A Nigéria está novamente em chamas. A população está em revolta contra o governo. Não há estimativa do número total de vítimas do terror imposto pelo governo, mas cerca de 21 manifestantes morreram durante protestos contra o aumento de preços na Nigéria, especialmente violentos em cidades do norte do país.

O governo do Presidente Bola Ahmed Tinubu não esperou muito tempo após a sua posse, em 29 de Maio, para pôr seu plano contra os trabalhadores nigerianos em ação. O governo simplesmente cancelou o subsídio aos combustíveis, resultando em um aumento ainda maior da inflação, principalmente dos alimentos, num país em que a maioria da população é afetada pela fome.

No início de agosto, o aumento geral dos preços situou-se próximo dos 34 por cento. Há uma semana que os nigerianos organizam manifestações para expressar a sua raiva contra um governo que se declarou na campanha eleitoral a favor da democracia e dos direitos humanos. Seu Partido chama-se, ironicamente, “Congresso de todos os progressistas”.

Em 4 de Agosto, o Presidente Tinubu apelou aos nigerianos para “suspenderem os protestos e criarem espaços de diálogo”. Qual diálogo ele deseja? O Presidente continua defendendo sua política criminosa e afirmou que “as forças da ordem devem continuar a manter a paz, a lei e a ordem no país, em conformidade com as convenções sobre direitos humanos de que a Nigéria é signatária”. Faz parte dessa política a prisão de cerca de 1000 pessoas que participavam dos protestos. “O presidente não abordou questões relacionadas a como combater a fome no país, a única coisa que disse é que está disposto a dialogar com os manifestantes. Por mais nobre que pareça, não é suficiente”, acrescentou um dos manifestantes.

O mais interessante é que a Nigéria se colocou, no governo anterior, contra as revoluções havidas no Níger, Mali e Burkina Faso, como líder da Comunidade Econômica da África Ocidental. Ameaçou inclusive invadir esses países militarmente. No Níger, os manifestantes saíram às ruas para comemorar o movimento dos militares e ostentavam cartazes expressando seu ódio à França e simpatia pela Rússia.

Agora, nas manifestações dos nigerianos, pelo menos 30 dos detidos foram acusados de portarem bandeiras russas. Vários deles eram alfaiates do estado de Kano, acusados de confeccionar bandeiras para os manifestantes, como informou o serviço de inteligência do país africano.

A economia da Nigéria: a crise criada pelo FMI

Em 31 de Maio, as duas principais Centrais Sindicais da Nigéria, o Congresso Trabalhista Nigeriano (NLC) e o Congresso Sindical (TUC), decidiram declarar uma “greve geral indefinida” para exigir um aumento significativo do salário mínimo e protestar contra a redução generalizada do padrão de vida. A resposta do Governo, como vimos, foi a repressão.

As políticas ultraliberais do governo, consideradas corretas pelo FMI, causaram uma inflação infernal que gerou uma propagação muito rápida da miséria. Em 2023, a inflação anual foi de 30% e apenas no mês de abril de 2024 atingiu 33,6%, o que teve como consequência imediata a fome, pois os nigerianos passaram a ter de suspender o consumo de ovos, carne ou leite.

O governo Bola já tinha aceitado adotar as medidas exigidas pelo FMI desde o ano passado, quando foi eleito. Está claro que a sua eleição foi fraudulenta. As controversas eleições resultaram na vitória de Bola Tinubu com 36% dos votos. Os resultados foram contestados em tribunal pelos principais rivais de Tinubu na corrida presidencial, o veterano líder da oposição Atiku Abubakar, do Partido Democrático Popular (PDP), que obteve 29% dos votos, e Peter Obi, líder do Partido Trabalhista (LP), que ficou em terceiro lugar com 25% dos votos. Ambos os opositores pediram a anulação dos resultados com o argumento da transmissão eletrônica das assembleias de voto não ter podido ser realizada na totalidade, o que a Comissão Eleitoral atribuiu a “falhas técnicas”. A eleição foi chancelada pela Suprema Corte, apesar dos representantes oficiais da União Europeia afirmarem que as eleições “expuseram fraquezas sistêmicas” e indicaram “a necessidade de novas reformas jurídicas e operacionais para melhorar a transparência, a inclusão e a responsabilização”. De acordo com o chefe da missão, o eurodeputado irlandês Barry Andrews, estas deficiências “impediram a realização de eleições inclusivas” e “prejudicaram a confiança” na comissão eleitoral.

Austericídio em ritmo forçado

A pretexto de organizar as finanças públicas, outras medidas neoliberais também foram aplicadas desde o ano passado, como a eliminação de todas as restrições ao mercado cambial ou medidas de austeridade para o setor público. Estas medidas foram aplicadas de forma implacável num país onde 40% da população já se encontra abaixo do limiar da pobreza, segundo dados do próprio Banco Mundial.

Sem levar em conta esses “detalhes”, no seu último relatório o FMI felicita o governo nigeriano: “A Nigéria embarcou num caminho de reformas ambiciosas sob o novo governo do Presidente Bola Tinubu, com o objetivo de restaurar a estabilidade macroeconômica e apoiando um crescimento mais inclusivo”.

As negociações sobre o salário-mínimo, que atualmente é de 30 mil nairas (ou seja, cerca de 20 euros), são, portanto, aguardadas com grande expectativa, enquanto os sindicatos exigem que este suba para 494 mil nairas (cerca de 300 euros).

Não é surpreendente que tenha havido uma monitorização generalizada do movimento. Acima de tudo, registaram-se grandes cortes de eletricidade, perturbações no tráfego aéreo, fechamento total de escolas etc. A magnitude do movimento forçou o governo a reiniciar as negociações e os sindicatos a decidiram por uma trégua e aceitar participar.

As consequências da submissão ao FMI

No entanto, nada está resolvido e o FMI e o Banco Mundial continuam a pressionar para não abrandar a velocidade com que as reformas de austeridade são implementadas. Por exemplo, em 14 de Junho, o Banco Mundial concedeu um empréstimo de 2,25 bilhões de dólares, que vai ser adicionado à dívida externa do país de 42,495 bilhões de dólares em 2023. O Banco Mundial declarou que “O essencial é manter a dinâmica empreendida pelas novas políticas econômicas do Presidente Bola Tinubu, que colocam o país num novo caminho que pode estabilizar a sua economia e, a longo prazo, tirar o seu povo da pobreza”.

A duplicação das tarifas de energia elétrica estava entre as medidas adotadas com a “nova política econômica” em maio passado. Esta medida escandalosa foi o que desencadeou a ira dos sindicatos e da população. O que está acontecendo na Nigéria, é o que já aconteceu em muitos países da Ásia, África e América Latina que seguiram as “recomendações” do Fundo Monetário Internacional para obter empréstimos. A lógica das condições impostas pelo FMI é sempre idêntica: retirada do Estado, privatização dos serviços públicos, fim dos subsídios a produtos essenciais etc.

No caso da Nigéria, esta retirada do Estado e dos serviços públicos, e este empobrecimento geral da população são um dos principais estímulos aos grupos terroristas que, como em toda a região, tentam desestabilizar o país. Como seria de esperar, estes grupos se aproveitaram desta crise social para reiniciar as suas ofensivas.

Os estados do noroeste e alguns do centro-norte da Nigéria têm caído lentamente sob as ações do grupo terrorista Boko Haram há pouco mais de quinze anos e também do Daesh-Wap que também opera na bacia do Lago Chade. Além disso, o nordeste nigeriano tem sofrido com a presença endêmica de diferentes grupos criminosos cujas ações são muito semelhantes às da insurgência – assaltos, roubos, sequestros para extorsão – em muitos casos é difícil diferenciá-los. Estima-se que só entre 2010 e 2022, estes grupos criminosos causaram cerca de 14 mil mortes. A novidade é que um grupo afluente da Al-Qaeda no Sahel, migrou da região norte do Benin e do território do Níger para a Nigéria devido aos fatos dos novos governos da região ter contratado o Grupo Wagner russo para fazer a segurança.

A devastação da poluição da Shell

Finalmente, a exigência do FMI e do Banco Mundial de basear todo o desenvolvimento apenas no capital privado e essencialmente nas multinacionais leva os Estados africanos que solicitaram empréstimos a abandonarem todo o controle sobre os investidores privados para atraí-los cada vez mais. Nesse sentido, o exemplo da multinacional Shell é caricato. Esta multinacional tem sido denunciada há décadas pelas suas práticas perigosas e criminosas, que a ONG nigeriana HEDA descreve da seguinte forma: “Frequentes fugas de petróleo das suas infraestruturas e práticas inadequadas de manutenção e limpeza contaminaram lençóis freáticos e fontes de água potável, envenenaram a agricultura, terras e recursos pesqueiros, e prejudicaram seriamente a saúde e os meios de subsistência dos habitantes”.

Este exemplo é suficiente chamar a atenção para o fato de que os estados e nações africanas não precisam de menos Estado, como imposto pelo FMI e pelo Banco Mundial, mas sim de mais Estado, isto é, de Estados patrióticos que executem políticas de desenvolvimento centradas em si próprios e na construção da nação política. Como estão fazendo os países que a Nigéria queria invadir e violentar.

Bola e o discreto charme do imperialismo

O atual presidente da Nigéria, Bola Tinubu, é o homem que queria restaurar a “

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Última Atualização: 13/08/2024