A proposta de emenda à Constituição sobre o corte de gastos, aprovada pelo Congresso Nacional, propõe, entre outras medidas, alterar a distribuição dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, o Fundeb.
Antes da PEC, o Fundeb devia contribuir com no mínimo 23% do total de recursos dos fundos estaduais de fomento à educação até 2026. O repasse ocorria em três categorias, duas das quais determinavam que a União complementasse os fundos de estados onde o valor gasto por aluno estivesse abaixo do mínimo nacional.
A proposta encaminhada pelo governo como parte de seu pacote fiscal criou uma quarta categoria na alocação das verbas do fundo: a manutenção de matrículas de escolas públicas em tempo integral. Conforme o texto, em 2025, até 10% dos recursos do Fundeb terão esse fim — a redação inicial do governo, desidratada na versão final, falava em 20%. A partir de 2026, de acordo com a PEC, no mínimo 4% da complementação de estados e municípios ao Fundeb deverá servir para esse tipo de despesa.
A previsão, contudo, é que a educação perca dinheiro em investimentos, segundo o educador e cientista político Daniel Cara.
“Isso representa uma perda de bilhões por ano, logo mais dezenas de bilhões”, projetou. Ele enfatizou que, até então, o Fundeb e a rubrica orçamentária do MEC específica para promover a educação integral existiam de forma independente.
“Agora, com a nova forma de complementação da União, poderá haver uma redução que pode atingir até 10% dos recursos do fundo que seriam destinados a todas as etapas e modalidades da educação básica para a educação de tempo integral, resultando em uma perda significativa de recursos, em especial para estados e municípios.”
Cara classificou como “imprudente” a condução da PEC, devido ao que considera uma falta de análise dos impactos. Ele também definiu como negativo o fato de, a partir de 2026, 4% dos recursos do Fundeb em cada estado irem parar em matrículas de tempo integral.
“É uma medida arriscada, devido à falta de estudos que garantam sua viabilidade fiscal. Além disso, obriga estados e municípios a criarem essas matrículas, podendo prejudicar aqueles que já estão maximizando seus esforços na educação básica em tempo integral. É impositivo e contra o pacto federativo.”
Cara entende, por outro lado, ter havido uma redução de danos no texto final, que impediu o uso dos recursos do Fundeb para a alimentação escolar. Isso poderia, segundo ele, ampliar a perda orçamentária da educação.
A agenda das escolas em tempo integral é uma das apostas do ministro da Educação, Camilo Santana, com base em sua experiência como governador do Ceará. Em 2022, ele anunciou um plano de universalização do ensino no estado, a ser cumprido até 2026.
Em julho, o presidente Lula sancionou o Programa de Educação em Tempo Integral. À época, o governo projetou alcançar um milhão de matrículas em tempo integral até 2024 e 3,2 milhões até 2026 em todas as modalidades da educação básica.
Em nota, a organização Todos pela Educação afirmou que a nova vinculação de dinheiro do Fundeb minimiza a perda orçamentária para a educação, “mas ainda trazendo efeito deletério ao financiamento de políticas educacionais pela União”.
Também criticou a forma “incerta” com que o governo federal projetou os cálculos a partir das mudanças. O Ministério da Fazenda estimou que a alteração constitucional no Fundeb geraria uma economia superior a 40 bilhões de reais até 2030.