Socorro Aguiar, de Belém (PA)
Há 190 anos, manhã de 7 de janeiro e 1835, o tapuio Domingos Onça assassinou Lobo de Souza, governador da Província do Grão Pará. Tinha início a Cabanagem, uma revolução radical no coração da Amazônia. Terríveis condições de existência levaram à uma onda de revoltas e motins que permearam Belém e se estenderam por várias cidades do entorno durante todo o período pós independência do Brasil, tendo como protagonista a massa paupérrima, habitante de cabanas à beira dos rios.
Com a tomada do Palácio do Governo, teve início o primeiro governo cabano encabeçado por Félix Clemente Malcher, que por ser fazendeiro e dono de escravos traiu a luta, sendo deposto e morto pelo povo. Dois outros governos foram formados, o de Francisco Vinagre, um agricultor de posses e o de Eduardo Angelim, um jovem seringueiro e jornalista. Ambos traíram os ideais do povo cabano: o fim da escravidão e melhores condições de vida.
A fase mais importante da Cabanagem foi protagonizada pelos próprios cabanos e seus grandes líderes negros, indígenas e soldados desertores, como Domingos Onça, intrépido combatente tapuio que matou Lobo de Souza; Joaquim Afonso, célebre oficial negro que formou e comandou uma milícia com mais de 500 rebeldes e foi fuzilado, a mando de Angelim, por defender o imediato fim da escravidão; Maparajuba Firmeza, desertor das tropas legalistas, comandou a luta em Cuipiranga (baixo amazonas), estrategista brilhante construiu um bastião de notável inteligência nos barrancos do rio Amazonas; Jacó Patacho, desertor e líder radical foi chamado de bandido, facínora e cangaceiro das águas pelos portugueses, conquistou vários interiores; Manoel Marques e Crispim Leão, Caciques da Tribo Mawé, conquistaram a região do baixo amazonas; Mura, tribo de guerreiros notórios, atacavam vilas e povoados e assassinaram Bararoá, o líder mais cruel das forças oficiais.
Tanto ousadia foi silenciada em um banho de sangue, com profundas consequências no futuro. Além da destruição de trinta mil vidas negras e indígenas, e o quase desaparecimento da nação Mura, manteve as condições desumanas de existência e o subjugo ao Império, que continuava dominado por Portugal.
Tempos depois trocaram o império pela república, ambos burgueses, ambos inimigos dos trabalhadores. Trocaram o poder vitalício, pelo poder do voto, ambos jogo de cartas marcadas.
Hoje vemos essa mesma população de negros, indígenas e brancos pobres vivendo em condições muito semelhantes às de seus irmãos no Brasil imperial. Com a mesma vida sofrida, essa massa pobre mora em casebres e palafitas; tem suas casas alagadas e suas ruas inundadas; seu entorno cercado de lixo, ratos e urubus; é jogada nos corredores de hospitais; morre de doenças ligadas à miséria, como tuberculose; vive do subemprego, sem nenhum direito; é alvo da mira da polícia.
Mas é um povo que tem lutado bravamente, de diversas formas: organizado em sindicatos, partidos políticos, movimento estudantil, movimento contra a opressão, em defesa das cotas nas universidades públicas, em defesa de uma política de reparação histórica. Nunca deixa de lutar por seus direitos, por melhores condições de vida. É uma história de luta e resistência. Luta que deve ser organizada sempre pelos de baixo, com democracia operária e cujo objetivo final deve ser a destruição do capitalismo, sistema econômico e social que produz toda a miséria e violência que vive nossa classe, e a construção de uma sociedade igualitária, socialista.
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