Na guerra na Ucrânia, todos os movimentos que o imperialismo faz, mais ele aprofunda seu impasse, como se mergulhasse na areia movediça. Na paisagem exuberante da Amazônia, Biden anunciou sua autorização para que Kiev usasse mísseis de longo alcance para agredir diretamente o território russo. Era como se ultrapassasse ao mesmo tempo várias linhas vermelhas estabelecidas pela Rússia, que viu na decisão uma colocação em risco da própria existência do país. A ameaça russa de uma resposta nuclear seria concretizada efetivamente?
O ataque de Kiev foi completamente inócuo, atingindo territórios russos sem causar muitas perdas. A Rússia respondeu com um contra-ataque não nuclear, mas não afastou a possibilidade de usar essas armas da próxima vez. Por outro lado, não podemos classificar as armas utilizadas como “convencionais”, de forma alguma.
A precisão do ataque a uma fábrica importante ucraniana e seu poder devastador surpreendeu e assustou o imperialismo, que não conseguiu explicar o que tinha acontecido.
A explicação veio em um discurso de Putin, logo após a resposta russa. Trata-se de uma nova arma, parte do sistema de mísseis hipersônicos russos Oreshnik (Avelã), que não haviam sido divulgados, e que são capazes de atingir a velocidade dez vezes maior que a do som, o chamado Mach 10.
O Presidente Putin lançou um ultimato ao imperialismo e respectivos vassalos de que a ameaça de resposta nuclear não estava abandonada. Ele disse: “Repito: estamos testando o sistema de mísseis Oreshnik em condições de combate em resposta às ações agressivas dos países da OTAN contra a Rússia.
A questão da futura implantação de mísseis de médio e curto alcance será decidida por nós com base nas ações dos EUA e seus satélites. Os alvos a serem atacados durante os testes subsequentes de nossos sistemas de mísseis mais modernos serão determinados por nós com base nas ameaças à segurança da Federação Russa. Consideramo-nos autorizados a usar nossas armas contra as instalações militares dos países que permitem que a Ucrânia use suas armas contra nossas instalações e, em caso de escalada de ações agressivas, responderemos de maneira igualmente decisiva e especulativa. Recomendo às elites dominantes dos países que planejam usar seus contingentes militares contra a Rússia que pensem seriamente sobre isso.”
Os norte-americanos presumiram que este seria simplesmente outro teste de míssil balístico, como os realizados rotineiramente perto do Ártico. Mas isso não era verdade. O sistema Oreshnik, é uma profunda alteração em termos de tecnologia militar e bélica em vários aspectos. Em primeiro lugar, a velocidade inédita impede que seja detectado por quaisquer dos sistemas ocidentais de defesa, que já estão defasados mesmo para as armas hipersônicos menos velozes. A nova estratégia é que a Rússia é capaz de lançar essas armas de ultra-alta velocidade literalmente em qualquer lugar do mundo.
O novo míssil Oreshnik pode chegar a Berlim em 11 minutos e Londres em 19 minutos. Lançado do sul da Rússia, Oreshnik pode chegar à base aérea dos EUA no Catar em 13 minutos; lançado de Kamchatka, no Extremo Oriente, pode chegar a Guam em 22 minutos; e lançado de Chukotka, você pode chegar aos silos Minuteman III em Montana em 23 minutos.
O míssil Oreshnik pode ser incorporado em mísseis intercontinentais não nucleares, ou seja, se Oreshnik for lançado do Extremo Oriente russo, poderá facilmente alcançar a maioria das principais cidades dos Estados Unidos.
Além disso, a aplicação da tecnologia Oreshnik a mísseis táticos também muda todo o domínio tático.
Outro aspecto importante é o poder destrutivo do novo míssil. Ele é composto de várias ogivas, que multiplicam seu poder de fogo e cada uma delas pode ser dirigida à distância para atingir um alvo preciso, e cada uma dessas ogivas tem um poder de devastação total comparável à de uma arma nuclear de baixa ou média potência. Com a vantagem de não emitir radiação.
A questão geopolítica
A guerra do imperialismo contra a Rússia na Ucrânia contra todas as perspectivas racionais não está terminando, apesar de que a Ucrânia não tem condições de vencer, e os graves problemas econômicos que a guerra causa na Europa. A questão do novo míssil russo coloca o país em superioridade estratégica, mas o imperialismo não considera factível a ideia de derrota. Assim, o que acontece é um novo estágio de escalada político-militar, cujo indicador imediato foi o uso pela Ucrânia de sistemas de mísseis americanos e britânicos para atacar o território russo, o surgimento de uma nova doutrina nuclear em Moscou, a subsequente destruição da usina ucraniana de Yuzhmash por um míssil de médio alcance e novos ataques à Rússia.
Do lado russo, uma ofensiva continua a ser realizada no Donbass e em outras regiões, novos ataques são lançados contra a infraestrutura industrial e instalações de energia da Ucrânia, e a cooperação com adversários dos EUA, em particular a Coreia do Norte, está se intensificando.
Dessa forma, o cenário básico para o futuro próximo é a continuação de uma “escalada progressiva”. Devemos esperar mais ataques ao território russo com armas ocidentais. No entanto, provavelmente serão ataques pontuais, que serão equilibrados até o limite das condições descritas na nova doutrina nuclear russa. Os militares russos têm mais influência em tal cenário. Os ataques de teste com os novos mísseis de médio alcance podem continuar. É improvável que muitos ocorram, mas o efeito psicológico e o uso do novo sistema em condições de combate são importantes.
A Rússia continuará com seus ataques habituais de mísseis e drones, como vem fazendo há algum tempo e de uma forma que Kiev não pode igualar. As perdas materiais da Ucrânia com esses ataques são tangíveis.
O exército russo está avançando lentamente, desgastando o inimigo. No cenário de “escalada”, a Rússia tem uma vantagem e a capacidade de infligir danos muito maiores à Ucrânia do que Kiev e o Ocidente infligem à Rússia. As perdas de infraestrutura e potencial industrial ucranianos aumentarão, assim como as perdas de território, equipamento militar e pessoal das forças armadas. Além disso, a Rússia ainda tem influência sobre o Ocidente e em outras partes do mundo, incluindo o Oriente Médio.
Um cenário radical poderia ser desencadeado pela tentativa da Ucrânia de romper com o algoritmo perdedor de “escalada progressiva”. A intensificação dos ataques com mísseis em combinação com o uso de drones é uma tentativa de combater as ações russas, demonstrar a maior capacidade de causar danos e, ao mesmo tempo, envolver mais profundamente os parceiros ocidentais no conflito.
Os aliados ocidentais de Kiev ainda não têm um desejo consolidado de se envolver em tais iniciativas. Por exemplo, a Alemanha está evitando fornecer seus mísseis de cruzeiro para ataques em território russo. Mas a “escalada progressiva” também é aceitável até certo ponto para o Ocidente. Isso os permite limitar o potencial da Rússia na Ucrânia, desgastando os recursos de Moscou e testando suas armas e sistemas de inteligência em condições de combate.
A Ucrânia está se tornando cada vez mais dependente do Ocidente, perdendo efetivamente sua soberania. Sua capacidade de conduzir operações militares já está diretamente ligada ao apoio ocidental, e a reconstrução do pós-guerra sem ela é simplesmente impensável. A Ucrânia também está exausta pela guerra, mas seus aliados têm um poder colossal e, se reunirem vontade política, são capazes de ações mais agressivas.
Os ataques de mísseis de cruzeiro e balísticos em território russo não quebrarão a vontade da liderança russa, mas, pelo contrário, aumentarão a motivação para acabar com a situação com passos muito mais determinados e rápidos.
No cenário de uma “escalada progressiva”, a Ucrânia também enfrentará uma crise crescente. Estritamente falando, Kiev é a parte mais vulnerável em qualquer evolução da situação, tanto radical quanto fundamental. A Ucrânia inevitavelmente sofrerá perdas, mesmo no caso de uma solução pacífica. A questão é o preço que todos os participantes pagarão. O preço para a Ucrânia será o mais alto
A grande mudança esperada é qual será a atitude de Trump em relação à guerra. Tudo indica que os EUA não mais patrocinarão a guerra, ainda mais quando ela começa a entrar em um beco sem saída. O mais provável é que a guerra seja “congelada”, com a manutenção da situação atual em relação à questão territorial, o que favorece os russos. Será uma situação como a guerra da Coreia que ainda não terminou. Resta saber se a Rússia, agora em situação de superioridade militar, concordará com essa solução.