Independência, à margem da história
por Luís Felipe de Souza
A proclamação da Independência do Brasil, à margem do Ipiranga em 7 de setembro de 1822, ressoa como um dos momentos mais emblemáticos da história nacional. O grito “Independência ou Morte!” de Dom Pedro I simboliza a ruptura formal com Portugal, mas será que essa emancipação política se traduziu em uma genuína soberania, livre de pressões externas? Mergulhar na complexa teia histórica, política e econômica que se desenrolou desde então nos permite vislumbrar as nuances dessa questão, tão crucial para compreender o Brasil contemporâneo.
A Independência, embora celebrada como um ato heroico, foi, na realidade, um processo marcado por negociações e concessões. A elite brasileira, temendo perder seus privilégios em meio às turbulências políticas em Portugal, optou por uma solução que garantisse a continuidade da ordem social e econômica. A manutenção da monarquia, com D. Pedro I no trono, evidencia essa estratégia. A Independência foi feita de cima para baixo, pelas classes dominantes, sem a participação popular.
O reconhecimento da Independência por Portugal, em 1825, veio acompanhado de um Tratado que impunha ao Brasil o pagamento de uma vultosa indenização e a concessão de privilégios comerciais aos portugueses. Essa dependência econômica inicial lançou sombras sobre a recém-adquirida “soberania”. O Brasil, apesar de politicamente independente, permanecia atrelado aos interesses de sua antiga metrópole.
A Era Vargas (1930-1945) trouxe consigo um projeto de modernização e industrialização do país, com forte intervenção do Estado na economia. A criação de empresas estatais, como a Petrobras (1953) e a Companhia Siderúrgica Nacional (1941), e a implementação de políticas trabalhistas representaram avanços significativos na busca por uma maior autonomia. No entanto, o autoritarismo do regime e a repressão aos movimentos sociais lançaram dúvidas sobre a capacidade do Brasil de conciliar desenvolvimento econômico com democracia e liberdade.
A redemocratização, a partir de 1985, trouxe consigo a esperança de um novo ciclo de desenvolvimento, marcado pela consolidação da democracia e pela busca por maior justiça social. A Constituição de 1988, conhecida como a “Constituição Cidadã”, ampliou os direitos sociais e garantiu a liberdade de expressão. No entanto, os desafios persistem.
A busca por uma soberania real passa pela construção de um projeto de desenvolvimento que priorize a justiça social, a sustentabilidade ambiental e a democracia. A diversificação da economia, a redução da dependência tecnológica, a proteção dos recursos naturais e a promoção de uma política externa ativa e independente são elementos essenciais para que o Brasil possa trilhar um caminho de desenvolvimento autônomo e soberano, comprometido com o bem-estar de sua população.
Referências
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil Contemporâneo. São Paulo: Brasiliense, 1942.
LIMA JUNIOR, P. G. de, & FREITAS JUNIOR, V. de. (2024). Soberania Nacional nas Relações Internacionais e os Direitos Humanos. André Luis de Lima Maia (Editor/Coordinator).
BODIN, Jean. Six livres sur la République. Paris: Le livre de poche, (1583) 1993.
Luís Felipe de Souza é bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal do ABC (UFABC) e pesquisador do Observatório de Política Externa e Inserção Internacional do Brasil (OPEB).