Em último discurso à nação, proferido na quarta (15) no Salão Oval, na Casa Branca, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, soou um alerta aos americanos que “fiquem em guarda” contra ameaças de oligarcas, desinformação e IA em um futuro sob o comando de Donald Trump.
Biden disse que uma “oligarquia está tomando forma na América” e sublinhou “uma perigosa concentração de poder”. Ele disse que os bilionários ao redor de Trump representam uma concentração de “riqueza, poder e influência extremos que literalmente ameaçam toda a nossa democracia”.
Trump não perdeu tempo em dar razão ao presidente simbolicamente derrotado dos EUA – não que precisasse dar mais argumentos, uma vez que uma série de cargos sensíveis a administração norte-americana foi entregue à magnatas extremamente reacionários, como Elon Musk, Vivek Ramaswamy e Stephen Feinberg.
A ideia de um governo moldado por interesses privados se consolida a cada anúncio ou entrevista dada pelo presidente eleito, que toma posse para o seu segundo mandato nesta segunda (20).
Na última sexta (17), Trump usou sua conta oficial no X (antigo Twitter) para anunciar o lançamento da sua própria criptomoeda, a $TRUMP.
“Meu novo meme oficial está aqui! É hora de celebrar tudo que representamos: vitória! Junte-se à minha muito especial Comunidade Trump. Adquira seu $TRUMP agora. Divirtam-se!”, disse Trump no tweet.
A iniciativa não é apenas mais uma jogada de marketing do magnata que fez de sua imagem uma marca global. O lançamento da memecoin $TRUMP é um marco tanto para a economia digital quanto para a política norte-americana, consolidando a interseção entre interesses privados e a administração pública.
A criptomoeda, cujo valor inicial de mercado era de US$6 (R$36, na cotação desta segunda) por unidade, disparou nas primeiras 24 horas, alcançando US$30,48 (R$184) e uma capitalização de mercado de US$ 14 bilhões (R$84 bilhões). Atualmente, a $TRUMP é negociada a US$64 (R$387), representando uma valorização de até 1.239% em apenas três dias. Grande parte desse crescimento foi impulsionada pela base de apoiadores de Trump, que veem na moeda um símbolo de resistência e triunfo político.
Mas Trump não está sozinho nessa empreitada. Melania Trump, sua esposa e futura primeira-dama, seguiu os passos do marido e anunciou no último domingo (19) a sua própria criptomoeda, a $MELANIA. O ativo chegou rapidamente a uma capitalização de mercado de US$ 8,5 bilhões (R$51 bilhões), mas viu seu valor recuar para cerca de US$ 1,7 bilhão (R$10 bilhões) no dia seguinte.
Mesmo assim, a $MELANIA reforça a estratégia de monetizar a popularidade da família Trump em um mercado que mistura especulação financeira e culto à personalidade.
Especialistas apontam para o perigo de uma concentração de riqueza e poder sem precedentes, dada a estrutura centralizada dessas moedas. No caso da $TRUMP, 80% dos tokens estão sob controle da CIC Digital, uma empresa afiliada à família Trump, enquanto apenas 10% estão disponíveis ao público. A configuração alimenta preocupações sobre manipulação de mercado e uso de informações privilegiadas.
Ao mesmo tempo, o timing do lançamento poucos dias antes da posse presidencial levanta questionamentos éticos. O presidente eleito prometeu desregulamentar o setor de criptomoedas e introduzir políticas que beneficiem diretamente as corretoras de criptomoedas (exchanges, em inglês) como Coinbase e Ripple, ambas apoiadoras de sua campanha. A crítica é clara: Trump não está apenas governando; está moldando as regras do jogo para maximizar seus próprios lucros.
Anthony Scaramucci, ex-diretor de comunicação de Trump, não poupou palavras: “É uma corrupção em nível ditatorial”. Enquanto isso, líderes do setor cripto celebram a nova fase de desregulamentação prometida pelo republicano, que inclui a criação de uma reserva federal de bitcoins e a flexibilização das exigências para empresas de blockchain.
Com um gabinete repleto de bilionários e uma moeda que carrega seu nome, Trump personifica a oligarquia que Biden alertou em seu discurso de despedida. Se a $TRUMP é um marco de inovação financeira ou um símbolo de como interesses privados estão moldando a política americana, resta saber como a história registrará esse momento.
