Zuckerberg tira a máscara
por Luis Felipe Miguel
Todos nós odiamos Elon Musk – e não faltam boas razões para isso. Ele é o protótipo do bilionário prepotente, que acha que ter dinheiro lhe dá um direito divino de mandar em tudo e em todos.
Mark Zuckerberg, por outro lado, veste a fantasia do bom moço. Pai de família, cabelo sempre bem cortado, não aparece chapado em público, fala manso, gosta de evocar altos valores em seus discursos.
Mas é, tanto quanto seu rival, a perfeita encarnação da escrotidão capitalista. Tem ambições monopolistas e, embora não saiba o que fazer com tanto dinheiro, nunca é o suficiente, sempre quer mais.
(Quer ver como Zuck é rico e você é pobre? Você ficou sonhando com a mega da virada, que ia mudar sua vida e a das pessoas próximas para sempre. Mas se ele gastasse aqueles R$ 635.486.165,38 todo mês, demoraria 166 anos para o dinheiro dele acabar.)
Em nome de ganhar mais dinheiro, Zuckerberg não se incomoda de inundar o planeta com desinformação, de alavancar golpes de Estado, de colaborar com regimes autoritários, de promover genocídios, de turbinar o colapso climático, de destruir a saúde mental de crianças e adolescentes, de estimular serial killers, de se tornar parceiro de golpistas, chantagistas ou pedófilos.
Quem quiser um relato, com fartas demonstrações do cinismo do Facebook, pode ler o instrutivo livro de Max Fisher, A máquina do caos, publicado no Brasil pela Todavia.
Zuckerberg tirou a máscara. Anunciou que vai parar sequer de fingir que combate a desinformação nas suas redes, levantou a voz contra os governos e tribunais que tentam impor o mínimo de regulação às plataformas sociodigitais e, em suma, proclamou seu completo alinhamento a Donald Trump e ao ideal que o presidente dos Estados Unidos encarna: garantir o triunfo definitivo da barbárie no mundo.
Para mostrar a força de seu compromisso, nomeou mais direitistas fanáticos para a direção de sua empresa.
Em meio a tantas urgências que nos desafiam a cada dia, o enfrentamento das big techs não pode ser esquecido. É importante sustentar toda e qualquer decisão da justiça brasileira que imponha obstáculos à interferência das plataformas na vida nacional.
É uma batalha difícil, mas não impossível. Zuckerberg está se expondo tanto porque sabe que há resistência – no Brasil, na Europa, na Austrália – e essa resistência impõe derrotas a ele.
Enquanto isso, cresce o meu incômodo por usar estas plataformas como meio de comunicação. Afinal, o que estou fazendo é trabalhar de graça para Zuckerberg, alimentar suas bases com os meus dados, estimular que outras pessoas venham aqui e façam a mesma coisa.
É difícil, porque elas se tornaram um espaço quase incontornável no mundo contemporâneo. Mas o anúncio de ontem, do patrão da Meta, me estimulou antecipar um caminho há muito decidido. Nos próximos meses, vou iniciar minha retirada de Instagram e Facebook – tentando encontrar outras maneiras de permanecer ativo no debate público.
Sem muita esperança, sugiro que todos pensem em buscar suas próprias alternativas.
Luis Felipe Miguel é professor do Instituto de Ciência Política da UnB. Autor, entre outros livros, de O colapso da democracia no Brasil (Expressão Popular).
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