O artigo A Era do Tecno Feudalismo: quando os corpúsculos de poder digital moldam os corpos abjetos, de Sara York, publicado no Brasil 247 neste dia 23, é mais um tijolo que setores da esquerda colocam na construção da censura no País. Existe uma cruzada mundial para controlar o que se diz nas redes sociais. A democratização da informação, propiciada pelos avanços tecnológicos, tem preocupado o imperialismo, que necessita do monopólio da informação para exercer sua dominação.

No texto, Sara York comenta o livro Tecnofeudalismo, do ex-ministro das Finanças da Grécia, Yanis Varoufakis que, segunda ela faz uma crítica incisiva ao modelo econômico dominado pelos gigantes tecnológicos”. Qual seria esse ‘novo modelo’? Fundamentalmente, essas empresas vivem da venda de anúncios e da cobrança de serviços. Se uma empresa quer que seus produtos apareçam mais vezes, e para determinado público, precisa “impulsionar”, ou seja, pagar.

Mas isso já era feito nas revistas e jornais impressos, onde os anúncios mudavam de valor de acordo com sua posição na página. Na televisão é muito bem conhecido o “horário nobre”, onde se cobra muito mais para se exibir propagandas.

Segundo York, Varoufakis “argumenta que empresas como Apple e Meta tratam seus usuários como servos modernos, explorando sua força de trabalho gratuita e transformando-os em elementos subalternos de um sistema que, embora possua características do feudalismo medieval, está disfarçado de capitalismo digital”.

Fica difícil encontrar uma relação feudal, ou mesmo de servidão, na utilização das redes. É verdade que as redes esfolam aqueles que tentam utilizar seus serviços? Sim, mas isso se dá porque as big techs detêm o monopólio, como faz qualquer empresa capitalista.

Sara York diz ainda que Varoufakis busca pensar a partir de sua leitura em uma reflexão sociológica sobre como essa nova estrutura de poder abjeta transforma corpos em mercadorias, submetendo-os a uma invisível servidão digital.

O problema de se debater com setores da esquerda atualmente é uma tarefa complicada, principalmente porque é preciso enfrentar uma linguagem cifrada, quase ininteligível (como no trecho acima), e uma montanha de palavras que, no fundo, tentam esconder seus verdadeiros propósitos, na maioria das vezes reacionários.

O corpo como mercadoria, a menos que esteja vendido em partes, estaria muito mais bem explicado no escravagismo. Mas mesmo em um regime de escravidão não é propriamente o corpo que está sendo negociado, e sim uma capacidade produtiva que deverá ser convertida em trabalho.

No modo de produção capitalista, é importante lembrar, o operário também pode ser considerado “invisível”, dado que ele é apenas uma peça – substituível – dentro de um mecanismo.

Identitarismo

Para Varoufaki, os usuários das redes estariam “despojados de sua autonomia” e que “o corpo, enquanto entidade física, é frequentemente abandonado à margem das dinâmicas econômicas que regem o universo digital”.

Um dos esforços do identitarismo, essa ideologia de direita, é diluir os antagonismos sociais em entidades etéreas, como se vê no uso da palavra “corpos”. Corpos elimina a noção de classes sociais, onde está a verdadeira oposição. No feudalismo a tensão se dava entre servos da gleba e senhores feudais. Nunca entre “corpos”. A solução dessa contradição desembocou na revolução burguesa, expressão inequívoca da luta de classes.

Como está bem expresso no Manifesto do Partido Comunista:

A moderna sociedade burguesa, saída do declínio da sociedade feudal, não aboliu as oposições de classes. Apenas pôs novas classes, novas condições de opressão, novas configurações de luta, no lugar das antigas.

A nossa época, a época da burguesia, distingue-se, contudo, por ter simplificado as oposições de classes. A sociedade toda se divide, cada vez mais, em dois grandes campos inimigos, em duas grandes classes que diretamente se enfrentam: burguesia e proletariado.

Ao se eliminar a noção de classes sociais, se elimina também a possibilidade de revoluções. É por isso que os identitários falam no máximo em se conseguir “controle” sobre as redes, etc.

Mais censura

No que diz respeito à falta de autonomia dos usuários, o que os identitários pedem é ainda menos autonomia, querem que o Estado burguês, por meio de suas instituições repressoras, como o judiciário, impeça que as pessoas se expressem livremente pelas redes.

A desculpa é a de que por meio das redes exista uma tal “cultura do ódio”. No entanto, todos sabemos que o ódio nunca dependeu de redes sociais para existir.

O que se pode dizer da grande imprensa, que atira a opinião pública contra o povo palestino? O Hamas e outros grupos da Resistência contra a ocupação sionista são tratados como terroristas. No cinema norte-americano, em centenas de milhares de filmes, difundiu-se o ódio contra os povos indígenas, contra árabes, comunistas, muçulmanos. Mas o problema, pelo visto, são as redes sociais.

Um novo tipo de trabalho?

Varoufaki argumenta que cada post, cada clique, cada vídeo compartilhado é uma contribuição invisível para o capital digital”. E Sara York complementa dizendo que “essa dinâmica cria os ‘corpos abjetos’, indivíduos cujos esforços não são reconhecidos como trabalho, mas que, ao serem extraídos para gerar valor, tornam-se essencialmente produtores de riqueza para os magnatas da tecnologia”.

Uma postagem, ou um clique, não podem ser considerados trabalho. Uma rede social é um serviço que pessoas ou grupos utilizam para expor suas ideias, montar suas lojinhas, bater papo, etc. As plataformas se aproveitam da audiência, como fazem todos os veículos de comunicação, para vender publicidade.

Todos os meios de comunicação sempre sonharam em conhecer melhor seus usuários, pois assim poderiam distribuir com mais eficiência seus anúncios, por isso sempre investiram em pesquisa de mercado, e isso ficou muito facilitado com a Internet, que lê os hábitos de quem navega pelas redes.

York diz que Ao falar sobre as condições dos trabalhadores nas empresas de tecnologia, Varoufakis também introduz a figura do ‘proletariado digital’. Esses trabalhadores, especialmente aqueles que operam em armazéns da Amazon ou em plataformas de entrega. Ora, um galpão de entrega da Amazon é igual a qualquer outro, se seus trabalhadores são “submetidos a uma vigilância incessante de algoritmos, constantemente monitorados e avaliados”, é só um desdobramento moderno do tailorismo. Não existe nada de novo aí.

O capitalismo sempre controlou a vida dos operários: determina a hora que devem dormir, a hora que acordam e almoçam. Determina o caminho que percorrem diariamente, se podem ou não comprar determinados produtos. Não existe um “proletário digital”, isso é apenas uma invenção, é tentar chover no molhado dizer que existe um controle algorítmico que desumaniza o trabalhador e o transforma em mais uma engrenagem de um sistema que parece intransponível.

É preciso acabar com as redes

O imperialismo se utiliza da esquerda para atacar setores do próprio capitalismo que de alguma maneira comprometem sua dominação. É por isso que tanto se bate na tecla de que “a raiva é combustível do capitalismo digital”. Ou que indivíduos são manipulados para consumir e produzir ainda mais, que “essa dinâmica tem um impacto direto na saúde mental e emocional das pessoas, criando uma atmosfera de desconfiança e ansiedade que permeia as relações sociais”, etc.

Hoje, com base em todo essa mitologia que se forma em torno das redes sociais, o imperialismo tem se aproveitado para censurar, para impedir que jovens utilizem celulares ou acessem as redes.

Ninguém, que esteja em sã consciência, vai acreditar que o imperialismo esteja preocupado com o consumismo, com o ódio, ou com a saúde mental e emocional das pessoas. A chave está na manutenção do monopólio da informação. É preciso impedir que as pessoas se expressem, ou podem acontecer coisas “ruins” como o desmascaramento do sionismo e seu genocídio em Gaza.

Em 2013, aqui no Brasil, as redes sociais expuseram a brutalidade e as mentiras da Polícia Militar na repressão das manifestações populares. Os crimes do imperialismo no Iraque foram expostos. Os 60 anos de propaganda sionista foram arruinadas pela exposição da verdade nas redes sociais.

É isso que o imperialismo precisa e quer controlar. O que setores da esquerda estão fazendo nada mais é do que servir de linha auxiliar para a dominação imperialista.

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Last Update: 26/01/2025