O coach venceu, agora só se fala no coach! Como aloprar a política com a comunicação indireta
por Wilson Roberto Vieira Ferreira
O coach venceu! Agora só se fala no candidato coach à prefeitura de São Paulo, condenado por crimes de fraudes bancárias e suspeitas de conexões com o crime organizado. Mas tais denúncias parecem dar ainda mais luz própria a Pablo Marçal. As imagens nos bastidores pós-debate na TV Bandeirantes, cercado por câmeras, microfones e celulares de repórteres dão a dimensão do processo de normalização de mais uma metástase que promete destruir a política de dentro para fora.
Em agosto de 1995, Paul Virilio publicava no “Le Monde Diplomatique” o artigo “Vitesse et Information: Alerte Dans le Cyberespace!” – “Velocidade e Informação: Alerta do Ciberespaço”. Nesse pequeno texto, Virilio descrevia o “grande evento que dominará o século XXI” que seria a invenção da perspectiva em tempo real substituindo a velha perspectiva tridimensional renascentista.
Virilio foi um visionário pouco compreendido num momento em que a World Wide Web estava apenas começando e pensar o mundo não mais do ponto de vista dos átomos, mas dos bytes era um desafio abstrato inclusive para esse humilde blogueiro.
Mas somente agora parece que estamos tomando pé da situação. O que na prática significavam os alertas de Virilio no final do século passado: os impactos do on line, do tempo real e da interatividade digital em instituições como democracia, esfera pública, representatividade e a própria política.
Em um século em que o ciberespaço o mundo público tridimensional, simplesmente essas instituições não conseguem funcionar ou são transfiguradas na paródia da “festa da democracia”. Ou ainda, reduzida à normalização da sua própria crise ao serem entendidas nos aspectos mais formais: o voto, urnas, partidos políticos, debates engessados na TV etc.
A recusa dos candidatos à prefeitura de São Paulo Boulos, Nunes e Datena de não participarem do último debate organizado pela Veja e ESPM é uma reposta tardia à estratégia alt-right de comunicação indireta do candidato coach Pablo Marçal.
Muito tarde esses candidatos compreenderam que personagens como Pablo Marçal emergiram e vivem para/no ciberespaço da rede sociais e Internet. Esse novo espécime híbrido concebe “a festa da democracia” apenas como uma paródia hilária.
Marçal é apenas um cara que tornou a eleição em São Paulo mais “competitiva”.
Alt-right e a Comunicação Indireta
Para entender essa estratégia, um exemplo didático é o filme Obrigado Por Fumar (2005). Nele vemos uma sequência em que o porta-voz da indústria do tabaco, Nick Naylor, dá uma pequena aula de relações públicas para o seu filho Joey.
O emissor “A” dirige a “B” um enunciado em tom assertivo, provocativo. Receptor “B” responde em tom reativo, seja emocional ou tentando uma asserção argumentativa mais dura. A treplica do emissor “B” será em tom jocoso, não contra-argumentando, mas expondo a uma suposta reação destemperada ou desautorizando “A” como interlocutor relevante.
O tom da comunicação indireta não é debater com o interlocutor, mas EXPOR o adversário nas redes sociais.
Parece que o ex-coordenador da campanha de Trump e líder da alt-right global, Steve Bannon estava certo quando alertou os jornalistas: “vocês ainda terão saudades de Trump”.
Por outro lado, o antídoto para esses espécimes híbridos como Pablo Marçal é muito simples: bastaria os candidatos e a mídia darem as costas – isolá-los em células de esquecimento, para que pereçam dentro das suas bolhas de influência.
O que vimos foi o contrário: após a performance bizarra de Marçal no debate da TV Bandeirantes, câmeras, flashs, celulares e microfones cercaram o candidato nos bastidores da emissora. À espera de que ele desse continuidade à performance do “debate”.
(a) Dilema midiático
Típico dilema, efeito do marketing de guerrilha que está na essência dessa verdadeira bomba semiótica. É impossível negar aquilo que é mostrado. Toda imagem é afirmativa.
(b) Lavajatismo
O pânico moral do lavajatismo continua vivo e forte. Por mais que até mesmo a grande mídia levante suspeite das atividades criminais de Marçal (de fraudes bancárias a conexões do seu partido com o crime organizado), o imaginário da operação Lava Jato está presente.
Por mais que a “Vaza Jato” tenha exposto crimes e improbidades de Sérgio Moro, o juiz continuou (para mídia e parte significativa da opinião pública) como um herói necessário num momento de exceção: tudo precisava ser feito para combater o “maior esquema de corrupção da História”.
As denúncias dos crimes de Marçal parecem até fortalecê-lo: afinal, para combater drogados, corruptos e comunistas, somente alguém muito “casca grossa”, antissistema, antipolítica e assim por diante.
Os vícios privados de Marçal se tornaram virtudes públicas.
Continue lendo no Cinegnose.
Leia também: