente de que está lidando com a maior potência econômica e militar do mundo, comandada por um líder autoritário. Ele agiu com precisão cirúrgica, mas será que isso basta? Não, não basta. O momento exige mais do que discrição diplomática — exige coragem e liderança.
Aqui está o cerne da questão: Lula perdeu mais uma oportunidade de se comunicar diretamente com o povo. Será que o novo ministro da Secom, Sidônio Palmeira ainda não começou a trabalhar? Por que não um discurso em rede nacional de televisão? Por que não capitalizar a comoção do momento para fortalecer sua imagem e a do governo? Por que não usar sua retórica afiada para enviar uma mensagem poderosa aos deportados e ao povo brasileiro? Como bem lembrou Virgílio Almansur, Lula poderia ter dito: “Vocês desistiram do Brasil por razões variadas. Mas o Brasil não desistiu de vocês!”. Uma frase como essa teria unido o país e ecoado como um grito de resistência. Mas, em vez disso, o silêncio prevaleceu.
A verdade é que, sozinho, o Brasil não pode derrotar um inimigo tão poderoso. Mas e se uníssemos toda a América Latina, com o Brasil à frente, em uma frente comum contra as políticas desumanas de Trump? A união é a única arma que temos contra a arrogância e a brutalidade de um governo que age como se estivesse acima da lei e da moral. Trump não teme países isolados, mas uma América Latina unida seria uma força imbatível. Mas essa união não pode acontecer tardiamente como foi durante a Segunda Guerra Mundial, quando esperaram a Alemanha ganhar territórios para começar a agir.
Lula, é hora de assumir a liderança que o povo espera. O momento exige mais do que pragmatismo — exige coragem, voz e ação. O mundo está assistindo, e o Brasil não pode se dar ao luxo de ficar em silêncio. Chega de hesitação. O Brasil precisa de um líder que una a América Latina e que mostre ao mundo que não nos curvaremos diante da tirania.
A hora é agora.
Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada.
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