Terrorismo da Familícia das Rachadinhas

por Fernando Nogueira da Costa

Com o “liberou geral” da Meta – responsável pelo Instagram, Facebook, WhatsApp e Threads – e do X, sem mais controle de fake-news, a extrema-direita já se esbalda. O governo antifascista se esforça para contornar os efeitos da disseminação de desinformação nas plataformas digitais.

Por exemplo, a partir de uma mensagem de um senador, eleito pela “familícia das rachadinhas”,  houve uma onda de mensagens falsas com a afirmação de a Receita Federal ter passado a taxar transferências via Pix acima de R$ 5 mil. Os conteúdos críticos à atual gestão somaram 25 milhões de visualizações na última semana.

Na verdade, a Receita Federal, a partir do dia 1º de janeiro deste ano, ampliará a fiscalização sobre transações acima de R$ 5 mil por mês feitas por pessoas físicas. As novas regras serão obrigadas também empresas operadoras de cartão de crédito, fintechs e instituições de pagamento a notificar operações somadas acima desse valor, ou de R$ 15 mil mensais para pessoas jurídicas.

A medida não se restringe ao Pix, pois abrange todas as formas de movimentação financeira, incluindo TEDs, saques e depósitos. Anteriormente, os bancos tradicionais já eram obrigados a fornecer informações sobre as movimentações de seus clientes. Só ampliou para novas instituições financeiras.

Aproveitando-se das dúvidas da população sobre a aplicação da medida, políticos da oposição neofascista têm repercutido o tema com críticas ao governo. Em um vídeo com mais de 4 milhões de visualizações no Instagram e 389 mil no X, por exemplo, um senador irresponsável, filho do ex-presidente planejador de golpe de Estado e assassinatos dos vencedores, difundiu uma série de mentiras sobre a circular como “acaba com o sigilo bancário em todo o Brasil” e “a população receberá uma cobrança da Receita Federal de Lula em casa para pagar”.

A extrema-direita bolsonarista difunde fake news e distorções a respeito de impostos porque atinge grupos como profissionais liberais, empreendedores e religiosos. A expectativa é de se avolumarem os problemas com o enfraquecimento das políticas de moderação da Meta e do X, aplicado no Brasil pela conspiração internacional dos controladores de Donald Trump, tipo Elon Musk e companhia.

Na verdade, transações monetárias realizadas com dinheiro digital, como Pix, CBDCs (moedas digitais emitidas por bancos centrais) e cartões por aproximação, podem ser rastreadas tecnicamente. O grau de rastreamento varia conforme as políticas adotadas por instituições financeiras, governos e as tecnologias utilizadas.

No entanto, as questões de escala, custo e viabilidade técnica de um monitoramento total na sociedade, como o cenário distópico descrito em “1984”, livro de George Orwell, enfrentam obstáculos políticos, legislativos e éticos. Praticamente, inviabiliza o pleno monitoramento.

Como o rastreamento de transações digitais ocorre? Todas as transações realizadas por meio de sistemas digitais (como Pix e cartões de aproximação) geram registros em servidores bancários ou de instituições financeiras.  Dados como valor, hora, localização e destinatário ficam armazenados e podem ser acessados mediante solicitações legais. 

Nas futuras CBDCs (Moedas Digitais de Bancos Centrais), DREX no caso brasileiro,  seus sistemas têm potencial de permitir o rastreamento. Todas as transações ocorrerão em uma infraestrutura centralizada controlada pelo Banco Central. 

O rastreamento só é feito com autorizações judiciais para Investigações de crimes. Agem para prevenção de fraudes como lavagem de dinheiro sujo e financiamento de terrorismo, no Brasil, entre os quais, de neofascistas golpistas. 

No caso de políticas fiscais, um monitoramento específico visa o combate à sonegação de impostos. Busca aumento da transparência. 

Porém, rastrear cada transação digital de forma contínua e em grande escala ainda é inviável, devido à quantidade massiva de dados.  O rastreamento generalizado sem supervisão jurídica viola direitos de privacidade e enfrenta resistência social.

Há viabilidade do “Grande Irmão” Digital? Monitorar todas as transações digitais de uma sociedade moderna envolve processar bilhões de registros diariamente.   Avanços em big data e inteligência artificial tornam tecnicamente possível coletar e analisar dados em larga escala, mas exigem recursos financeiros e energéticos inviáveis de serem aceitos com razoabilidade. 

Calcule os altos custos operacionais de infraestruturas massivas de servidores, algoritmos de análise e equipes de monitoramento de toda a população. Governos e empresas precisariam justificar economicamente tais investimentos. 

Há barreiras técnicas e sociais. A complexidade dos sistemas financeiros globais e a integração de diferentes tecnologias dificultam um rastreamento uniforme.  A anonimização de alguns sistemas, por exemplo, criptomoedas privadas, complica ainda mais o pleno monitoramento.

Qualquer tentativa de vigilância contínua enfrentaria oposição e resistência social, especialmente em democracias, devido a preocupações com liberdades civis.   Movimentos em defesa da privacidade, aliados a legislações como o GDPR (Europa) ou a LGPD (Brasil), limitam o abuso na utilização de dados privados. 

A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) é uma lei brasileira, inspirada na norma europeia de Proteção de Dados (GDPR – General Data Protection Regulation). Estabelece regras para o tratamento de dados pessoais, físicos ou digitais. A LGPD foi sancionada em 2018 e entrou em vigor em 2020.

Portanto, há diferenças em relação a “1984” de Orwell. No cenário orwelliano, o controle total da sociedade seria viável graças a uma combinação de poder centralizado absoluto – um único governo controlava todos os aspectos da vida pública e privada – e  tecnologia simples, mas universal. A vigilância seria baseada em dispositivos amplamente distribuídos e não dependeria de sistemas massivamente complexos.

Na prática, replicar esse nível de controle, no mundo real, é muito mais difícil, devido a diversidade política e econômica. Governos, empresas privadas e indivíduos possuem interesses variados e conflitantes. 

O custo e a complexidade se sobressaem. Monitorar todos os cidadãos requer investimentos colossais e um alto nível de coordenação tecnológica. 

Há resistência pública. Informações sobre vigilância em massa geram revoltas e demandas por transparência.

Apesar das dificuldades, há exemplos da possibilidade de sistemas de controle social sofisticados. Na China, o sistema de crédito social, aliado ao uso de moedas digitais (e-CNY), permite monitorar e influenciar o comportamento financeiro e social dos cidadãos. Tecnologias de IA oferecem ferramentas como reconhecimento facial, associadas a dados financeiros, aumentam o poder de vigilância.

Embora seja tecnicamente possível rastrear transações digitais em larga escala, a implementação de um sistema de monitoramento absoluto como o “Grande Irmão” enfrentaria barreiras técnicas, econômicas e sociais dificilmente transponíveis. Porém, o avanço contínuo em inteligência artificial e centralização de dados financeiros, especialmente em regimes autoritários, aproxima certos aspectos do cenário distópico descrito por Orwell. O equilíbrio entre segurança e privacidade seguirá sendo um dos grandes problemas do século XXI.

O capitalismo de vigilância é um modelo econômico no qual empresas coletam, processam e comercializam grandes volumes de dados pessoais sem o pleno consentimento dos indivíduos. Essa prática baseia-se na exploração de dados como um recurso econômico com finalidade de sua monetização..

Empresas coletam informações detalhadas de usuários e trabalhadores como comportamento, preferências, localização etc. Esses dados são analisados para prever comportamentos e influenciar decisões, como consumo ou produtividade. Os dados são vendidos para anunciantes ou usados internamente para otimizar processos e maximizar lucros.

Há críticas ao modelo do capitalismo de vigilância porque se baseia na exploração dos dados para lucro. Isso se dá às custas da privacidade, liberdade e dignidade dos trabalhadores – e consumidores. A luta continua!


Fernando Nogueira da Costa – Professor Titular do IE-UNICAMP. Baixe seus livros digitais em “Obras (Quase) Completas”: http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/ E-mail: [email protected]

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Last Update: 15/01/2025