O programa TVGGN Justiça recebeu o ex-ministro Carlos Eduardo Miranda, de Direitos Humanos do governo Lula, e a presidente da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), Eugênia Gonzaga, para discutir a importância da resolução que estabelece a determinação de novas certidões de óbito para vítimas da ditadura militar.
De acordo com a medida do Conselho Nacional de Justiça, as certidões de óbito dos mortos e desaparecidos políticos devem registrar a responsabilidade do Estado, sendo classificadas como “morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro no contexto da perseguição sistemática à população identificada como dissidente política do regime ditatorial instaurado em 1964”.
“Isso é uma reivindicação histórica. Quando nasceu essa coisa da morte presumida por desaparecidos, foi em 1995. Era o governo Fernando Henrique Cardoso, Nelson Jobim era o ministro da Justiça […]. A lei era confusa, era ambígua. Ele falava assim: ‘Serão reconhecidos pelos estados que morreram em dependência policial ou assemelhada'”, resgata Miranda.
A situação era ainda pior, “humilhante”, nas palavras do ex-ministro, para as famílias de desaparecidos, que recebiam um atestado de óbito de “morte presumida”.
Graças à atuação da Comissão da Verdade, 38 atestados foram retificados e recomendou que 407 famílias pudessem contar com a mesma correção.
A partir da determinação do ministro e presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, os cartórios terão um prazo de 30 dias para alterar os documentos – o que Miranda classifica como decisão histórica, que dá início a um processo de reparação histórica e possibilidade de reparação financeira.
Eugênia Gonzaga ressalta que a retificação do atestado de óbito é muito mais importante para as famílias do que indenizações financeiras, pois se trata de uma indenização moral.
“A ditadura acabou e houve uma negociação de que não poderia admitir que houve mortes, não poderia haver nenhum tipo de responsabilização. Mas passou-se a Lei de 79, da Lei de Anistia, que pôde trazer muitas pessoas para casa. Veio 1985, que não teve diretas, mas que colocou um civil no poder. Um civil que era o José Sarney e notoriamente que respeitava esses pactos com a ditadura. Veio 1988, com a Constituição Brasileira de 88 e nada de se reconhecer as mortes, nada de as pessoas que militaram, por exemplo, no Araguaia, de voltar para casa”, continua Eugênia.
Além da dor da perda de entes queridos, as famílias também foram privadas de direitos básicos, como o de vender imóveis herdados das vítimas da ditadura ou de poder se casar novamente, no caso dos cônjuges.
“Mas [a lei de 1995] era uma lei muito restritiva, porque só reconhecia como vítimas da ditadura do Estado brasileiro as pessoas que militaram, ou entendidas como militantes contra o Estado brasileiro. Não reconheceu as pessoas atingidas por aquele momento de repressão política, por aquele momento de extrema truculência. Então, por exemplo, nós não temos entre as vítimas da ditadura os trabalhadores que morreram naquelas greves reprimidas fortemente e que as empresas colaboraram. Empresas tipo Volkswagen, Fiat, Mannesmann, CSN, entre outros, colaboraram, gente, não era só dando dinheiro para poder comprar carro para a polícia. Colaboraram fazendo sequestro desses trabalhadores dentro das fábricas, não deixando voltar para casa. Às vezes, deixando as famílias passarem fome, as famílias sem saber o que acontecia, não dando emprego para outros possíveis perseguidos da ditadura.”,
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