Nessa quarta-feira (31), a Chacina do Guarujá completou um ano. Resultando na morte de, oficialmente, 28 pessoas, o massacre na Baixada Santista foi consequência da chamada Operação Escudo, deflagrada pela Polícia Militar de São Paulo devido ao suposto assassinato do policial da Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (ROTA) Patrick Bastos Reis, no dia 27 de julho de 2023.

Na época, o Diário Causa Operária (DCO) publicou artigos exclusivos resultantes de depoimentos concedidos a este Diário pelas famílias das vítimas da Chacina do Guarujá. Na ocasião do aniversário de um ano do massacre, republicamos, abaixo, dois textos:

O primeiro, datado de 29 de julho de 2023, mostra com exclusividade o começo da Operação Escudo e como já se sabia que haveria um verdadeiro banho de sangue no Guarujá naquele momento. Já o segundo, publicado em 2 de agosto, contém fotos exclusivas das vítimas da operação que mostram que os moradores da região estavam sendo executados e torturados pela PM de Tarcísio de Freitas. Confira:

ROTA no Guarujá: ‘eles vão matar pelo menos 30’

Diário Causa Operária – 29/7/2023

Chegou à nossa redação uma grave denúncia sobre a atuação das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (ROTA), batalhão da Polícia Militar de São Paulo conhecido por suas práticas violentas nos subúrbios. Segundo denunciaram os moradores da Vila Bahiana, favela do município paulista de Guarujá, agentes da ROTA assassinaram sumariamente o jovem Felipe Vieira Nunes na esquina de sua casa.

A justificativa dada pela polícia é a de que o rapaz seria uma “liderança do PCC” e de que ele teria trocado tiros com os agentes. Os moradores, contudo, contestam. Segundo as testemunhas, o jovem não estava armado, tampouco era membro da facção conhecida como Primeiro Comando da Capital. A vítima era apenas mais um morador da Vila Bahiana, um pai de família que trabalhava como camelô.

O assassinato, segundo os moradores, não aconteceu por acaso. Os relatos dados a este Diário informaram que a ROTA, embora tenha decretado formalmente uma “operação”, está, na verdade, agindo por vingança. A ROTA alega que o policial militar Patrick Bastos Reis, integrante das Rondas, teria sido assassinado em uma das comunidades do Guarujá. Para os moradores, esse acontecimento é o que tem motivado uma ofensiva contra toda a população pobre da cidade.

Na Vila Bahiana, o clima é de desespero. “A rota vai fazer uma chacina”, disse um morador, enquanto filmava as cerca de 30 viaturas situadas na comunidade. Segundo relatos, os policiais não estão deixando ninguém entrar nem sair da favela.

“Vai morrer muita gente. Mais de 30. Eles têm uma lista de quem querem matar”, disparou um morador à nossa equipe, apavorado com a presença da ROTA.

Até agora, a prefeitura não se posicionou sobre as denúncias dos moradores. Tentamos contato com a assessoria de imprensa do município, mas não obtivemos resposta antes do fechamento deste artigo. A ROTA carrega um longo histórico de denúncias de ações ilegais e de violações aos direitos humanos desde sua origem, mas permanece até hoje como um dos principais batalhões do aparato de repressão do Estado de São Paulo.

Entre as denúncias mais conhecidas, estão a de que agentes da rota torturam e obrigaram uma cabelereira a se despir, em 2016, a de que os policiais da ROTA teriam torturado um jovem com marteladas, em 2017, e a de que agentes teriam torturado um rapaz com choques no pênis, em 2015.

No caso do assassinato no Guarujá, as denúncias são tão assustadoras quanto.

“A favela toda ouviu o que eles fizeram”, nos contou um morador que não quis se identificar. “Eles gritavam: ‘joga a arma no chão’. E ele gritava: ‘eu não tenho arma, não, senhor’. Aí eles atiraram”.

Segundo testemunhas que tiveram acesso ao boletim de ocorrência, o rapaz foi executado com nove tiros.

“A Band esteve no local”, disse um morador. “E pedimos para falar a nossa versão. Mas eles não deixaram”. “A orientação é matar todos os que tiverem passagem pela polícia”, nos relatou outro trabalhador que reside na Vila Bahiana.

De fato, a Rede Bandeirantes publicou uma notícia sobre o ocorrido. Nela, a empresa apenas diz que o “suspeito de atirar contra soldado da ROTA tem longa ficha”. Mas não comprova que houve a suposta “troca de tiros”, nem mesmo apresenta essa ficha.

Familiares da vítima deram detalhes do que aconteceu. “Ele foi torturado por muito tempo antes de ser executado”. Segundo as testemunhas, os policiais queriam a senha de seu celular. Ele teria sido deixado agonizando até a morte. “Já depois de morto, largaram ele em um hospital como indigente”, nos relatou os moradores.

Os familiares ainda alegaram que a última visualização de seu celular foi à meia noite, três horas depois que o rapaz havia sido morto, indicando que os policiais utilizaram o seu aparelho.

Diante das dificuldades de acessar as informações sobre o que de fato aconteceu com a vítima e da situação vulnerável em que os moradores se encontram, todos aqueles que conversaram com nossa equipe pediram para que advogados e outros profissionais que possam auxiliar a comunidade entrem em contato urgentemente. Para ajudar os moradores da Vila Bahiana, entre em contato com a coordenação do Coletivo João Cândido.

Fotos chocantes comprovam: moradores foram torturados pela ROTA (IMAGENS FORTES)

Diário Causa Operária – 2/8/2023

Na última sexta-feira (28), a Polícia Militar do Estado de São Paulo iniciou mais uma chacina. Dessa vez, contra os moradores da Vila Baiana, no município de Guarujá.

A chacina foi realizada com a formalização da chamada “Operação Escudo”, desatada, segundo os moradores, com a finalidade de vingar a morte de um policial da ROTA (batalha de operações especiais da PM-SP), que se dera no dia anterior (27), próximo ao túnel da Vila Zilda.

O terror para os moradores da Vila Baiana teve início quando a ROTA chegou na comunidade, com cerca de vinte viaturas e centenas de policiais. Começaram os assassinatos em massa e a agressão e tortura sistematizada dos moradores.

Já são 19 assassinatos cometidos pela polícia. Perdeu-se a conta dos casos de agressão e tortura. Tudo isto realizada sob a justificativa formal de encontrar um “sniper”, que supostamente teria matado o policial da ROTA.

Segundo denúncias dos moradores e áudios que circulam pelo whatsapp, a polícia disse que vai matar 60 pessoas.

Inúmeras denúncias de tortura foram feitas pelos moradores, tanto nas redes sociais, quanto para a própria ouvidora da PM – SP. As torturas foram cometidas tanto contra as pessoas que foram assassinadas, quanto contra as que ainda não foram. Dos 19 mortos, há vários que apareceram queimados, alguns com diversos buracos de bala, que teriam sido mortos por mais de um policial ao mesmo tempo, à queima roupa.

Enquanto isto, o reacionário governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), outrora bolsonarista assumido, agora bolsonarista enrustido, comemorou a chacina cometida, dizendo estar “extremamente satisfeito com a ação da polícia”, a qual qualificou como “profissionalismo”, que “não houve excessos” e que “há de se ter um respeito com a instituição”.

Chamou ainda de “narrativa” as denúncias de tortura: “Essa versão de indivíduo torturado, isso não passa de narrativa para nós”. Será mesmo narrativa? Apenas para a direita que faz de tudo para defender a ação fascista das polícias. Mas, frente à realidade, essa falsificação desmorona. Embora ainda não tenha havido pronunciamento oficial do IML, as fotos dos corpos das vítimas mostram sinais claros de tortura:

As evidências e os inúmeros testemunhos dos moradores acabam com a farsa montada pelo governador, na tentativa de preservar a imagem da corporação fascista.

Sua fala, por sua vez, mostra que Tarcísio apesar de ter deixado de manifestar apoio a Bolsonaro e se colocar como “civilizado”, ele continua a ser um fascista.

Sobre isto, é necessário nos delongarmos um pouco sobre a linha da imprensa, em apresentar mais essa chacina policial como resultado do bolsonarismo. É uma farsa. Tais chacinas sempre ocorreram, tanto no estado de São Paulo, quanto nos demais estados da Federação. Lembrando que várias delas em São Paulo ocorreram nos governos dos PSDBistas João Dória e Geraldo Alckmin, os ditos “civilizados”.

Lembremos também que o arauto da democracia foi Secretario Estadual de Segurança Pública de São Paulo, sob o governo Alckmin, de 2015 a 2016.

Em suma, são todos bolsonaristas.Todos esses governos possuem o mesmo procedimento em relação à população pobre e trabalhadora, qual seja, a mais violenta repressão por parte da polícia. É a famosa política de “bandido bom é bandido morto”, a qual sempre foi defendida pela direita “democrática”. Isto leva a polícia a matar de forma indiscriminada e arbitrária não apenas alguém que cometeu crimes (o que já seria ruim por si só), mas pessoas que não cometeram nenhum crime. É uma política terrorista contra a população.

Bolsonaristas e tucanos (e demais direitistas que posam de civilizados) possuem a mesma política repressiva em relação à população da periferia.

É nessas ocasiões que vemos a farsa da defesa do “Estado Democrático de Direito” e da luta contra o fascismo e o ódio desmoronar.

O ministro da justiça Flávio Dino, que vive fazendo bravatas contra um fascismo imaginário (utilizando-o como espantalho para acabar com os direitos democráticos da população), capitula completamente diante da chacina no Guarujá. Segundo Dino, a “ação da PM em SP não parece ser proporcional em relação ao crime”. Não parece? Está bem claro que não houve absolutamente nenhum proporcionalidade, afinal foram 19 trabalhadores em troca de 1 policial da ROTA, um fascista. É claro que não é proporcional. E mesmo que tivesse sido proporcional, estaria errado. A polícia não deve agir com base em proporcionalidade ou desproporcionalidade. Afinal, isto resultaria em uma política de olho por olho, dente por dente. A polícia tem que agir dentro da lei.

Será que Dino vai acionar a Policial Federal, a procuradoria e o Supremo Federal para decretar a prisão dos policiais assassinos? Vai decretar a prisão de Tarcísio, por ser, no fim das contas, o chefe da PM-SP? E por “fake news” e discurso de ódio? Tarcísio será preso? Segunda a lógica de Flávio Dino, deveria.

Mas o ministro não vai fazer nada. Só está interessado em perseguir os elementos avulsos e ultrassecundários do bolsonarismo que participaram no 08 de janeiro. É uma luta de mentirinha contra o fascimo. E o mesmo vale pela Alexandre de Moraes. Pelo visto, na defesa da “democracia” e do “Estado Democrático de Direito” não está inclusa a vida dos pobres, pretos e das mulheres da periferia.

Falando em pretos e mulheres, é ensurdecedor o silêncio dos identitários. Dizem-se defensores dos negros, das mulheres e crianças. Enquanto isto tem negros e mulheres sendo assassinados em chacinas como esta e crianças ficando órfãs (isto quando não são mortas também). Sobre isto, nenhum protesto; os identitários não falam nada. Sua política se limita à censura da população, sob o pretexto de defesa dos oprimidos. Caso você insulte um negro, um juiz pode te dar pena de prisão. Contudo, nada acontece com a polícia, que assassina negros de forma sistemática.

Assim, o identitarismo mostra-se mais uma vez como uma farsa. Uma farsa que, dentre várias funções, serve para encobrir a realidade aterrorizante vivida diariamente pela população negra no país.

Nesse sentido, o ministro dos direitos humanos, Silvio Almeida, personaliza a farsa que é o identitarismo. Ao se pronunciar sobre a chacina, disse:

“Eu pedi hoje de manhã para que o ouvidor nacional dos Direitos Humanos entre em contato com as autoridades para que nós possamos entender o que de fato aconteceu. Ou seja, foi cometido um crime bárbaro contra um trabalhador que precisa ser apurado, mas nós não podemos usar isso como uma forma de agredir e violar os direitos humanos de outras pessoas“.

Ou seja, para o ministro, o policial é um trabalhador, e os trabalhadores que foram assassinados são “outras pessoas”. Segundo Silvio Almeida, o policial vale mais que o povo pobre da favela.

Disse ainda que é:

“É preciso um limite para as coisas É preciso um limite para as coisas. Então eu acho que o limite para isso é respeito para os direitos humanos: seja para os agentes da segurança pública, seja da população dos territórios onde a polícia atua”.

É preciso um limite? Ou seja, matar uns quatro seria um limite razoável. Mas passou de 5 já não pode mais? Esse tipo de limite.

Não, é preciso acabar com as chacinas, é preciso acabar com a polícia militar.

Novamente, o ministro dos direitos se mostra uma vergonha. Ou melhor, um farsante, pois não faz absolutamente no sentido de combater a política genocida da burguesia contra a população pobre, ainda mais contra os negros, quem ele diz representar.

Infelizmente, é de pessoas como Flávio Dino e Silvio Almeida que o presidente Lula se cerca, sendo que deveria se cercar de trabalhadores, de pessoas com uma política realmente democrática.

Não é à toa que vem adotando uma política altamente repressiva contra a população. Enquanto desarma o povo, o governo fortalece o aparato de repressão policial. E o resultado é este: povo desarmado, povo assassinado pela polícia.

A única forma por fim às chacina é acabando com essa corporação fascista que é a polícia militar. Há aqueles que perguntam: mas quem combateria o crime organizado, quem proveria a segurança para a população? A polícia é que não é, afinal, assassinar 19 pessoas em um fim de semana não é absolutamente nenhum exemplo de segurança para a população.

A polícia, em especial a PM, traz é insegurança. E, de sobre, é a maior organização criminosa do país.

Assim sua dissolução é necessária, devendo ser substituída por milícias operárias, na cidade, e camponesas e operárias, no campo. Para isto é necessário travar uma luta, uma mobilização de massas dos trabalhadores pelo direito irrestrito ao armamento da população.

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Última Atualização: 31/07/2024