O Rodízio das Elites Nacionais
por João Pedro Silva
As tensões entre democracia e capitalismo formam um tema clássico de análise nas Ciências Sociais. Como tenho ressaltado em textos publicados aqui no Jornal GGN, no Brasil o tema ganha uma enorme complexidade, pois aqui ao conflito de classes, típico do capitalismo, soma-se um conflito de status – que também é algo presente em sociedades capitalistas de renda alta, como vem mostrando a teoria e a pesquisa sociológicas há muitas décadas – muito mais forte do que se costuma observar nos países capitalistas ocidentais (e do que em vários países latinoamericanos). Então, no Brasil, os estamentos do Estado costumam ter um peso político e social fora do comum.
Eu tenho defendido que, desde 2013, temos vivido um forte processo de conflito de status. Todavia, agora, a coisa parece ter mudado um pouco. Por que? Acho que a resposta é bastante simples. Tenho um grande amigo que é engenheiro e economista, professor aposentado de duas universidades federais, Luiz Rodrigues Kehrle, que, na segunda no final da década de 2000, ao analisar o processo de redução das desigualdades socioeconômicas do Brasil após a posse de Lula, me falou o seguinte: “Lula e o PT estão tentando fazer a omelete sem quebrar os ovos”. Ao que ele estava se referindo? Ao fato de que, naquele momento, se estava promovendo o combate a diferentes desigualdades socioeconômicas, mesmo sem se ter conseguido reduzir a terrível regressividade de nosso sistema tributário! Naquela época a conjuntura era muito favorável e foi, assim, possível fazer este, digamos, “milagre”. Hoje, contudo, o cenário é muito diferente. Chegou a hora da onça beber água!
Fiquei surpreso de ver um colunista econômico da mídia hegemônica ter tido a coragem de botar o guizo no gato, dando o nome aos bois e explicitado que estamos vivendo um forte conflito distributivo que tem como base a luta de classes.
O futebol costuma nos ofertar metáforas interessantes para fazer análises políticas. Irei fazer uso de uma. Em um jogo de futebol é comum o chamado “rodízio de faltas”. Diferentes jogadores de um time se revezam em fazer faltas no craque do time adversário. No Brasil, parece que as elites (vistas aqui como a soma dos estamentos com os diferentes segmentos da plutocracia) parecem fazer o mesmo quando se trata de tomar a iniciativa de tentar iniciar um golpe contra um governo progressista.
Para buscar deixar mais clara a tendência observada, decidi estimar um modelo estatístico bastante simples, regressando o valor de fechamento diário do câmbio sobre os dias do mês, ajustando equações segmentadas para os períodos antes e depois da divulgação da pesquisa. A melhor forma de exibir o resultado é através do gráfico abaixo.
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Quero concluir, pois, com a afirmação de que o comportamento absolutamente extravagante do mercado de câmbio brasileiro, sem qualquer paralelo em uma comparação internacional, tem um evidente caráter político e busca conseguir, através de operações do mercado financeiro, o mesmo que o estamento jurídico, através da fraudulenta operação lava jato, conseguiu realizar contra o governo Dilma, em 2016, ou seja, dar início a um novo golpe de Estado!
João Pedro Silva – Ph.D, University of Wisconsin – Madison, 1997. Pesquisador PQ do CNPq. Pesquisador Visitante University of Texas – Austin. Professor Titular do Departamento de Sociologia – UFMG – Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas
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