O contribuinte paulistano está pagando um valor até quatro vezes mais alto pela água, sopa, achocolatado e chá que o poder público distribui em dias de frio intenso a pessoas em situação de rua. E, segundo investigação de Amanda Rossi, há indícios de que foi favorecido um bufê cujos donos são ligados a Rodrigo Goulart (PSD), da base do prefeito Ricardo Nunes na Câmara dos Vereadores.
Tão desconcertante quanto o fato que os quatro concorrentes com preços mais baixos foram desclassificados é a coincidência de que o vereador foi um dos que assinaram o pedido de abertura de uma CPI para investigar entidades que prestam auxílio à população de rua em São Paulo. Sim, aquela comissão que quer investigar o padre Júlio Lancellotti por doar comida, assim, de graça, aos mais pobres.
Depois, em junho, a Câmara dos Vereadores da capital ainda aprovou em primeira votação um projeto de lei que dificulta a doação de comida a miseráveis, o PL para Promoção da Fome.
Para doar comida à população em situação de rua, as pessoas físicas ou jurídicas interessadas teriam que receber autorização prévia da prefeitura após apresentar uma penca de documentos, agendar a doação e atender a uma série de requisitos, como o aval da Vigilância Sanitária para qualquer pão com manteiga entregue a quem tem fome. Quem ganha a comida também teria que estar cadastrado. O PL afirmava que, em caso de descumprimento, quem doar alimentos poderia ser multado em R$ 17.680.
Tudo isso, na prática, impossibilitaria a distribuição de alimentos a quem precisa. Pois, vale lembrar, fome não vem com hora marcada, nem respeita burocracias. Só o PT e o PSOL se colocaram de forma contrária ao PL na votação simbólica. O projeto caminhou junto com um pacotão de propostas de vereadores, mas após repercussão muito ruim nas redes sociais, o prefeito prometeu que vetaria a proposta e o autor da ideia genial, o vereador Rubinho Nunes (União Brasil), anunciou que a tramitação da proposta seria “imediatamente suspensa”.
São Paulo tem uma população em situação de rua que varia de 25 mil a mais de 60 mil, a depender da estimativa e da contagem. São eles os prejudicados com a criminalização de entidades e pessoas que prestam auxílio gratuito e com a proibição de doação de comida, mas também com as evidências de mutreta em concorrências envolvendo empresas próximas de membros da base do governo municipal. Pois isso encarece a política pública voltada a esse grupo que, depois, é limada sob a justificativa de ser cara demais.
Em uma cidade na qual se lucra com sobrepreço de comida doada aos miseráveis, pessoas e entidades que a distribuem gratuitamente são ameaças que precisam ser presas ou inibidas a todo o custo.
Originalmente publicado no Uol
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