A Terra Santa, desde a época dos cananitas, há quatro mil anos, foi parte de muitas diferentes nações. Uma terra muito fértil entre o Mediterrâneo e o rio Jordão, que fica entre o Egito e a Mesopotâmia, sempre foi um local de grande importância. Nessa história de quatro milênios, o território foi ocupado por potências de fora do Oriente Médio poucas vezes, primeiro pelos gregos, com Alexandre, o Grande; depois pelos romanos; e, já no século XX, pelos ingleses. Jesus nasceu em Belém, durante a ocupação romana.
Em 63 A.C., o exército romano sitiou a cidade de Jerusalém e conquistou a terra. Como primeira forma de dominação, os romanos permitiram que o reino da Judeia tivesse uma administração própria, mas controlada pelo império. Assim surgiu o reino de Herodes, que foi o governante até seis anos após o nascimento de Jesus. Depois os romanos assumiram diretamente o governo da província. Ou seja, em toda a sua vida adulta, Jesus se rebelou diretamente contra o império romano.
O Corão descreve a anunciação para Maria:
“E os anjos disseram: ‘Ó Maria, por certo Deus te anuncia boas novas, de uma palavra Sua. Seu nome será o Messias, Jesus, filho de Maria, nobre neste mundo e no outro, e estará entre os próximos de Deus. Falará aos homens no berço e na maturidade, e será dos justos.’ Ela disse: ‘Ó meu Senhor, como terei um filho, enquanto nenhum homem me tocou?’ Ele disse: ‘Assim será! Deus cria o que quer. Quando decreta algo, apenas diz: “Seja!”, e é.’” (Surata Ali’Imran 3:45-47)
O evangelho de Lucas fala sobre a virgem de Nazaré para Belém:
“Naqueles dias, César Augusto publicou um decreto ordenando o recenseamento de todo o Império Romano. […] José também foi da cidade de Nazaré da Galileia para a Judeia, a Belém, cidade de Davi, porque pertencia à casa e à linhagem de Davi. […] Estando eles ali, chegou o tempo de nascer o bebê, e ela deu à luz seu primogênito. Envolveu-o em panos e colocou-o numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na hospedaria.” (Lucas 2:1-7)
E no evangelho de Mateus, os reis magos destacam a importância política de Jesus:
“Depois que Jesus nasceu em Belém da Judeia, nos dias do rei Herodes, magos vindos do Oriente chegaram a Jerusalém e perguntaram: ‘Onde está o recém-nascido rei dos judeus? Vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo.’ […] Quando tornaram a ver a estrela, encheram-se de júbilo. Ao entrarem na casa, viram o menino com Maria, sua mãe, e, prostrando-se, o adoraram. Então abriram seus tesouros e lhe deram presentes: ouro, incenso e mirra.” (Mateus 2:1-2, 9-11)
As descrições do Corão e da Bíblia são indícios interessantes do que pode ter acontecido naquele momento de ocupação romana da terra, que poucos anos depois já ganharia seu nome de Palestina. O que fica claro pelas descrições é que Jesus seria um enviado de Deus para liderar o seu povo na luta contra a ocupação. O fato dele ser tratado como o futuro rei dos judeus durante o seu nascimento, na prática, é um anúncio de que seu objetivo seria a derrubada do rei Herodes. Ao longo de sua vida, Jesus lutou contra o império romano e foi assassinado como um rebelde, com a punição destinada para os rebeldes, a crucificação.
O dirigente do Partido Social Democrata da Alemanha, Karl Kautsky, analisou a história de Jesus e fez uma análise da luta de classes naquele momento. Ele afirma: “os dois séculos que vão dos Macabeus à destruição de Jerusalém por Tito, a bacia do Mediterrâneo Oriental esteve em constante agitação. Um regime após o outro caiu; uma nação após a outra perdeu sua independência ou posição dominante. A força que, direta ou indiretamente, causou todas essas revoluções, a República Romana, foi dilacerada pelos mais tempestuosos distúrbios internos durante esse período, desde os Gracos até Vespasiano, distúrbios que cada vez mais emanavam dos exércitos e de seus generais”.
E segue: “este foi um período em que a expectativa de um Messias se desenvolveu e se solidificou; durante esse tempo, nenhuma organização política parecia permanente; todas pareciam meramente provisórias, enquanto a revolução política era inevitável e sempre esperada”.
Ou seja, a crise política criada pela ascensão do império romano gerou uma situação revolucionária na região da Palestina. Jesus nasceu nos últimos 70 anos desse período e assim se tornou uma das lideranças nessa luta política.
Kautsky ainda descreve: “desde o período em que a morte de Jesus é situada até a destruição de Jerusalém, os distúrbios nunca cessaram ali. Combates nas ruas eram algo bastante comum, assim como a execução de insurgentes individuais. Um confronto de rua protagonizado por um pequeno grupo de proletários, seguido da crucificação de seu líder, oriundo da eternamente rebelde Galileia, poderia muito bem ter causado uma impressão profunda nos sobreviventes que participaram do evento, sem que isso obrigasse os historiadores a registrar tal ocorrência cotidiana”.
A história de Jesus faz parte da história da formação do povo palestino. É o mais famoso dos homens que nasceu naquela terra, um mártir que foi eternizado por lutar contra a dominação estrangeira.