O presidente Lula iniciou a reforma ministerial pela Secretaria de Comunicação Social. Era mais ou menos óbvio, pois a comunicação do governo tem recebido críticas de todos os lados. Sai o político Paulo Pimenta, entra o marqueteiro Sidônio Palmeira. Pela lógica, o próximo cargo a ser trocado seria a Secretaria de Relações Institucionais, pasta que enfrenta uma chuva de críticas pela sua inefetividade.

A reforma ministerial não decorre apenas dos resultados insuficientes deste ou daquele ministro, pois este é apenas um dos fatores que a determinam. Existem motivos conjunturais mais fortes: o PT saiu fragilizado das eleições municipais, os partidos de centro-direita saí­ram fortalecidos, crescem as dificuldades do governo no Congresso, é preciso garantir um apoio mínimo razoável de deputados e de senadores para evitar um impasse na aprovação de projetos governamentais, o governo não vai bem na avaliação da opinião pública, é preciso montar uma estratégia para as eleições de 2026, existe um estresse dos setores produtivos, e por aí vai.

Se a reforma ministerial tentar resolver cada um desses problemas no varejo, no seu aspecto singular, até poderá tornar o governo mais funcional, mas não será boa. A reforma deveria ser capaz de integrar esses problemas singulares e suas possíveis soluções com a resposta a um problema mais geral: a falta de rumo e de sentido que o governo quer ou deveria querer imprimir ao Brasil. Ninguém sabe qual é.

Existe uma evidente crise de rumos, com uma face bifronte: uma é a economia, a outra é a política. Na economia, o governo perdeu a capacidade de coordenar as expectativas futuras dos agentes econômicos, por uma sucessão de erros, inclusive do próprio presidente. Lula, alguns ministros e dirigentes do PT proferiram discursos que produziram resultados contrários àqueles de suas intenções. É o velho problema do paradoxo da piedade e da crueldade de Maquiavel ou da ética das convicções e da ética da responsabilidade de Max Weber.

Na face política, há uma evidente incapacidade de coordenar a ampla coalizão. Isto leva setores governistas a votarem com a oposição no Congresso e parlamentares a exasperarem suas pautas corporativas, principalmente em torno das emendas parlamentares e na recusa de votar a favor de propostas que poderiam conter a elevação do gasto público. Neste caso, os interesses eleitoreiros e a dependência ou ligação de deputados e senadores a determinados grupos econômicos falam mais alto. O Congresso tem se comportado como uma casa despudorada, sem compromisso com a sociedade e com o País.

Diante dessa perda de capacidade de coordenar as expectativas futuras dos agentes econômicos e da descoordenação política, o problema da comunicação do governo não deriva principalmente da capacidade técnica do ex-ministro Paulo Pimenta. Mesmo que os problemas de visão técnica possam existir, a crise de comunicação é, principalmente, um problema de direção e sentido do governo. Diz-se que Sidônio Palmeira coordenou a comunicação do pacote fiscal e do anúncio do aumento da isenção do IR. Mas essa comunicação foi um desastre de grande monta, o maior produzido neste governo. A mera substituição de ministros não vai resolver o problema de comunicação.

Sem rumo claro e, consequentemente, sem marcas, e com um ministério disfuncional de 39 pastas, mesmo as coisas positivas e relevantes se perdem como quinquilharias espalhadas em várias prateleiras, imperceptíveis para o grande público. Não basta passar do analógico para o digital. A comunicação só funcionará de forma adequada se ela conseguir articular as várias ações sob a égide de um rumo, evidenciado em marcas reais e simbólicas de grandes realizações de um bom governo.

Do ponto de vista estritamente interno, o governo Lula se organiza mal. Em vez de funcionar ao estilo de um Estado-maior dirigente, se organiza no estilo do sultanato, onde o chefe se serve de um grão-vizir (Casa Civil) para se relacionar com as estruturas dispersas dos ministros-servidores. É a receita da disfuncionalidade.

A reforma ministerial de Lula deveria ter três grandes objetivos: dar visibilidade a um projeto de governo e de País, articulando as várias ações dispersas, visando construir um caminho atrativo para a sociedade rumo a 2026, restaurar a capacidade do governo de coordenar as expectativas futuras dos agentes econômicos, gerando previsibilidade e confiança com medidas econômicas que resolvam os problemas e entraves que geram desconfiança e incertezas, e adquirir capacidade de coordenação política da base de apoio, transformando o governo no centro de atratividade das perspectivas futuras de poder.

Se o governo não for capaz de resolver esses nós, caminhará para 2026 com grandes riscos, com possíveis deteriorações na política e na economia. •

Publicado na edição n° 1344 de CartaCapital, em 15 de janeiro de 2025.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Qual reforma ministerial?’

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Last Update: 09/01/2025