Interlocutores de militares e civis indiciados pela Polícia Federal (PF) na investigação sobre a tentativa de golpe de Estado têm demonstrado incômodo com a estratégia de defesa adotada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Aliados interpretam as ações de Bolsonaro como um indicativo de que ele estaria priorizando seu projeto político em detrimento das lealdades, o que gerou desconforto entre antigos aliados que o apoiaram até o final de seu governo.
A percepção é de que, após o indiciamento, “tudo tem sido feito para livrar a cabeça de Bolsonaro” e que ele estaria “colocando o projeto político dele acima das amizades e da lealdade que militares e civis sempre demonstraram a ele”.
Uma das atitudes que mais chamou a atenção foi a utilização de áudios da Operação Contragolpe, incluídos no relatório final, para sustentar a versão de que, apesar de muitos desejarem o golpe, Bolsonaro teria sido contra a ideia.
Essa estratégia foi vista como um ato de ingratidão, já que a versão apresentada pelo ex-presidente atribui a culpa exclusivamente aos civis e militares próximos ao poder no Palácio do Planalto.
Comparações foram feitas entre sua postura atual e a de Lula (PT) durante as investigações do mensalão e da Lava Jato. “Está igual ao Lula nos inquéritos da Lava-Jato”, disse uma das fontes, sugerindo que Bolsonaro adota a mesma linha de argumentação de não ter conhecimento sobre o que acontecia ao seu redor.
Entre aliados, a leitura é de que Bolsonaro sabia ou, no mínimo, desconfiava das articulações, mas optou por adotar uma postura ambígua, esperando que a situação pudesse favorecer seus interesses.
Um exemplo citado é um áudio em que um coronel sugere ao general Mario Fernandes que Bolsonaro deveria demonstrar “coragem moral” para se posicionar contra as ações em andamento, o que aumentou ainda mais o desconforto entre os apoiadores.
A estratégia de defesa tem fragilizado antigos aliados de Bolsonaro, como os generais Augusto Heleno, Braga Netto e Paulo Sérgio, além do almirante Almir Garnier e ex-assessores como Marcelo Câmara e Filipe Martins.
Esses aliados agora se encontram em uma posição delicada, uma vez que, ao tentarem justificar suas ações com base em medidas constitucionais — como a decretação de Estado de Defesa, Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e o uso do artigo 142 da Constituição —, veem suas posições sendo enfraquecidas pela postura passiva de Bolsonaro.
A linha de defesa apresentada sugere que, mesmo ao levantar suspeitas de fraudes nas urnas após a vitória de Lula, Bolsonaro nunca teria tido a intenção de promover um golpe de Estado.