Um ano e meio após sua reeleição, Lula tem conseguido um feito impressionante. Tem enfurecido cada vez mais a direita e frustrado cada vez mais a esquerda. Seu governo não agrada a ninguém.
O editorial Lula desafia a democracia e envergonha o Brasil, publicado pelo jornal O Estado de S. Paulo, revela a agressividade com a qual a burguesia vem atacando o governo. Para o jornal, Lula é um inimigo da “democracia”. É que estaria “envergonhando” o Brasil devido às suas posições na política internacional. Ou seja, que não responde aos interesses do povo brasileiro, mas a interesses de outra nação. Trata-se praticamente de uma chamada à derrubada do governo.
O mais curioso do artigo é que o motivo para as críticas a Lula é a sua posição em relação ao golpe de Estado em marcha na Venezuela. “Ao dizer que ‘não tem nada de grave, nada de anormal’ ocorrendo na Venezuela após a vitória do ditador Nicolás Maduro na eleição, o presidente Lula da Silva desrespeitou profundamente todos os venezuelanos que lutam pela democracia e que, nessa missão, muitas vezes colocam em risco a própria vida”
A posição de Lula, no entanto, também não agradou os seus correligionários. “Eu acho que o governo brasileiro já devia ter reconhecido o resultado da eleição do Maduro”, disse José Genoíno, veterano do Partido dos Trabalhadores (PT).
Surge, então, a questão: se Lula não está governando nem para a burguesia, nem para a sua base, para quem está governando, então?
A confusão na qual o governo Lula está inserido é típica dos governos de frente popular. Isto é, dos governos que procuram acomodar os interesses dos capitalistas e dos trabalhadores ao mesmo tempo. Tais interesses são inconciliáveis em qualquer situação. Contudo, quanto mais polarizada a situação política, mais inconciliáveis serão esses interesses.
A situação política internacional aponta para uma polarização muito profunda. Colecionando derrota após derrota, o grande capital precisa implementar governos ultra-neoliberais, como o governo argentino de Javier Milei, em tantos países quanto puder. É por isso que a posição de Lula na Venezuela incomoda: na medida em que Lula não aderiu ao discurso norte-americano e se recusou a acusar seu colega Nicolás Maduro de fraude, ele se mostrou um obstáculo à política do imperialismo para a América Latina.
Da mesma forma, os povos dos países atrasados estão cada vez menos dispostos a seguirem sob a dominação do grande capital. A experiência recente com acontecimentos como o golpe de Estado de 2016 tem levado as massas a uma única conclusão: a burguesia não tem nenhuma solução para os seus problemas. Por isso, a necessidade de um governo que declare guerra aos capitalistas é cada vez maior.
A crescente polarização não permitirá que Lula continue em cima do mundo. Em algum momento, terá de fazer uma escolha: ou se apoiará no povo para enfrentar os seus inimigos, ou capitulará diante deles.