Juca Simonard
A ocupação imperialista não é boa, mas não se deve apoiar o Talibã. Essa colocação, além de mostrar um completo alinhamento com a política do imperialismo, se baseia no fato da organização política ainda ter uma série de preconceitos, digamos assim, não alinhados com o “mundo civilizado”.
A esquerda, afinal, não poderia apoiar esse atraso, certo? Errado: o marxismo demonstrou, inúmeras vezes, que se deve apoiar qualquer tipo de luta contra o imperialismo, o epicentro da contrarrevolução mundial. Mesmo que isso signifique apoiar os “bárbaros” de um país oprimido contra os “civilizados” imperialistas — que reduziram o país, já extremamente atrasado, a pó e escombros.
A resistência oferecida pelos persas e a que os chineses opuseram até agora à invasão britânica formam um contraste que merece nossa atenção. Na Pérsia, o sistema militar europeu foi enraizado sobre a barbárie asiática; na China, a semi-civilização em decomposição do Estado mais antigo do mundo encontra os europeus com seus próprios recursos.
O fato é que a introdução da organização militar europeia entre as nações bárbaras está longe de ser concluída quando o novo exército foi subdividido, equipado e treinado à moda europeia. Isso é apenas o primeiro passo. Também não basta a promulgação de um código militar europeu; ele não garantirá disciplina europeia mais do que um conjunto de regulamentos de treinamento europeus produzirá, por si só, táticas e estratégias europeias.
O ponto principal, e ao mesmo tempo a principal dificuldade, é a criação de um corpo de oficiais e sargentos, educados no sistema europeu moderno, totalmente livres dos antigos preconceitos e reminiscências nacionais em assuntos militares, e aptos a inspirar vida na nova formação.
A política pirata do governo britânico causou essa revolta universal de todos os chineses contra todos os estrangeiros, marcando-a como uma guerra de extermínio.
Em vez de moralizar sobre as horríveis atrocidades dos chineses, como faz a imprensa cavaleiresca inglesa, seria melhor reconhecermos que esta é uma guerra pro aris et focis, uma guerra popular pela manutenção da nacionalidade chinesa, com todos os seus preconceitos arrogantes, estupidez, ignorância erudita e barbárie pedante, se quiser, mas ainda assim uma guerra popular.
A hora da morte da Velha China está rapidamente se aproximando. A guerra civil já dividiu o Sul do Norte do Império, e o Rei Rebelde parece estar tão seguro dos imperialistas (se não das intrigas de seus próprios seguidores) em Nanquim, quanto o Imperador Celestial está seguro dos rebeldes em Pequim.
Uma coisa é certa: a guerra anglo-chinesa apresenta tantas complicações que é completamente impossível prever a direção que tomará. Por alguns meses, a falta de tropas, e por um tempo ainda maior a falta de decisão, manterão os britânicos bastante inativos, exceto, talvez, em algum ponto sem importância.
Pérsia — China
Os ingleses estão, desta vez, em uma posição difícil. Até agora, o fanatismo nacional chinês parece se estender apenas pelas províncias do sul que não aderiram à grande rebelião. A guerra vai se restringir a essas? Então, certamente não levaria a nenhum resultado, nenhum ponto vital do império sendo ameaçado.
O próprio fanatismo dos chineses do sul em sua luta contra os estrangeiros parece marcar uma consciência do supremo perigo em que a Velha China está colocada; e antes que muitos anos passem, teremos que testemunhar as lutas finais do império mais antigo do mundo e o dia de abertura de uma nova era para toda a Ásia.